A renda fixa e a proximidade do início do ciclo de baixa da Selic

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Clara sodré
Clara Sodré (foto divulgação XP Inc)

Especialista recomenda diversificação de carteira em renda fixa

 

Conversamos com Clara Sodré, especialista em investimentos e analista de alocação e fundos da XP Inc, sobre como se posicionar na renda fixa considerando a proximidade do início do ciclo de baixa da Selic.

Segundo o último boletim Focus, o mercado financeiro tem a expectativa de que a Selic, que hoje se encontra em 13,75% ao ano (a.a.), termine 2023 no patamar de 12,50% a.a.. As próximas reuniões do Copom estão programadas para os dias 20 e 21 de junho; 1º e 2 de agosto; 19 e 20 de setembro; 31 de outubro e 1º de novembro e 12 e 13 de dezembro.

 

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Como um investidor deve se posicionar na renda fixa considerando a aproximação do início do ciclo de baixa da Selic?

Um ponto importante é saber como investir e o momento certo de investir. Como acertar esse momento não é uma tarefa trivial, a recomendação inicial, para qualquer investidor, é diversificar. Como nós montamos as nossas teses e recomendações olhando para o cenário macroeconômico, indicadores e tendências, nesse momento nós temos uma visão positiva para alocação em renda fixa e inflação, pois, ao contrário do que muitos investidores pensam, o melhor momento para se colocar em inflação não é quando ela está subindo.

Os títulos de inflação possuem dois componentes, o IPCA e a taxa prefixada, sendo que essa taxa passa por um efeito contrário. Quando a inflação está subindo, nós temos uma perspectiva de aumento da taxa de juros para combatê-la. Se a taxa de juros aumenta, a taxa prefixada passa por um ciclo de aumento, e se ela aumenta, os preços dos títulos caem. Ou seja, na verdade, acontece o movimento inverso.

Agora, quando estamos olhando para uma tendência de queda da inflação, é justamente nesse momento que os títulos IPCA+ passam por um movimento de alta, já que a tendência é que eles subam por causa da marcação a mercado.

O nosso time de economia do research acredita que a inflação vai continuar seguindo na sua trajetória de queda gradual até 2024, na esteira do movimento global que está acontecendo e dos ajustes que o Banco Central está fazendo, mas ainda com alguns cuidados em relação à política fiscal um pouco mais expansionista e ao comportamento do núcleo de inflação.

Por mais que não seja tão simples assim fazer com que a inflação caia, o investidor consegue se proteger através da diversificação e investindo em ativos que consigam resguardá-lo de movimentos contrários do mercado.

 

Títulos prefixados ou pós-fixados?

Nós continuamos enxergando a alocação em títulos pós-fixados como positiva, ainda mais com os juros em patamares elevados, o que traz para o investidor rendimentos positivos com riscos mais reduzidos, mas, nesse mês em específico, com sinais mais claros de que a inflação está arrefecendo e de que as taxas de juros vão começar a ser reduzidas, nós aumentamos a alocação de prefixados nas nossas carteiras recomendadas.

Isso não quer dizer que um investidor tem que escolher um indexador, pois a diversificação tem que existir, só que nesse momento, na hora de fazer a alocação, o investidor pode olhar para as taxas prefixadas com bons olhos, algo que não estávamos recomendando há um tempo atrás.

Em renda fixa, um investidor tem que dividir a sua carteira em pós, pré e inflação, mas isso também depende do horizonte de investimento. Se o investidor vai investir no curto prazo, pós-fixado, pois não adianta colocar em inflação, olhando para perspectivas positivas, se ele vai resgatar em até seis meses, já que o cenário ainda está muito incerto, mas no médio e longo prazo, estruturalmente, ele já deve ter inflação na carteira.

Para o investidor de curto prazo, se ele quiser colocar pré, que coloque uma posição pequena. A nossa carteira mais conservadora, que tem um horizonte de seis meses, tem uma alocação recomendada de apenas 2% de prefixados, 3% de inflação e 95% de pós-fixado. Essa proporção é alterada dependendo do horizonte de investimento do investidor.

 

Títulos do governo ou títulos privados?

Desde o início do ano, nós estamos acompanhando muita volatilidade no mercado de crédito, mas se compararmos com os Estados Unidos, que também está passando por muita volatilidade, existem alguns componentes diferentes. Lá, quando as taxas de juros começaram a subir, os títulos, que em sua maioria são prefixados, começaram a cair. Aqui, quando os juros começaram a subir, os investidores começaram a entrar para o crédito, sem entender que o custo mais alto traz desafios e compromete a saúde financeira das empresas. Assim, é necessário selecionar e diversificar. É por isso que recomendamos a alocação em crédito através de fundos de investimento, pois entendemos que os gestores e suas equipes conseguem fazer essa seleção.

Nós continuamos com uma perspectiva positiva para alocação em high grade e high yield, mas os investidores que estão pensando no curto prazo devem olhar os títulos públicos.

Um investidor mais conservador vai ter mais títulos públicos na carteira e, em tamanho menor, crédito. Já os mais agressivos terão mais crédito. Isso porque o crédito é um fator de risco. Se você está colocando crédito na carteira, você está aumentando o risco de receber, por exemplo, um calote. Só que esse risco não vem sozinho, pois ele é atrelado a mais retorno. Na hora de dar uma turbinada na renda fixa, trazendo um retorno acima do CDI, o crédito tem o seu papel.

