Ameaça de faltar fertilizante importado é oportunidade para o Brasil

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Antônio Alvarenga, SNA (foto de Flávio Pacheco)
Antônio Alvarenga, SNA (foto de Flávio Pacheco)

A guerra da Rússia contra a Ucrânia acendeu uma luz vermelha sobre a real situação de dependência do Brasil em relação à importação de fertilizantes. Mas, contraditoriamente, essa guerra pode representar uma fase que será decisiva no tocante ao estímulo para se entrar em uma nova era.

Isso porque a própria crise poderá desencadear uma onda de transformação que representará uma grande ferramenta para a chegada de uma prática de inovações sustentáveis que contribuirá para a evolução da agricultura brasileira.

Ou seja, a possibilidade do risco e de escassez fará com que o país crie viabilidades de sobrevivência, se reinvente apostando principalmente em novas tecnologias que permitam produzir seu próprio fertilizante.

Para saber mais, eu conversei com Antônio Alvarenga, presidente da Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), e veja o que disse sobre a crise do fertilizante no país, por conta de sansões contra a Rússia devido à invasão da Ucrânia:

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Em sua opinião, porque o Brasil não é autossuficiente em fertilizantes no setor agrícola?

Simplesmente devido à produção nacional ser inferior à demanda expressiva por fertilizantes no país. Quanto à exploração de reservas de potássio da Amazônia, encontra-se com a licença temporariamente suspensa, devido a impeditivos legais que remetem à questão de exploração e povos indígenas da região de Autazes.

 

Qual o futuro do agro brasileiro, seus gargalos, desafios e soluções?

O agro brasileiro tem um futuro promissor. A demanda mundial por produtos do agro vai aumentar, e poucos países no mundo serão capazes de suprir as necessidades dos mercados. O Brasil está na lista dos grandes fornecedores em potencial, mas, para que isso aconteça, precisamos continuar o processo de evolução, não baseado apenas nos avanços das ciências biológicas, mas principalmente nas tecnologias da informação. A revolução digital está chegando ao campo.

Mais de 75 startups foram criadas nos últimos dois anos, com foco nas necessidades do agro, refletindo nossa capacidade de criar e inovar. Com essas tecnologias, vamos reduzir o uso de insumos por meio da agricultura de precisão que, utilizando sensores e instrumentos de georreferenciamento, torna possível medir as necessidades nutritivas de cada parcela de solo, permitindo a aplicação econômica de fertilizantes.

 

Em quais aspectos a guerra da Rússia contra a Ucrânia afetará a economia dos países da América Latina, e em especial o Brasil?

Os custos da guerra são compartilhados por todos os países do mundo em suas importações. Os países estão importando inflação e, no Brasil, não é diferente. O Brasil importa 60% do trigo que consome, apesar dos esforços recentes para aumentar a produção nacional.

Embora nossas importações de trigo venham majoritariamente do Mercosul, a guerra joga preços para cima, e somos atingidos pela alta dos custos das commodities no mercado nacional. Compramos um trigo que ficou mais caro. Trata-se de matéria prima para massas, pães, bolos e biscoitos, pressionando aqui esses preços.

Já a importação de fertilizantes passa pelo mesmo problema. Fertilizantes mais caros impactam a cadeia de produção do agronegócio, com efeitos diretos nos produtos finais das lavouras e impactos indiretos sobre as proteínas animais como carnes, incluindo a de frango, suínos etc., ficam mais caras, já que soja e milho são base de ração animal.

 

O Brasil importou, somente em 2021, cerca de 23% de toda a produção de fertilizantes produzidos na Rússia. A que se deve tamanha dependência?

A guerra na Ucrânia escancarou a dependência do Brasil em relação à Rússia e à Bielorrússia na importação de fertilizantes. Em meio à interrupção no fornecimento dos insumos em razão do embargo do Ocidente aos países do Leste europeu, o país busca alternativas para evitar um estrago na produção do agronegócio brasileiro a partir do segundo semestre deste ano.

Apesar do clima favorável, o solo brasileiro é carente de nutrientes, o que torna essencial o uso das substâncias para a produção agrícola. O Brasil é hoje o quarto consumidor global de fertilizantes, atrás de China, Índia e Estados Unidos, e o maior importador mundial de NPK (nitrogênio, fósforo e potássio).

Essa submissão faz com que qualquer abalo pese na economia brasileira, fortemente dependente do agronegócio. Os dados da Balança Comercial do País de fevereiro, divulgados pela Secretaria de Comércio Exterior (Secex) do Ministério da Economia, mostram que o preço pago pela tonelada de fertilizante importado aumentou, em média, 128,80% em relação ao mesmo mês do ano passado, e isso ainda sem o impacto da invasão das forças russas ao território ucraniano.

 

Há uma tendência de alta no preço dos fertilizantes, por conta do conflito entre a Rússia e a Ucrânia. Mas o grande fantasma, no entanto, é que venha a faltar o produto. O Brasil já tem um plano B, se de fato isso vier a acontecer?

A ministra Tereza Cristina (licenciada), da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, é otimista em sua declaração ao afirmar que o Brasil tem fertilizantes suficientes para o plantio até outubro. Já por outro lado a Associação Nacional para a Difusão de Adubos (ANDA), tem estudos bem pessimistas com dados de agentes de mercado, que apontam como data limite o próximo mês de junho para que o estoque disponível se esgote.

 

E, finalmente, como o governo brasileiro pretende contra-atacar esta subserviência em relação à importação de fertilizantes, a médio prazo?

Bom, como estratégia para reduzir a dependência do Brasil das importações de fertilizantes, o Governo Federal criou o Plano Nacional de Fertilizantes, que segundo o Decreto 10.991, que foi lançado no último dia 11 de março no Palácio do Planalto, prevê um planejamento até 2050 no setor de fertilizantes, cobrindo assim os próximos 28 anos.

O Plano pretende promover o desenvolvimento do agronegócio nacional e considerando a complexidade do setor, com foco nos principais elos da cadeia: indústria tradicional, produtores rurais, cadeias emergentes, novas tecnologias, uso de insumos minerais, inovação e sustentabilidade ambiental.

Reunião na SNA (foto de Flávio Pacheco)
Reunião na SNA (foto de Flávio Pacheco)

Brasil em Foco: fórum que discutirá grandes questões nacionais, e que terá como palco o auditório da SNA

Estiveram na sede da SNA, em reunião com o seu presidente Antônio Alvarenga, o produtor rural Flávio Maranhão e o ex-diretor da TV Globo Mauro Rychter. Durante o encontro trataram de alguns assuntos de interesse geral, mas principalmente sobre a produção do evento “Brasil em Foco”, que será lançado agora em maio.

O evento abordará vários temas que serão debatidos, com enfoque, principalmente na área do agronegócio e suas ramificações na política nacional e internacional.

O fórum “Brasil em Foco” terá como convidados e palestrantes nomes consagrados e representantes de segmentos de diversos setores do mercado, além de personalidades públicas relevantes, com poder de definir sobre políticas públicas em todo o país.

 

Por Silvia Pereira, especial para o Monitor Mercantil

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