A questão da proteção dos indígenas no STF

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No início de agosto, importante julgamento no Supremo Tribunal Federal referendou liminar do ministro Luís Roberto Barroso relator da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709, ajuizada pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e por seis partidos políticos. A demanda tem por objetivo conter o avanço da disseminação da Covid-19 entre os indígenas. A decisão estendeu o sistema indígena de saúde do Governo Federal aos não aldeados ou aldeados em terras não demarcadas e não homologadas.

Na decisão ficou consignado à unanimidade que o Governo Federal complemente o Plano de Barreiras Sanitárias para Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato (PIIRCs). Na decisão, o ministro afirmou que o plano entregue pelo governo representa “um primeiro passo” no enfrentamento à pandemia nas aldeias, mas frisou a necessidade de definições mais precisas das barreiras sanitárias com incorporação ao Plano apresentado das contribuições importantes trazidas pela Apib, considerando as particularidades e vulnerabilidades de cada povo.

As barreiras sanitárias, cuja instalação foi determinada por meio de cautelar, têm a função de conter a disseminação da Covid-19 nas áreas ocupadas pelos PIIRCs. Por essa razão, não constituem apenas instrumento de defesa territorial e de limitação da movimentação”, afirmou o ministro na decisão.

Conforme os especialistas, as barreiras devem conter, por exemplo, equipamentos de proteção, protocolos de quarentena, redução da movimentação de equipes e monitoramento epidemiológico. O relator enfatizou que as BAPEs podem servir de barreira sanitária, desde que sejam adaptadas para essas medidas. Salientou também: “Estamos diante de um quadro gravíssimo e emergencial, de modo que, sem prejuízo do enorme esforço de diálogo institucional e intercultural empreendido até aqui, é preciso que ações concretas sejam efetivadas”.

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Um ponto delicado citado no julgamento é a necessidade de elaboração de um plano de “desintrusão dos invasores” a médio prazo. Destacou-se que “os problemas estruturais que acompanham a questão indígena há décadas – histórica inoperância do Estado brasileiro na regularização dos seus territórios, na contenção de invasores e no desenvolvimento de políticas públicas de reconhecimento e proteção – agravam a vulnerabilidade de tais povos à pandemia”.

Embora a questão de exploração de riquezas minerais em terras indígenas muitas vezes ocorra sem o consentimento das comunidades diretamente interessadas, colocando-as em risco de contato e doenças, a questão é de fato complexa e exige diálogo inclusive acerca da possibilidade de exploração econômica sustentável das terras e da participação dos povos indígenas no produto das riquezas extraídas.

No julgamento restou a certeza da necessidade de proteção dos povos indígenas que estão sendo dizimados pela Covid-19. O ministro Fux salientou: “Vivemos um momento de exceção dentro do estado de direito, e a tutela dos direitos fundamentais é essencial durante a pandemia, que acabou por produzir efeitos alarmantes na população indígena, com uma taxa de mortalidade de mais de 16% em comparação à taxa de 5% do resto da população, com mais de 5 mil infectados, dos quais mais de 270 índios já morreram em 145 comunidades originarias afetadas”. Afirmou-se ainda que essas mortes especialmente dos idosos destrói a memória de uma civilização pois parte significativa dos conhecimentos tradicionais se vai com a perda desses anciãos.

Por outro lado, embora não tenha sido objeto da demanda ou da decisão, também extrai-se do julgamento a convicção de que a “imprescindibilidade da participação das comunidades indígenas na formulação dos planos e políticas que lhe são direcionados”, como fixou o ministro Barroso, deve ser abrangente, não apenas visando à proteção de seus territórios e a preservação da vida e da saúde desses povos, mas, também, possibilitando a inclusão desses em um projeto que se pretende de desenvolvimento sustentável. Para tanto é preciso admitir e dialogar de forma séria sobre a exploração consentida e a repartição pelas riquezas extraídas de suas terras. Isso significa cumprir o preceito constitucional de respeito à autonomia e ao direito às terras ocupadas pelos povos indígenas, bem como a observância das convenções internacionais sobre a matéria em especial a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, OIT.

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