É importante pontuar que as Americanas não foi um evento de crédito, mas trouxe sensibilidade para o mercado. A precificação de risco da Light também afetou o mercado, mas já estamos acompanhando a sua normalização, que vem acompanhada de spreads mais altos. Nós fizemos uma pesquisa com gestores de crédito que estão nas nossas recomendações e verificamos que, em comparação a dezembro, os carregos, que é aquela taxa paga acima do CDI, estão bem atrativos.

Se o investidor for mais conservador e o dinheiro é da sua reserva de emergência, então ele não deve ter crédito. Agora, se ele tiver uma tolerância maior e entender que, nesse momento, apesar da volatilidade, ele pode ganhar mais com crédito, então esse é o momento de colocar crédito na carteira.

Um ponto importante: não é hora de resgatar, realizando assim a perda, pois daqui a pouco o movimento de recuperação terá início.

 

Como escolher um bom fundo de investimento?

Quando nós falamos de fundos de investimentos, nós estamos falando de um gestor e de uma equipe fazendo a seleção de ativos para o fundo. Se estamos falando de um time, a primeira coisa que temos que olhar é quem foi escolhido para gerenciar esse dinheiro, e não para a cota, como muitos investidores fazem.

Um investidor deve verificar se o prazo de resgate do fundo está de acordo com o seu horizonte de investimento. Por exemplo, se ele não tem interesse em ficar no longo prazo, o fundo deve ter uma alocação mais conservadora.

Há quanto tempo o gestor trabalha com gestão de fundos e por quais ciclos do mercado, em especial do crédito, ele passou. Como surgiram muitos gestores de crédito nos últimos tempos, isso faz com que seja importante olhar o histórico, verificando se ele conseguiu defender bem a carteira e trazer boas perspectivas.

É importante também verificar o processo, analisando a forma como o gestor seleciona os títulos e se ele revisita a tese de investimento. Num momento de volatilidade como esse, é muito importante ter um time revisitando a tese e olhando o que está acontecendo com as empresas.

Na dúvida, existem researchs. Por exemplo, o nosso research traz recomendações de fundos e gestoras. Se o cliente tiver dúvida, é sempre importante contar com o auxílio de assessorias, consultores de investimentos e analistas de research.

 

Como você está vendo os investimentos além da renda fixa?

Nós ainda temos um pouco de cautela com relação à renda fixa global. Nós preferimos os títulos soberanos, os títulos de governos, ou os títulos corporativos de alta qualidade, mas com uma duration mais curta para proteção da carteira. Nesse momento de muito estresse lá fora e com a curva invertida, as taxas mais curtas estão pagando o mesmo, ou até mesmo mais, que as taxas mais longas.

Com relação aos fundos multimercados, eles são uma tese estrutural das nossas carteiras. Isso porque é dentro dos multimercados que os gestores têm flexibilidade para mudarem a sua visão e montar operações mais táticas, tanto no curto quanto no médio prazo. Esse tipo de alocação é importante nesse cenário em que existem poucas certezas em relação ao mercado.

Com relação à renda variável Brasil, nós continuamos com a visão neutra com viés positivo. Embora a perspectiva seja de queda das taxas de juros, o que tende a ser positivo para a renda variável, elas ainda estão altas. Como essa redução não será de uma hora para outra, isso significa que empresas que dependem de teses de crescimento, que operam mais alavancadas e que precisam de muito capital para funcionar, como as varejistas, tendem a continuar sofrendo. Somando-se a isso os ruídos políticos, relacionados também à reforma tributária, mais recentemente, que pode impactar diversos setores, nós ficamos com uma visão mais cautelosa. É importante reforçar a necessidade de ser diligente na seleção de ações no Brasil.

Quando nós saímos da renda variável Brasil e vamos para a renda variável global, nós temos uma visão mais negativa. O receio de uma possível recessão, o valuation das empresas ainda muito elevado se comparado com as taxas de juros lá fora e a economia a nível mundial desacelerando, podem impactar ainda mais os lucros das empresas. Eu não estou falando para não investir, pois estamos falando de uma classe de ativos que está sofrendo há bastante tempo. Para um investidor de longo prazo, que tem uma visão oportunística, é importante ter esse tipo de ativo na carteira. Não é para tirar, mas para aumentar, ainda não é o momento.

A nossa recomendação é ter uma carteira diversificada e que respeite os limites de risco de cada investidor.

 

Na sua visão, e de uma forma geral, as pessoas entendem o que é marcação a mercado e o seu impacto?

Infelizmente, ainda não com a clareza que deveriam. Quando nós olhamos para a marcação a mercado dentro da renda fixa, e ainda mais para dentro do crédito, muitos investidores pensam que os títulos pós-fixados, por não terem um componente pré, não tem marcação a mercado. Sim, eles têm através dos spreads de crédito. Se em um momento está mais caro tomar dívida, e o investidor tem na carteira vários títulos que pegaram a dívida quando ela estava mais barata, esses títulos são mais arriscados, o que faz com que uma carteira pós-fixada possa ter esse tipo de movimentação.

Um investidor não deve olhar para a marcação do mercado como algo negativo. Pelo contrário, ele pode se beneficiar dessa marcação, como é o caso agora dos prefixados. Se eu coloco em pré quando a Selic está em 13,75%, e ela começa a ter um movimento de queda, a marcação a mercado vai jogar a meu favor, já que eu tenho na minha carteira um título que vai ser mais alto do que os que serão emitidos daqui para frente, já que a taxa de juros vai cair. É importante entender essa dinâmica não como algo negativo para a sua carteira, mas como algo que reflete as perspectivas do mercado.

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