A debandada da Ford com suas fábricas do Brasil escancarou um dos grandes problemas, cada vez mais crônico, de nossa economia: o desemprego entre a mão de obra qualificada. Mercedes-Benz, Sony e diversas outras empresas baseadas em tecnologia já haviam anunciado o fim de suas respectivas unidades fabris, engrossando as estatísticas desanimadoras sobre a oferta de postos de trabalho na indústria.
Segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o Brasil perdeu 17 estabelecimentos industriais por dia nos últimos cinco anos. Em 2020, a indústria atingiu o menor nível de participação no PIB brasileiro em toda a história – apenas 11,2%. É a chamada desindustrialização. Especialistas da Confederação Nacional da Indústria (CNI) defendem que já estamos vivendo uma segunda onda desse processo desde meados da década passada.
A oferta de subsídios e outras medidas macroeconômicas adotadas pelo Brasil nos últimos anos não surtiram efeito. Há tempos o governo peca ao optar por essa forma primária de se fazer presente na briga global por competitividade. Subsídios são apenas um entre muitos outros fatores – mais sólidos – que atraem investimentos, tais como a já citada mão de obra qualificada, geolocalização, um forte mercado consumidor, sistema tributário moderno e estabilidade jurídica.
O Brasil é um país continental, que no passado recente exigiu notáveis esforços de infraestrutura e engenharia para se integrar e crescer. Voltar a investir nessas iniciativas, em grandes projetos de transporte, energia, saneamento e logística, é o caminho para termos uma nova era de desenvolvimento.
Àqueles que acreditam que o Estado não tem condições de assumir esse papel de indutor de investimentos, é preciso contrapor que o país possui, sim, os recursos que poderiam ser investidos em infraestrutura, como a poupança interna, a balança comercial positiva e nossas bilionárias reservas cambiais.
Com relação aos técnicos e engenheiros, eles são resilientes e estarão prontos para contribuírem, voltarem a ser protagonistas de um Brasil vibrante e gerador de oportunidades.
Algumas das possibilidades que saltam aos olhos e que estão aguardando a vontade política de nossos governantes para gerar empregos:
Ferrovias – há no país 8.534 km de ferrovias abandonadas, 51.530 km de ferrovias planejadas e apenas pouco mais de 10.000 km de ferrovias ativas – ou precariamente ativadas. Toda essa malha aguarda um projeto sério de investimento para voltar a funcionar, inclusive como opção ao transporte de cargas e passageiros, reduzindo a dependência do país do modal rodoviário. O investimento anunciado com as duvidosas prorrogações de concessões que só interessam a poucos representa uma migalha do enorme potencial do setor ferroviário.
Indústria petrolífera – temos tecnologia de águas profundas pioneira. Além da Petrobras, há cerca de 5 mil empresas privadas criadas em torno da indústria do óleo & gás.
Indústria aeronáutica – apesar do momento delicado para o transporte via aérea, o país possui seu próprio Vale do Silício em torno da Embraer e é altamente competitivo nessa área.
Tecnologia agrícola – envolve milhares de pesquisadores e é responsável por inúmeros avanços de repercussão mundial (em São Paulo, o governador parece estar disposto a desmantelar esse nicho de excelência).
O próprio Instituto Butantã, que nos enche de orgulho no combate à pandemia, é outro exemplo: criado em 1901, é o maior produtor de vacinas do Hemisfério Sul.
Em resumo: sem projeto nacional de desenvolvimento, não há empregos. Sem engenheiro, não há desenvolvimento sustentável!
José Manoel Ferreira Gonçalves é engenheiro, jornalista, advogado e professor, integrante do Engenheiros pela Democracia e presidente da Ferrofrente.
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