A face oculta do desarmamento

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Segundo a publicação oficial do Movimento de Solidariedade Ibero-Americana, nº 23, da primeira quinzena de junho, em artigo assinado pelos jornalistas Silvia Palacios e Geraldo Luís Lino intitulado “Desarmamento, Estratégia do Governo Mundial”, a campanha de desarmamento civil no Brasil não é proveniente de uma iniciativa própria, mas sim resultado de um esforço internacional realizado por uma rede de instituições ligadas ao “establishment” oligárquico, em especial o seu componente anglo-americano-canadense, objetivando implantar uma estrutura de governo mundial, acima dos Estados Nacionais, que os “donos do mundo” pretendem ver inviabilizados no contexto da “globalização”.
Segundo a mesma fonte, o desarmamento da população se segue a uma série de medidas visando ao desmantelamento das Forças Armadas e à reestruturação das forças policiais civis e militares, elementos cruciais do plano de dominação externo. Em dezembro de 1995, durante um seminário internacional promovido no Rio de Janeiro pelo Ministério da Justiça, o movimento Viva Rio e a Police Foundation dos EUA, o então secretário-geral do Ministério da Justiça, atual secretário nacional de Direitos Humanos, Sr. José Gregori, anunciou que o Viva Rio seria encarregado da elaboração de um projeto para orientar a nova Política de Segurança Pública do governo federal, “uma doutrina de segurança cidadã, para ocupar o vazio que existe desde a doutrina de Segurança Nacional do governo militar”.
Em paralelo, o governo FHC continua a empreender medidas de enfraquecimento da economia nacional, as quais fortalecem as ações de grupos e entidades capazes de representar ameaças diretas à Segurança Nacional, como as quadrilhas de narcotraficantes que operam em território brasileiro, bem como as hostes radicais do Movimento dos Sem-Terra (MST), ligados ao Foro de São Paulo, o qual alguns de seus líderes consideram forças de guerra irregular e a Liga Operária Camponesa (LOC). Tanto o MST quanto o Foro são tentáculos do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), que, desde sua fundação, na década de 30, investe contra a instituição do Estado Nacional. Em julho de 1997, o cardeal Joseph Ratzinger, presidente da Congregação para a Doutrina da Fé do Vaticano, denunciou o CMI por sua ativa atuação em favor de movimentos de subversão armada na América Central.
De acordo com o jurista Márcio Thomaz Bastos, ex-presidente da OAB, com o desarmamento civil, o que se pretende é privar a população do seu legítimo direito à autodefesa, um verdadeiro atentado a um princípio consagrado pela lei natural. Esta ação assume um caráter ainda mais grave em função da crescente deterioração das condições de vida e segurança pública nos grandes centros urbanos do país, em função do caos econômico-social produzido pelas políticas econômicas “globalizantes” do governo FHC, que drenam a maior parte dos recursos financeiros para a especulação e a usura do pagamento de juros.
Uma das grandes incentivadoras do movimento de desarmamento é a ONG Viva Rio, fundada em novembro de 93, em conseqüência do seminário internacional Cidadania Participativa, Responsabilidade Social e Cultural num Brasil Democrático, realizado no Rio de Janeiro, nos dias 4 e 5, com o patrocínio e a participação de representantes das fundações Rockefeller, Brascan, Kellog, Vitae e Roberto Marinho. Dentre os participantes, destacaram-se o banqueiro David Rokefeller, o então chanceler FHC e o futuro presidente e fundador do Viva Rio, o antropólogo Rubem César Fernandes. O Viva Rio sempre atuou em estreita coordenação com ONGs internacionais como a Human Rights Watch e o CMI. É de se notar que a Human Rights tem entre seus patrocinadores o megaespeculador George Soros, cujas fundações promovem a campanha de desarmamento e a legalização do uso de entorpecentes. O CMI também patrocina a campanha internacional de desarmamento civil.
Entre os dias 13 e 15 de maio de 1998, o CMI, o Viva Rio e a ONG inglesa Saferworld patrocinaram no RJ um seminário sobre “microdesarmamento” (desarmamento civil), com representantes de 11 países, objetivando determinar uma pauta geral para a campanha internacional. Em dezembro de 98, representando a embrionária rede de ação internacional de armas pequenas (International Action Network of Small Arms – Iansa), uma rede de ONGs estabelecida para atuar como uma central de coordenação da campanha internacional do desarmamento, o Viva Rio entregou ao governador Anthony Garotinho a proposta de uma campanha para o desarmamento radical do país. Consciente ou inconscientemente, o Viva Rio implementou uma ação à qual não foi suficientemente analisada e discutida pelos próprios participantes do movimento, que pode ter repercussões não imaginadas por eles próprios.
