Affonso Romano de Sant’Anna, poeta que popularizou a leitura no Brasil

Affonso Romano de Sant'Anna marcou a literatura brasileira com poesia e engajamento social, modernizou a Biblioteca Nacional

108
Livros abertos
Livros

Escritor, cronista, ensaísta e jornalista, Affonso Romano de Sant’Anna partiu aos 88 anos, depois de ter sido acometido pelo Mal de Alzheimer em 2017 e estar acamado há cinco anos, deixando sua obra como um legado precioso a todos os que o apreciavam. Ele teve papel fundamental na popularização da poesia e na modernização da Biblioteca Nacional, que presidiu na década de 90 por seis anos consecutivos.

Com uma produção literária extensa e influente, focou no engajamento social ao longo de sua carreira, tornando-se um dos nomes mais marcantes da literatura nacional. A obra Que país é este? virou um símbolo de mobilização popular. O intelectual, na realidade, fez tudo na vida para tornar a poesia popular e social. Era uma determinação na vida dele. Todos os livros tinham uma força ligada à sociedade brasileira; era um poeta da realidade brasileira. Um dos melhores, sem dúvida, do país.

Nascido em Belo Horizonte, Affonso começou a trabalhar ainda bem jovem para custear seus estudos. Formou-se em Letras Neolatinas pela UFMG, em 1961, e teve uma trajetória acadêmica sólida, lecionando em universidades brasileiras e estrangeiras.

Nos anos 1960, foi bolsista nos Estados Unidos, onde participou do International Writing Program, voltado para jovens escritores de todo o mundo. Ao longo da carreira, tornou-se um dos principais poetas e cronistas do país, escrevendo semanalmente no Jornal do Brasil por mais de três décadas. Também colaborou com O Globo, Correio Braziliense e Estado de Minas e participou de programas de TV, o que teve grande importância para a popularização da poesia no país.

Espaço Publicitáriocnseg

Além da produção literária, Affonso teve papel crucial na política cultural do país. Como presidente da Fundação Biblioteca Nacional, entre 1990 e 1996, modernizou a instituição, criou o Sistema Nacional de Bibliotecas e implementou o Programa de Promoção da Leitura (Proler), um incentivo à leitura que mobilizou milhares de voluntários em todo o Brasil.

Também presidiu o Conselho do Centro Regional para o Fomento do Livro na América Latina e no Caribe, que fomenta o livro e a leitura na região.

Nas décadas de 1950 e 1960, participou de movimentos de vanguarda poética. Em 1965, lecionou na Universidade da Califórnia, em Los Angeles, e, em 1968, participou do Programa Internacional de Escritores da Universidade de Iowa, que reuniu 40 escritores de todo o mundo.

Em 1969, doutorou-se pela UFMG, defendendo uma tese que analisava a poética de Carlos Drummond de Andrade, sob o título Drummond, um gauche no tempo, em que traça o conceito de gauche ao longo da obra do poeta.

No início dos anos 70, montou um curso de pós-graduação em literatura brasileira na PUC-Rio. Foi diretor do Departamento de Letras e Artes da PUC-Rio de 1973 a 1976, realizando então a “Expoesia”, uma série de encontros nacionais de literatura.

Ministrou cursos na Alemanha (Universidade de Colônia), nos Estados Unidos (Universidades do Texas e de Los Angeles), na Dinamarca (Universidade de Aarhus), em Portugal (Universidade Nova) e na França (Universidade de Aix-en-Provence).

Foi casado, desde 1973, com a também escritora Marina Colasanti, de quem se tornou viúvo em janeiro de 2025.

Convivi com Affonso Romano de Sant’Anna e, com ele, conversávamos naturalmente sobre poesia e os poetas brasileiros e portugueses. Era uma pessoa afável, criativa, bem-humorada e que via poesia em tudo o que estava ao seu redor. Com Marina, sua grande incentivadora, trocava textos e discutia literatura. Os dois formavam um casal espetacular: grandes intelectuais, generosos e simples, que exalavam simpatia e cordialidade, além de talento, brilho e muita sensibilidade. Eram inspiradores.

Morávamos na mesma Rua Nascimento e Silva, que serviu de fonte de inspiração para Tom Jobim; o casal no início da via, nas imediações da Alberto de Campos, e eu, na esquina com a Garcia D’Ávila. A então Faculdade da Cidade ficava ali do lado, e ele ia até lá ministrar cursos, proferir palestras e ainda lançar seus livros, alguns dos quais tenho autografados, com generosas palavras de estímulo e apreço. Aliás, coube a Affonso, para minha honra, escrever o prefácio do primeiro livro que lancei, Educação e Cultura, ensaios e artigos.

Parte o grande Affonso e vai ao encontro da saudosa e primorosa Marina, menos de 40 dias após sua partida. Ambos, agora, estão novamente juntos e foram encontrar amigos queridos, como Clarice Lispector, Rubem Braga e outro casal admirável e notável: Jorge Amado e Zélia Gattai. Todos, certamente, devem estar felizes, fazendo poesias e prosas, inspirados na vida em outra dimensão.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui