A presidência do Senado e a reeleição

A história da presidência do Senado após a Redemocratização, abordando mandatos, interrupções, reeleições e disputas políticas.

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Desde a Redemocratização, o Senado Federal já teve 21 mandatos presidenciais, sendo que 18 foram cumpridos por completo, dois foram interrompidos por renúncias (Jader Barbalho, set/2001, e Renan Calheiros, out/2007), e um está em andamento (Davi Alcolumbre).

Com relação aos dois mandatos interrompidos, para que eles fossem completados assumiram primeiro dois presidentes interinos, Edison Lobão, no caso de Jader Barbalho, e Tião Viana, no caso de Renan Calheiros, que organizaram as transições para que os novos presidentes completassem os mandatos, Ramez Tebet e Garibaldi Alves Filho, respectivamente.

Esses 21 mandatos foram ocupados por 15 senadores, sendo que 6 deles ocuparam a presidência da casa mais de uma vez: Renan Calheiros e José Sarney, quatro vezes, e Humberto Lucena, Antônio Carlos Magalhães, Rodrigo Pacheco e Davi Alcolumbre, duas vezes. No total, esses seis senadores ocuparam 15 mandatos, sendo que Renan Calheiros renunciou ao seu segundo mandato, iniciado em fev/2007, em out/2007.

José Sarney e Renan Calheiros, quatro mandatos, e Humberto Lucena, Antônio Carlos Magalhães e Rodrigo Pacheco, dois mandatos cada, sendo que os mandatos de Lucena foram intercalados.

Os demais 6 mandatos, incluindo o restante do mandato interrompido de Renan Calheiros, foram ocupados por 9 senadores.

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As presidências do Senado antes da reeleição

De mar/1985 a fev/1997, as seis presidências do Senado foram exercidas sem que houvesse reeleição. Nós temos o caso específico do senador Humberto Lucena, que foi presidente da casa por duas vezes nesse período, mas de forma intercalada, sendo a primeira vez de mar/1987 a mar/1989, e a segunda de ago/1993 a fev/1995. No mais, todos os presidentes ocuparam a presidência sem que tivessem concorrido à reeleição: José Fragelli, Nelson Carneiro, Mauro Benevides e José Sarney (sim, Sarney, no mandato que foi de fev/1995 a fev/1997).

José Fragelli, presidente de mar/1985 a mar/1987; Humberto Lucena, presidente de mar/1987 a mar/1989 e de ago/1993 a fev/1995; Nelson Carneiro, presidente de mar/1989 a mar/1991, e José Sarney, presidente de fev/1995 a fev/1997. Os cinco presidentes do período pós-redemocratização em que não havia reeleição para a presidência do Senado.

1997, o ano em que tudo mudou

Em jun/1997, o Congresso Nacional aprovou a Emenda Constitucional nº 16, que tratava da reeleição para a presidência da República e para os governos dos estados, municípios e Distrito Federal. Essa emenda tinha como origem a PEC nº 1 de 1995, que tramitava no Congresso desde o início de 1995, primeiro ano da primeira presidência de Fernando Henrique Cardoso. Os presidentes do Senado e da Câmara, que conduziram a votação da PEC, foram Antônio Carlos Magalhães (ACM) e Michel Temer, respectivamente.

Muito provavelmente, o acordo para aprovação dessa Emenda Constitucional, além da compra de votos de parlamentares, envolveu o início da reeleição para a presidência do Senado e da Câmara, pois, dois anos depois, ACM e Temer foram reeleitos para as presidências das duas casas. Para isso, foi criada a interpretação de que a reeleição poderia acontecer, desde que o primeiro mandato fosse em uma legislatura e o segundo em outra. Cabe ressaltar que, desde 1997, essa prerrogativa tem sido muito mais utilizada no Senado do que na Câmara.

Antônio Carlos Magalhães e Michel Temer, os presidentes do Senado e da Câmara que conduziram a aprovação da emenda constitucional da reeleição para presidente da República, governadores e prefeitos, e que em seguida se reelegeram para os comandos das casas que já presidiam, o que até então não podia.

