Agronegócio: demandas técnicas, reforma tributária e perspectivas

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Caio Carvalho (foto divulgação Abag)
Caio Carvalho (foto divulgação Abag)

Conversamos com Caio Carvalho, presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), sobre as perspectivas do setor.

 

Como a Abag avalia o desempenho do agronegócio no PIB de 2022 (queda de 1,7%) e suas perspectivas para 2023?

Em 2022, nós tivemos uma série de problemas. A Guerra na Ucrânia gerou impactos tremendos na logística internacional que, por sua vez, impactaram nos preços de fertilizantes e insumos. A China, quando voltou com lockdowns devido à Covid, acabou reduzindo a oferta de produtos essenciais para as empresas brasileiras de insumos modernos, o que gerou um aumento de custos relevante. Soma-se a isso, os problemas de clima no sul do país. Nós tivemos uma quebra de produção muito grave com o La Niña. A soma dessas questões acabou segurando muito o PIB agrícola, que chegou a ficar levemente negativo em relação a 2021.

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Para 2023, temos a expectativa de um crescimento de sete pontos percentuais para o PIB agrícola, que será responsável de 0,8% a 1% de PIB positivo no Brasil. Essa é a visão de dois anos muito diferentes.

 

Quais são as principais demandas técnicas do setor para os governos federal, estaduais e municipais?

Como sempre, há uma série de demandas por parte do setor produtivo, e, olhando as cadeias, é possível sacar algumas coisas que são fundamentais a todos. A primeira demanda fundamental, que estamos sentindo na pele esse ano, é a segurança jurídica. Esse é um ponto que tem sido muito desagradável nesse governo, mas que está entrando nos eixos graças aos estados.

Nós percebemos a atuação de alguns estados, como São Paulo e Minas, que estão, inclusive, servindo de exemplo a outros estados. Nós vimos o que aconteceu na Bahia com a Suzano, mas percebo que os governos estaduais, assim como os municipais, estão absolutamente conscientes em relação a essa questão, que une, de uma forma muito importante, o setor.

Com relação à segunda demanda, depois do que vimos no ano passado com relação à seca no Rio Grande do Sul, que foi um dos pontos que derrubou o PIB do setor, a importância do seguro rural tem que ser, cada vez mais, trabalhada. Junto com ele, temos uma demanda importante de Pronaf (Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar) e do Plano ABC, programa de sustentabilidade voltado à integração da lavoura pecuária. Esses programas deveriam estar bem qualificados e com uma dosagem maior no Plano Safra.

A tendência do Brasil é crescer cada vez mais em campos de integração de lavouras, que tenham impacto ambiental muito favorável e que também peguem o pequeno e médio produtor. Essa segunda demanda é comum a todos os setores do agro: um Plano Safra equilibrado e que procure olhar não apenas para esse ano, mas para os próximos anos, ou seja, um Plano Safra plurianual.

A terceira demanda é um olhar mais proativo do governo com relação à globalização. Temos visto um crescimento impressionante de subsídios por parte dos europeus e dos norte-americanos, com novas barreiras de fronteira e com o surgimento de uma série de novas questões.

O Green Deal europeu está sendo combatido internamente em função da realidade que está sendo vivida na Europa. Há uma visão de insegurança alimentar e de insegurança energética que hoje é um fator comum ao mundo todo. Na América Latina, o Brasil e a Argentina são vistos como países que têm uma grande capacidade de expandir oferta, mas, se por um lado a Argentina tem problemas graves de impostos sobre exportações e negativas de exportações de alguns produtos, o Brasil não tem problema algum.

Recentemente, estive em reunião com os alemães da Câmara Brasil-Alemanha onde isso ficou nítido. Apesar de o olhar europeu ser muito protecionista e precaucionista, o Green Deal tem aspectos claros e ultranegativos que vamos começar a discutir e combater, sendo que eles aceitaram isso. Por causa da insegurança alimentar e da representatividade da América Latina como grande exportador, os europeus devem acelerar o acordo entre o Mercosul e a União Europeia.

Essas são as grandes demandas. Além disso, acredito numa integração público privada. Tenho muita esperança de que se possa integrar os ministérios que cuidam do agro. Antes, conversávamos com um ministério, sendo que hoje, conversamos com cinco, além do Itamaraty e do Ministério do Meio Ambiente. É preciso de uma integração público privada para que tenhamos foco de forma a que o Brasil possa se posicionar tanto na OMC (Organização Mundial do Comércio) quanto na OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico).

 

Como a Abag está vendo a discussão sobre a reforma tributária?

Esse é um tema muito relevante, mas que sempre foi muito difícil de ser abordado. Em outros governos se tentou fazer isso. Ainda no governo Temer, esse tema teve um amadurecimento importante, e se não fosse as coisas que aconteceram, teria sido aprofundado.

Em primeiro lugar, o que está claro para mim, e que todos se preocupam, é com o Custo Brasil. Isso é uma coisa que está se tornando insuportável para todas as cadeias produtivas, seja do agro ou das indústrias. Nós temos que simplificar essa loucura de impostos que, na verdade, atendem muito mais aos interesses dos advogados tributaristas do que ao setor produtivo.

O Congresso está tentando trazer para um ponto comum as diferentes propostas de reforma tributária. Acredito que há uma tendência para termos, de fato, uma simplificação. Teríamos a criação de um imposto de valor agregado e uma simplificação dos impostos estaduais e municipais, o que facilitaria a vida de todos, tanto dos produtores quanto do próprio governo, e reduziria, inclusive, esse nível inacreditável de judicialização que temos hoje na área tributária.

Uma função importante da Abag é olhar como essas mudanças deverão acontecer. Como alguns analistas já fizeram as contas de que a carga tributária sobre o agro deve aumentar, vamos ver o que é isso. Por outro lado, como a agroindústria vai ficar? Nós temos que olhar como será a distribuição de impostos nas cadeias agroindustriais.

É preciso olhar essas cadeias e as diferenças que existem entre elas. Às vezes, se tenta com a varinha mágica colocar um imposto para todo mundo, sendo que você tem respostas diferentes de diferentes cadeias. Por exemplo, as cadeias que têm impacto na questão do combustível, como de leguminosas para o biodiesel e da cana-de-açúcar e do milho para o etanol, têm que ser olhadas de forma diferente. Como nós competimos com produtos derivados do petróleo, os impostos sobre produtos fósseis têm que ser maiores.

 

Considerando a conversa que tivemos, há mais algum ponto relevante para trazermos para essa entrevista?

O ponto mais relevante, que é uma preocupação grave que todos temos, é com uma menor intervenção do governo na economia. Independente do governo, aprendemos que a redução de intervenção foi excelente para o agro. Se você olhar o que aconteceu no pós-governo FHC, o governo Lula manteve a linha, mas piorou muito quando o governo Dilma interveio. Houve uma piora significativa que todos sentiram. Nos governos Temer e Bolsonaro, tivemos uma redução muito saudável da caneta do governo, mas, no final do governo Bolsonaro, houve alguma intervenção na área de combustíveis que foi muito negativa para todos os atores.

O governo tem que buscar, realmente, conversar com o setor produtivo e usar menos a caneta, ou usá-la quando conseguir consenso, para não trazer impactos negativos para diferentes cadeias e atores, e, consequentemente, para o PIB brasileiro.

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