Uma decisão liminar proferida recentemente pelo ministro Mauro Campbell Marques, atual corregedor nacional da Justiça, determinou a suspensão da exigência de que contratos de alienação fiduciária de imóveis, celebrados por entidades fora do Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI) e do Sistema Financeiro de Habitação (SFH), sejam formalizados por meio de escritura pública. Essa exigência está prevista no Provimento nº 172/2024, editado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Antes de entendermos o forte impacto dessa decisão, vale explicar como a alienação fiduciária é amplamente utilizada no mercado de crédito, sendo a garantia mais escolhida pelos credores. Para ser considerada válida, ela exige requisitos formais específicos, conforme previsão do artigo 1.361 do Código Civil.
Atualmente, para que o sistema funcione de maneira eficiente, é necessário reduzir a burocracia. Nesse sentido, a decisão liminar adotou uma abordagem de diminuição dos custos envolvidos na formalização da alienação fiduciária em contratos realizados por entidades não integrantes do Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI) e do Sistema Financeiro de Habitação (SFH).
Porém, é aí que surgem os problemas. Passa a haver dúvidas entre as empresas a respeito de quanto essa decisão acaba por criar insegurança jurídica para o tomador de crédito. A validade da garantia fiduciária é um tema debatido há bastante tempo, especialmente no que se refere à necessidade de individualização da garantia, registro na matrícula e escolha do cartório competente para registro.
Como a alienação fiduciária é a principal garantia no mercado de crédito, é evidente que a flexibilização das regras pode gerar disputas sobre sua validade. Além disso, outro efeito da liminar do ministro Mauro Campbell pode ser o aumento da já alta demanda judicial a respeito do tema, até porque a decisão proferida colide com o dispositivo legal mencionado, o próprio provimento do CNJ e a jurisprudência sobre o tema.
Por fim, o entendimento em caráter liminar demonstra como é importante que os operadores do Direito reflitam sobre o equilíbrio entre a desburocratização dos processos e a manutenção da segurança jurídica no mercado de crédito.
Embora a decisão tenha o mérito de buscar a simplificação das formalidades e a redução de custos, persiste a insegurança jurídica acerca de seus possíveis impactos na confiança dos tomadores e no funcionamento do sistema de garantias fiduciárias.
Resta acompanhar os desdobramentos judiciais e normativos para entender se a medida será efetivamente consolidada e como o mercado e o Judiciário irão lidar com eventuais controvérsias decorrentes dessa flexibilização. Essa mudança realmente será vivenciada na prática?
Nathália Borelli é advogada formada pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas – PUCCAMP. Pós-graduada em Gestão e Estratégia Empresarial na Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Pós-graduada em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Membro da Comissão de Estudos em Falência e Recuperação Judicial da OAB/Campinas. Membro do Centro de Mulheres na Reestruturação Empresarial – CMR. Membro da IWIRC – Brasil.