Há 60 anos, teve início no Brasil o Regime Militar (1964–1985). Nos 21 anos em que o País esteve sob o comando dos militares, a economia teve momentos de altos e baixos, culminando com a crise da dívida externa que ocasionou uma crise financeira resolvida só com o Plano Real e apontada como um dos principais fatores para a queda da ditadura.
Nos primeiros anos do regime, após os militares arrumarem as contas públicas, o milagre econômico no Governo Médici (1969–1974) fomentou o aumento das exportações agrícolas e a realização de grandes obras de infraestrutura pelo País. “O crescimento econômico, na fase do milagre, dava legitimidade política para o regime”, lembra Caio Viotto, professor de História Econômica da Escola Superior de Engenharia e Gestão (Eseg).
Sob o comando de Delfim Netto, ministro da Fazenda durante boa parte do Regime Militar, a inflação caiu, e o Produto Interno Bruto (PIB) disparou – em 1968, a alta foi de 9,3%. As propagandas governamentais do período do milagre econômico estampam frases como “Brasil, ame-o ou deixe-o” e “Ninguém mais segura este País”.
Para fomentar esse crescimento, os governantes da época recorreram a empréstimos internacionais, assinados com taxas de juros pós-fixadas. “Nessa época, o Brasil queria muito crescer e, para alcançar esse objetivo, aproveitou a liquidez, tendo em vista que os juros estavam muito baixos no mercado internacional”, detalha Ricardo Hammoud, professor de Macroeconomia do Ibmec SP.
Porém, o lado obscuro deste êxito econômico tinha como principal marca a negligência pública com o lado social, fato que intensificou a desigualdade no Brasil. Paralelamente, a ditadura também tornava-se cada vez mais dura, com a publicação do Ato Institucional nº 5, no final de 1968.
Custos dos empréstimos disparam
De volta ao lado econômico, nos anos seguintes ao milagre, a economia global entrou em crise devido aos choques do petróleo. “Se você fosse seguir a Teoria Econômica, o governo deveria ter feito um ajuste recessivo, tentar controlar a inflação, o endividamento e o crescimento. Porém, eles optaram pelo contrário, decidiram continuar financiando o crescimento econômico para não perder o poder político, o que tinha como custo a inflação e o endividamento”, afirma Viotto.
Na virada entre as décadas de 1970 e 1980, o segundo choque do petróleo fez países como Estados Unidos aumentaram drasticamente os juros para conseguirem controlar a inflação – a taxa norte-americana saiu de 3% para 20%. Resultado por aqui: os custos dos empréstimos dispararam, e o País começou a dar calotes na dívida. “De certa forma, o choque do petróleo derrubou a ditadura”, pontua o historiador.
A dívida pública brasileira escalou de 27% do PIB em 1978 para 51% do PIB em 1984. Em 1985, a ditadura terminou, mas aqueles empréstimos seguiam no nome do governo brasileiro.
“O Brasil não conseguia pagar as dívidas, teve que renegociar diversas vezes com os credores internacionais. No Governo Sarney (1985–1990), o Brasil teve que dar calote, fazer planos mirabolantes, o que acelerou a inflação e nos tornou um país hiperinflacionário. Durante toda a década de 1980 até o Plano Real, tivemos esse problema na economia, reflexo da crise da dívida externa”, comenta o economista. Em 1989, a dívida pública brasileira chegou a 100% do PIB.
Hammoud reforça que o Plano Real foi o responsável por colocar “ordem na casa” e trazer o fluxo de capitais de volta ao Brasil: “Uma característica do governo brasileiro até hoje é que gastamos mais do que arrecadamos. Atualmente, em vez de pegar esse dinheiro de fora, acessamos ele aqui. Durante o Plano Real, tiramos uma lição de que não podemos crescer pegando dívidas, que é necessário respeitar o Orçamento Público. Porém, vejo que essa lição não se enraizou no país, sobretudo na política.”
Por Matheus Silva, especial para Monitor Mercantil