As presidências do Senado com a reeleição

ACM e Jader Barbalho, ou melhor, ACM x Jader Barbalho

Instituída a reeleição no Senado, ACM foi o primeiro presidente que usufruiu do mecanismo. Depois do mandato de fev/1997 a fev/1999, ele se reelegeu para a presidência da casa de fev/1999 a fev/2001.

No decorrer de 2000, ACM se envolveu em um embate com Jader Barbalho por conta da eleição para a presidência da casa que ocorreria em fev/2001. Como ACM não aceitava a candidatura de Barbalho, que já se movimentava para concorrer à eleição, teve início uma série de agressões verbais das duas partes. Um subia na tribuna do Senado com uma pasta, que muitos acreditavam que conteria um dossiê incriminador sobre o outro, quando na verdade era um monte de recortes de jornais, para agredir o adversário verbalmente e levantar uma série de acusações. Em seguida, o outro fazia a mesma coisa. No final desse show dos horrores, ACM não conseguiu impedir a eleição de Barbalho para o mandato de presidente do Senado de fev/2001 a fev/2003.

O problema é que Barbalho assumiu a presidência da casa fragilizado pelo embate com ACM, e meses depois, mais precisamente em set/2001, teve que renunciar ao mandato de senador, para evitar um processo de cassação, por conta de uma série de denúncias sobre desvios de recursos da Sudam, do Banpará e do Incra. Inclusive, Barbalho chegou a ser preso pela Polícia Federal. É desse período uma foto emblemática em que ele aparece algemado, segurando um livro para disfarçar as algemas, enquanto é escoltado por policiais federais.

Com relação à ACM, ele também não passou incólume pela briga. Ele renunciou antes de Barbalho, em mai/2001, para não ser cassado na esteira do Escândalo do Painel, quando foi descoberto que ACM teve acesso aos votos dos senadores na votação secreta da cassação do senador Luiz Estevão, ocorrida em jun/2000.

Depois da renúncia de Barbalho, a presidência do Senado foi ocupada por Edison Lobão, que fez a transição em dois dias para Ramez Tebet, que completou o mandato que iria até fev/2003 (Tebet foi presidente de set/2001 a fev/2003).

Jader Barbalho, que renunciou ao mandato de senador quando era presidente do Senado, Edison Lobão, interino, e Ramez Tebet, o senador que completou o mandato de presidente.

José Sarney e Renan Calheiros

Como Barbalho havia renunciado, ele não poderia concorrer à reeleição ao mandato de fev/2003 a fev/2005. Assim, coube a José Sarney conduzir a presidência da casa nesse período, mas sem que ele pudesse concorrer à reeleição, pois o próximo mandato, que iria de fev/2005 a fev/2007, estava dentro da mesma legislatura. Esse mandato foi ocupado por Renan Calheiros, que se reelegeu para o mandato de fev/2007 a fev/2009.

Calheiros se reelegeu, mas não conseguiu chegar ao final do mandato, pois teve que renunciar, para não sofrer um processo de cassação, devido a uma série de acusações envolvendo o recebimento de ajuda financeira de lobistas ligados a construtoras, que teriam pago despesas pessoais, como o aluguel de um apartamento e a pensão alimentícia de uma filha que ele teve com uma jornalista.

Coube ao senador Tião Viana assumir, interinamente, a presidência da casa para fazer a transição para Garibaldi Alves Filho, que foi presidente do Senado de dez/2007 a fev/2009.

Renan Calheiros, que renunciou ao mandato de senador quando era presidente do Senado, Tião Viana, interino, e Garibaldi Alves Filho, o senador que completou o mandato de presidente.

Mais uma vez, José Sarney e Renan Calheiros

Terminada a presidência de Garibaldi, que não podia concorrer a reeleição, pois o mandato de fev/2009 a fev/2011 estava na mesma legislatura, assumiu a presidência do Senado, pela terceira vez, José Sarney, que se reelegeu para o mandato de fev/2011 a fev/2013.

Sarney passou a presidência para Renan Calheiros, que foi presidente de fev/2013 a fev/2015, sendo reeleito para o mandato de fev/2015 a fev/2017. Dessa vez, ele não precisou renunciar ao mandato de senador para evitar um processo de cassação.

