Em um passado não muito distante, conheci um investidor que gostava de fazer pequenas “corridas” no mercado. O processo era o seguinte: um grupo de investidores escolhia uma ação com baixíssimo volume negociado diariamente e começava a comprar o papel desenfreadamente. A ação, devido à baixa liquidez, subia de forma muito rápida, atraindo os desavisados. Olhando a rentabilidade e acreditando que poderiam ter lucros exorbitantes, eles entravam. Era a exatamente a hora em que o investidor que conheci falava para os amigos começarem a vender o papel.
Nesta época não havia WhatsApp, nem Telegram, nem essa parafernália de mídias sociais, talvez só o Facebook. Se fazia era via boca a boca mesmo, pelo telefone, nada escancarado nem com a participação de milhares de investidores. O fato é que a tecnologia apenas disseminou e ampliou práticas escusas que deixam muitos com dinheiro no bolso para desespero de outros.
Agora a Comissão de Valores Mobiliários passa a ter novos desafios. Como regular, punir e evitar esse tipo de situação como a provocada com as ações da IRB? No dia 28 de janeiro, os papéis saltaram 17,8% puxados por mensagens do grupo no Facebook “IRBR3 Forum Investing”. Inspirados pelo caso da GameStop nos EUA, os sardinhas foram à luta defendendo a compra das ações para pressionar os grandes investidores que estavam vendidos à descoberto, ou seja, venderam os papéis sem tê-los em carteira. O grupo Short Squeeze IRB no Telegram contava com quase 15 mil membros na semana passada.
Em alerta ao mercado, a CVM observou que short squeeze é considerado crime. “A atuação com o objetivo deliberado de influir no regular funcionamento do mercado pode caracterizar ilícitos administrativos e penais”, afirmou em comunicado. A autarquia destacou a prática de puxar o preço do papel artificialmente para causar prejuízos a terceiros ou obter benefícios indevidos é passível de punição, já que é um crime tipificado no artigo 27-C da Lei 6.385/76.
“No Brasil, a depender das características do caso, tais estratégias podem ser tipificadas, em sede administrativa, como ‘manipulação de preços’, definição que abarca a utilização de qualquer processo ou artifício destinado, direta ou indiretamente, a elevar, manter ou baixar a cotação de um valor mobiliário, induzindo, terceiros à sua compra e venda, havendo outros tipos na regulamentação que também se destinam a reprimir práticas que atentem contra a regularidade do mercado”, destacou.
Mas uma coisa é praticar o crime, e outra é ser punido por eles. Milhares de investidores se envolveram com a prática, e punir a todos não é nada fácil. Afinal, a punição tem que coibir a vontade de reincidir no crime, o que não é praxe quando se trata de mercado financeiro. Historicamente, o que se vê é a pessoa ganhar rios de dinheiro com operações escusas e depois pagar uma pequena multa, fazer um acordo ou até mesmo sair impune. É um segmento em que o crime compensa.
Leia mais:
Fevereiro começa com boas altas, num mês de apenas 18 pregões