Já era madrugada da segunda-feira, dia 6 do corrente mês, quando Fernanda Torres representou com maestria a terra de Glauber Rocha, Cacá Diegues e Nelson Pereira dos Santos — grandes cineastas que retrataram a alma brasileira de modo ímpar. Os magnatas de Hollywood, ao premiarem uma trabalhadora e atriz do cinema nacional, também externaram preocupação com os problemas estruturais presentes na América Latina, periférica e dependente. Basta lembrar que um filme francês que se passa no México, muito bem feito, recebeu naquela noite o prêmio de melhor filme estrangeiro. Isso tudo em um tempo de ameaças à democracia liberal e de possibilidade de restrição da imigração nos EUA, com a chegada de um novo governo.
Fui ao cinema assistir à nossa película brasileira premiada, feita, aliás, com esmero e qualidade. Assisti também à película mexicana no streaming e fiquei impactado pelo drama das famílias de nosso vizinho ao norte, que perdem seus entes queridos para a guerra das gangues relacionadas ao comércio de drogas.
Não se faz cinema de qualidade e cultura popular sem apoio do Fundo Público Federal. Do mesmo modo, não se supera o subdesenvolvimento sem políticas públicas de tecnologia, inovação e mecanismos adequados de crédito para a reindustrialização.
Um estudo da Consultoria Tendências constatou que, no ano passado, 50,1% das famílias brasileiras percebiam renda domiciliar mensal superior a R$ 3.400, fruto da maior empregabilidade, da redução do exército de reserva no mercado de trabalho e do incremento da massa salarial ampliada, turbinada pelo aumento do salário mínimo.
Mas nem tudo são flores. O dólar, em relação às diversas moedas internacionais, valorizou-se cerca de 10% e, no Brasil, rapidamente superou a casa dos R$ 6. Considerando que o salário mínimo impacta a vida de 60 milhões de brasileiros, o repasse do novo patamar do dólar para os preços dos produtos de primeira necessidade da cesta básica é um problema que já está presente em nosso cotidiano, perceptível nas feiras livres e supermercados. O custo de vida elevado reduz o poder de compra das famílias e contém a retomada de setores como serviços e comércio.
Finalizo este breve artigo destacando que o clima de elevação da autoestima, presenciado com a premiação obtida na cidade de Los Angeles pelos artistas brasileiros, só confirma a necessidade de nossas elites arquitetarem um projeto de país para nossa nação, tão rica em biodiversidade, cultura e detentora de uma capacidade empreendedora ímpar.
Ranulfo Vidigal é economista.