A Livraria da Travessa, em Botafogo, foi pequena para receber os amigos e os convidados que foram até lá buscar um autógrafo, parabenizar e abraçar o tradutor, escritor, poeta, ensaísta e ficcionista Adriano Espínola, que lançava Metrô ou viagem até a última estação possível, editado pela 7Letras. As filas começaram a se formar bem antes das 19h, horário previsto para que o simpático cearense de Fortaleza começasse a usar a sua Bic azul. Pelo andar da carruagem, deve ter usado pelo menos umas duas canetas…
O professor e brasilianista Charles Perrone, que escreve o prefácio da obra, diz que é preciso deixar claro que, se o lugar poético do Metrô é bem carioca, não deixa de ser legível qualquer leitor, mesmo que não conheça a sua exata geografia urbana, pois entende-se que se trata de lugares, edifícios, ruas… da grande cidade.
E essa viagem poética criativa e fantástica de Espínola começa e termina na Estação do Largo do Machado, bairro encravado entre o Flamengo e Laranjeiras, situado na Zona Sul da Cidade Maravilhosa, em um vaivém absolutamente improvável, cheios de cruzamentos, alguns perigosos, dentre tantos achados e perdidos em um mar multifacetado. Mas a melhor parte desta obra, que faz menção a cinco outras do próprio autor, é a bela referência que ele faz, com indisfarçável carinho e amor, à sua musa inspiradora, Moema (=MeupOEMA), que lá estava feliz e atenta, ajudando a receber os convidados, até ao chamamento de poetas geniais, todos integrantes do panteão modernista e o diálogo que mantém, pelos versos, com grandes e marcantes personagens da poesia mundial.
Muitos dos convidados chegaram à Travessa de metrô, pois há uma estação bem próxima da livraria, mas certamente nenhum deles poderia imaginar o quão confortável seria cada vagão poético desse livro arrebatador, transportado para um meio de transporte popular. E navegar por esses versos épicos e líricos tão bem construídos é de fato um deleite para quem aprecia a boa poesia.
Adriano Alcides Espínola nasceu na bela capital do Ceará, no dia 1º de março de 1952, filho de Hildebrando Torres Espínola e Dulce Maria Alcides Espínola, concluindo o então curso secundário na Huntington High School, na Big Apple, na feérica Nova York, como estudante bolsista do AFS, nos anos 70.
Ao retornar ao Brasil, matriculou-se na Faculdade de Letras da Universidade Federal do Ceará, diplomando-se em 1975. Dois anos mais tarde, na mesma Instituição, passou a ser professor de Língua Portuguesa e Literatura. Casou-se, nesse mesmo ano, com Moema Roriz, com quem teve dois filhos, Paloma e Adriano Filho.
Resolveu aprofundar seus estudos, e em 1989, obteve o título de Mestre em Teoria Literária pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Inquieto e sempre querendo buscar mais, viajar, conhecer e desbravar novas culturas, partiu para o Velho Continente e, na França, assumiu o cargo de professor-leitor de língua, literatura e cultura brasileiras na tradicional Université Stendhal Grenoble III. E foi em Grenoble que residiria com a família até 1991. Em 1999, conclui o seu doutoramento em Literatura Brasileira pela UFRJ, defendendo sua tese sobre o poeta barroco Gregório de Mattos. Uma pesquisa imperdível!
De 2003 a 2007, atuou, como professor convidado, no Departamento de Ciência da Literatura da Faculdade de Letras da mesma UFRJ, ministrando cursos na graduação e pós-graduação.
A obra de Adriano Espínola, um belo orador, é vasta e ele transita com desenvoltura e muita categoria pelos vários estilos literários. Na poesia, estreou em Fala, favela, em 1981, reunindo 30 poemas lírico-dramáticos de teor participativo-social, centrados em um episódio real, a remoção à força de uma comunidade favelada, em Fortaleza, no ano de 1979. Um ano antes, esses textos foram transformados em uma peça narrativa-musical levada ao palco do Teatro Universitário da Universidade Federal do Ceará. Reeditado, em 1998, o livro ganharia uma versão bilíngue português/francês (Fala, Favela/Voilà Favela) para ser lançado no 18o. Salão do Livro, em Paris. Algum tempo depois, a obra tornar-se-ia objeto de estudo da professora Anne-Marie Pascal, da Universidade de Clermont-Ferrand, que sobre ela dedicaria palestras e o ensaio L’epopée des sans-logis, publicado na coletânea Utopies, enchantements et hybridité, em 2012.
Traduziu Taxi or poem of love in transit; Taxi o poesia d’amore passegero; Dopo essermi tolta e Lingua-Mare, para o inglês e o italiano, além de ter se aventurado com raro talento na ficção em Malindrânia.
Lúcido, sempre de bem com a vida e generoso com todos com os quais convive, Espínola é detentor de importantes prêmios, dentre os quais o de Poesia da Fundação Biblioteca Nacional, com o livro Beira-Sol, finalista do Prêmio Jabuti, com a mesma obra; Poesia com o livro Praia provisória; da Academia Brasileira de Letras; e finalista do Prêmio Rio de Literatura, com Escritos ao Sol.
Espínola tem mais de uma dezena de livros publicados, além de participações em diversas antologias e coletâneas no Brasil e no exterior, com destaque para Sincretismo; Pedras de toque da poesia brasileira; Poeti braziliani contemporanei; 41 poetas do Rio; Literatura portuguesa e brasileira ano 2000; Cem anos de poesia; Camões, grande Camões…; Scrittori brasiliani, A poesia é para comer; Musa fugidia: a poesia para os poetas; A estante dos poetas; Tudo é sempre despedida (50 poetas brasileiros contemporâneos; e Kosmopoemas/Kosmocontos, lançada no ano passado.
Como bem escreve e descreve Charles Perrone, Adriano Espínola emprega a língua, seja parte do corpo ou do idioma em si, para fazer viverem os sentidos, sensoriais ou semânticos, em viagem, em que o narrador vê, ouve, sente, cheira, toca e pensa. Usa a língua de lamber/lembrar e de articular palavras, para torná-la canto e linguagem e seguir até a última estação – do pensamento, emoção, sensação, tesão, paixão – possível.
Professor aposentado da UFRJ, Adriano Espínola é intelectual respeitado, membro efetivo do PEN Club do Brasil e Vice-Presidente da Academia Carioca de Letras, onde ocupa a cadeira número 5, que tem como Patrono Monte Alverne, um frade franciscano e teólogo, reconhecido orador e pregador oficial do Império do Brasil, considerado um dos precursores das ideias românticas no Brasil. Metrô ou viagem até a última estação possível é leitura recomendada pelo seu conteúdo, pela sua construção, pelo seu lirismo e, sobretudo, pela beleza dos seus versos.
Paulo Alonso, jornalista, é reitor da Universidade Santa Úrsula.