Em 01 de junho, o presidente FHC enviou ao Congresso um projeto de lei, cujo texto proíbe o uso de armas pelos cidadãos, restringindo-as às forças de segurança do Estado e empresas de vigilância privadas. Em boletim de imprensa do CMI, de 19 de maio, o Sr. Rubem César Fernandes falou sobre o projeto, ainda não encaminhado: “A vontade política do presidente da República, bem como a existência de um forte movimento social no país, cria a possibilidade de um exemplo significativo, que poderá ser expandido em uma escala global”. Assim, a campanha brasileira é um autentico “teste de campo” para os engenheiros sociais do “establishment”.
O financiamento de toda esta campanha, da ordem de dezenas de milhões de dólares, provém de fundações como o Ploughshares Fund e a Winston Foundation For World Peace. Uma das ONGs mais importantes da campanha é o British American Security (Basic), que tem como principal financiadora a Fundação Ford. A rede Iansa, fundada em maio de 99, é composta por 186 ONGs, das quais as principais são: Instituto Canadense de Ação Legislativa (Cila) – “ONG semi-oficial do governo canadense”, Basic, Anistia Internacional, Oxfam, Pax Christi, Saferworld, International Alert e Groupe de Recherche et d”Information sur la Paix (Grip). A ONG International Alert, sediada em Londres, foi acusada pelo governo de Serra Leoa de apoiar os rebeldes que deram um golpe de estado no país em 1997, bem como também pelo ministro das Relações Exteriores do Sri Lanka, Lakshman Radirgamar, em julho de 98, de estar aliada à organização terrorista separatista “tigres de Tamil”.
Além dos citados, também foram fundadores o CMI, a Fundação Arias para a Paz e o Progresso Humano, a Federação dos Cientistas Americanos, a Human Rights Watch e os Médicos sem Fronteiras. O manifesto de fundação da Iansa destaca: a) reduzir os gastos militares ao nível mais baixo possível; b) reduzir as disponibilidades de armas para civis em todas as sociedades; c) estabelecer sistemas políticos e legais para assegurar um efetivo controle e monitoramento das Forças Militares, polícia e outras instituições de aplicação da lei.
O verdadeiro objetivo dos idealizadores da atual campanha do desarmamento é mais abrangente. Surgiu, logo depois do final da II Guerra Mundial, com o plano Baruch (entrega de todos os suprimentos de minérios radioativos a uma autoridade central mundial), para estabelecer um governo mundial. Tais idéias originaram o Tratado de Não-Proliferação das Armas Nucleares (TNP), bem como a proposta apresentada pelo Departamento de Estado dos EUA, no plenário das Nações Unidas, em 1961, sob o título: “Freedom from War- The United States Program for General and Complete Disarmament in a Peaceful World” (Libertação da Guerra: o Programa dos EUA para o Desarmamento Geral e Completo num Mundo Pacífico). O documento propunha o estabelecimento de uma Força de Paz das Nações Unidas e um plano de desarmamento mundial que incluía: a) o desmantelamento de todas as Forças Armadas Nacionais e a proibição do seu restabelecimento sob qualquer forma, exceto as requeridas para preservar a ordem interna e para contribuições para uma Força de Paz das Nações Unidas; b) a eliminação de todos os armamentos dos arsenais nacionais, inclusive todas as armas de destruição em massa e os seus meios de lançamento, exceto aquelas requeridas por uma Força de Paz das Nações Unidas e para a manutenção da ordem interna; c) a fabricação de armamentos seria proibida, exceto no tocante aos tipos e quantidades aprovadas para uso da Força de Paz das Nações Unidas e aos necessários para manter a ordem interna. Todos os outros armamentos seriam destruídos ou convertidos a fins pacíficos.
Seus idealizadores afirmam ainda que “em nossa era moderna, a obtusa aderência à Soberania Nacional e às Forças Armadas Nacionais representa uma forma de insanidade que, entretanto, pode ser curada por uma espécie de tratamento de choque”. Um bom exemplo disto foi a recente ação nos Bálcãs. Porém, admitem que “deve ser reconhecida que mesmo com a eliminação completa de todas as forças militares, restariam necessariamente forças policiais internas substanciais, embora estritamente limitadas, e que estas forças policiais, suplementadas por civis armados com rifles esportivos e armas de caça, poderiam, concebivelmente, constituir uma séria ameaça a um país vizinho na ausência de uma polícia mundial bem disciplinada e pesadamente armada”.
Observando o massacre realizado pelos EUA, através da Otan, na Iugoslávia, a imensidão da Amazônia, a adesão do Brasil ao TNP, a extinção ou privatização de nossa indústria bélica e agora a absurda tentativa de proibição da fabricação, comercialização e posse de armas de fogo pelos civis, em conjunto com o sucateamento de nossas Forças Armadas e as restrições impostas às nossas polícias, não é difícil prever quais são os planos dos “donos do mundo”, em relação ao Brasil. Será que o Congresso vai permitir mais este crime de lesa-pátria? E o Judiciário? Bem, o consolo é o de que o povo brasileiro sempre foi perito em armas brancas. Ou vão bani-las também?

Marcos Coimbra
Professor titular de Economia junto à Universidade Candido Mendes e conselheiro da Escola Superior de Guerra (ESG). Correio eletrônico: [email protected]

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