Aqui, vale relembrar uma manobra, na verdade um golpe aplicado na Constituição, que foi feito por Calheiros, junto com Ricardo Lewandowski, atual ministro da Justiça, mas que na época era presidente do Supremo Tribunal Federal, repetindo, presidente do Supremo Tribunal Federal, na votação do impeachment da presidente Dilma Rousseff.

A Constituição Federal, no artigo 52, parágrafo único, é muito clara, específica e transparente ao dizer que a condenação de um presidente que sofre impeachment é a “perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis”. As duas punições não são desassociadas, tanto que foi assim que Fernando Collor de Mello foi punido quando sofreu o processo de impeachment, apesar de ter renunciado antes.

Por incrível que pareça, Calheiros e Lewandowski conseguiram rasgar a Constituição e dividiram a votação do impeachment de Dilma Rousseff em duas partes, sendo a primeira relacionada à perda do cargo, e a segunda relacionada à inabilitação para o exercício de função pública por oito anos. Na primeira votação, 61 senadores votaram pela perda do cargo contra 20. Na segunda, 42 senadores votaram para que Dilma não ficasse inabilitada por oito anos, contra 36 senadores que votaram pela inabilitação.

No final, essa manobra apenas serviu para manchar as reputações dos envolvidos, pois na única eleição que Dilma Rousseff disputou após o impeachment, para uma das vagas de Minas Gerais no Senado, em 2018, ela foi derrotada por Rodrigo Pacheco, mesmo aparecendo como favorita nas pesquisas. A inabilitação, que tinha que ser aplicada pelo Senado, acabou sendo aplicada pelos eleitores de Minas.

Esse golpe na Constituição foi feito ao vivo, diante de milhões de pessoas que assistiam à votação e do silêncio de 81 senadores, já que ninguém se levantou contra isso, além da cumplicidade de 42 senadores que votaram para que Dilma Rousseff não ficasse inabilitada por oito anos, como manda, claramente, a Constituição desde 1988.

A partir daí, a interpretação da Constituição brasileira passou a ser, cada vez mais, gelatinosa, passando a depender de quem aplica, para quem aplica e quando aplica.

Ricardo Lewandowski e Renan Calheiros durante o processo de impeachment de Dilma Roussef.

Eunício Oliveira

Depois de Renan Calheiros, assumiu a presidência do Senado, para o mandato de fev/2017 a fev/2019, o senador Eunício Oliveira. O problema é que Eunício se tornou presidente do Senado nos seus dois últimos anos como senador pelo Ceará. Como ele não foi reeleito como senador, ele não pôde concorrer à reeleição à presidência do Senado, o que abriu caminho para a eleição de Davi Alcolumbre.

Eunício Oliveira. Quando ele ia tentar a reeleição para a presidência do Senado, ele acabaou não se reelegendo como senador pelo Ceará.

Davi Alcolumbre e Rodrigo Pacheco

Davi Alcolumbre foi eleito presidente do Senado para o mandato de fev/2019 a fev/2021, sem que ele pudesse concorrer à reeleição, já que o mandato de fev/2021 a fev/2023 estaria dentro da mesma legislatura. Cabe destacar que Alcolumbre foi eleito na estranha votação, contra Renan Calheiros, em que apareceu um voto a mais, ou seja, na sessão com 81 senadores foram contados 82 votos, episódio esse que nunca foi esclarecido.

Depois de Alcolumbre, foi a vez de Rodrigo Pacheco ocupar a presidência do Senado no mandato de fev/2021 a fev/2023 e de fev/2023 a fev/2025. Coube a Pacheco devolver a presidência do Senado a Davi Alcolumbre, que presidirá a casa de fev/2025 a fev/2027, e que, muito provavelmente, dada a dinâmica que tem prevalecido no Senado desde que a reeleição foi instituída, será reeleito, daqui a dois anos, para o mandato de fev/2027 a fev/2029.

Davi Alcolumbre e Rodrigo Pacheco. Essa dobradinha já tem 3 mandatos na presidência do Senado, está indo para o quarto, e ainda pode ter, muito provavelmente, o quinto daqui a dois anos.

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