Os conflitos na Europa e no Oriente Médio, o atentado ao ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump, inspiram uma reflexão sobre o nível de preparo e ações de líderes de todas as nações do planeta. A extinção da espécie humana, como consequência das mudanças climáticas e guerras com a utilização de armas de extinção em massa, deixou de ser matéria de ficção científica e é veiculada como uma possível realidade em um futuro não muito distante.
Se analisarmos a história recente da humanidade, vamos chegar à conclusão de que estamos em retrocesso. Presenciamos um verdadeiro circo de horrores: atentados, assassinatos, imigrações induzidas, guerras com morte de inocentes, crianças morrendo por desnutrição, destruição do nosso meio ambiente e outras mazelas do nosso assim chamado mundo civilizado.
No Brasil, convivemos com uma escandalosa injustiça social e uma corrupção explícita, onde até a vergonha foi jogada pelo ralo. Vivenciamos uma crise de valores morais e culturais e uma escassez de líderes dispostos a superar este momento delicado e trágico. É preciso destacar e exaltar a necessidade do surgimento de lideranças autênticas e genuínas para a construção de um novo tempo, que nos faça sair da senda da desgraça a que hoje nos submetemos.
No passado, lideranças em áreas específicas influenciaram de forma definitiva a evolução da humanidade. Podemos citar alguns exemplos, em ordem alfabética: Albert Einstein, Anísio Teixeira, David Ben-Gurion, Darcy Ribeiro, Fidel Castro, George Washington, Juscelino Kubitschek, Madre Teresa de Calcutá, Mahatma Gandhi, Martin Luther King, Maximilien de Robespierre, Napoleão Bonaparte, Nelson Mandela, Nicolau Copérnico, Sigmund Freud, Oswaldo Cruz, Santos Dumont, Simón Bolívar, Theodore Roosevelt Jr., Charles de Gaulle e Winston Churchill.
Nossas lideranças, em sua maioria, não estão à altura de superarmos as crises que vivemos. Focadas nos interesses pessoais ou de grupos, não titubeiam diante das repercussões inadequadas de suas ações. Muitas delas ganham poder.
Uma pergunta então emerge: o poder corrompe? A frase de Nicolau Maquiavel nos faz refletir sobre a natureza humana e o impacto do poder. O poder pode ser um teste definitivo do caráter de uma pessoa, revelando virtudes e vícios ocultos. Para Maquiavel, a conservação do poder nas mãos de um bom governante, mesmo em situações com maior controle, é condição necessária para a continuidade da ordem política.
O poder é, ou deveria ser, um instrumento para o bem comum. Assim, as pessoas investidas no poder devem ser honestas e de caráter firme para não se deixarem corromper nem promoverem a corrupção. A corrupção e a desonestidade não rondam apenas os escalões mais elevados do poder. Na atual conjuntura brasileira, o cidadão se vê desprotegido, violentado e lesado nos seus direitos, ameaçado por quem o deveria proteger. O mau exemplo das autoridades é corrosivo e induz à corrupção.
A liderança é um talento que precisa ser identificado e desenvolvido. Howard Gardner define talento “por um arranjo complexo de aptidões ou inteligências, habilidades instruídas e conhecimento, disposições de atitudes de motivações que predispõem um indivíduo a sucessos em uma ocupação, vocação, profissão, arte ou negócio”. Segundo a Organização Mundial de Saúde, cerca de 4% das crianças e jovens apresentam altas habilidades gerais ou específicas.
No Brasil, não é fácil a identificação de crianças e jovens com talento de liderança, pois a educação brasileira é feita com um tratamento homogêneo dos estudantes, sem reconhecer a diversidade entre eles. Em adição, as políticas para a identificação e o desenvolvimento de talentos no Brasil são incipientes. Especialistas no campo da educação de talentos apontam que a identificação precoce do talento é importante. De maneira geral, as escolas não dispõem de recursos e não têm corpo docente adequadamente preparado para prover os desafios acadêmicos, sociais e emocionais para proporcionar o desenvolvimento das lideranças.
Quatro dimensões são consideradas importantes para aferir o potencial de liderança: o autodesenvolvimento, a habilidade no relacionamento interpessoal, a visão sistêmica e o senso crítico, e a responsabilidade. Essas características se manifestam e podem ser percebidas nos primeiros anos de vida e devem ser desenvolvidas no ambiente escolar.
A tendência da aprendizagem baseada na discussão de temas e na resolução de problemas pode ser considerada como um cenário adequado para o exercício do pensar e da crítica argumentativa. Uma correta visão de um mundo civilizado e o estímulo ao conhecimento geral seriam pré-requisitos para a formação de nossos futuros líderes. Um ambiente de total liberdade de diálogo e de expressão de pensamentos é absolutamente fundamental para o estímulo na formação de lideranças.
Romper com a falsa verdade de que alguém é o dono das verdades e diminuir a importância do próprio “eu” também devem fazer parte de um ambiente para a formação de novas lideranças que nos conduzam a um novo Brasil sem desigualdades sociais, onde todos os brasileiros e brasileiras possam realizar os seus sonhos.
Isaac Roitman é professor Emérito da Universidade de Brasília e da Universidade de Mogi das Cruzes, pesquisador emérito do CNPq e membro da Academia Brasileira de Ciências e do Movimento 2022–2030 O Brasil e o Mundo que Queremos.