Uma nova denúncia sobre como funcionava o esquema de fraude contábil das Americanas que deixou um rombo de R$ 40 bilhões na Companhia, publicada pelo portal UOL, deixa mais do que claro a necessidade de divulgar ao mercado os resultados das investigações para que os 140 mil acionistas prejudicados não fiquem no escuro. A denúncia em questão revela que bancos como Itaú, Santander e ABC Brasil teriam contribuído com a fraude ao enviarem aos auditores da KPMG relatórios incompletos, sem as informações necessárias sobre operações financeiras conhecidas como “risco sacado”.
Os trabalhos de investigação do Comitê Independente das Americanas, criado para apurar os fatos que levaram a empresa a entrar em Recuperação Judicial, confirmaram a existência de fraude contábil. A informação consta no Fato Relevante divulgado pela empresa no último dia 16 de julho. O documento, entretanto, não entra em detalhes sobre o conteúdo do relatório entregue ao Conselho de Administração.
“A Companhia precisa revelar quais foram as questões que levaram a esta conclusão. É preciso dar transparência ao conteúdo do relatório por uma fraude que atingiu mais de 140 mil acionistas, evitando-se, inclusive especulações e narrativas” defende Eduardo Silva, presidente do Instituto Empresa, entidade que defende os investidores minoritários e ingressou com arbitragens contra a Companhia e seus controladores.
Segundo o fato relevante, a fraude contábil foi caracterizada, principalmente, por lançamentos indevidos na conta Fornecedores, por meio de contratos fictícios de VPC (verbas de propaganda cooperada) e por operações financeiras conhecidas como “risco sacado”, além de outras operações fraudulentas e incorretamente refletidas no balanço da Companhia. O documento acrescenta que os responsáveis por comandar ou orquestrar as fraudes identificadas não mais integram os quadros da Companhia. No entanto, não entra em mais detalhes.
A novidade trazida pela matéria do UOL está justamente no fato de que instituições financeiras de porte não só teriam conhecimento dos problemas como também teriam ajudado a omiti-los. Mensagens de e-mail, relatórios, comunicados, contratos de convênios com instituições financeiras e materiais de reuniões internas das Americanas encontrados pelos investigadores mostram que havia um “combinado” para que os empréstimos conhecidos como “risco sacado” fossem omitidos nos relatórios entregues aos auditores.
O risco sacado é uma modalidade de crédito em que o banco compra débitos que a varejista tem com seus fornecedores. O banco paga adiantado aos fornecedores e a varejista passa a dever ao banco. Mas como essa dívida com o banco era omitida e já não havia dívida com fornecedores, era como se a empresa estivesse no azul. Isso até o momento em que a bomba estourou.
Não era tão difícil para os executivos das Americanas omitirem informações porque, segundo a B3, havia falhas inadmissíveis de controle e ineficiência do Comitê de Auditoria. Esses motivos levaram a varejista a ser suspensa do Novo Mercado da B3. Depois que a fraude foi confirmada, as Americanas informaram que, diante das evidências apresentadas pelo Comitê, o Conselho de Administração orientou a Diretoria da Companhia, juntamente com seus advogados, a tomar as providências necessárias para a comunicação às autoridades competentes – Ministério Público Federal, Polícia Federal, Comissão de Valores Mobiliários e demais autoridades.
As investigações pretendem apenas examinar a conduta criminal ou administrativa dos envolvidos e não objetiva a reparação dos acionistas lesados. O Instituto Empresa continua a acompanhar de perto o desenrolar das investigações e a atuar em defesa dos interesses dos investidores. “Não mediremos esforços para que o mercado financeiro volte a ter confiança nas práticas de governança corporativa das empresas brasileiras”, concluiu Silva.
Arbitragem
A única forma de os investidores pleitearem ressarcimento no caso da Americanas é buscar reparação por meio de arbitragem. “Através de estruturas coletivas, os minoritários podem ver seu direito discutido nas arbitragens que são impositivas por força dos Estatutos de muitas Companhias de capital aberto. Ainda que individualmente minoritários pudessem arcar com os custos da Câmara, os valores são proibitivos e se trata de uma advocacia altamente especializada”, observa. O presidente do Instituto Empresa faz a ressalva que o processo arbitral também tramita em sigilo.
Desde janeiro de 2023, a Americanas enfrenta uma série de denúncias e processos judiciais após a descoberta de um rombo bilionário em suas contas. A fraude, que resultou em um dos maiores escândalos corporativos do Brasil, envolveu práticas contábeis irregulares e a omissão de informações cruciais aos investidores, afetando significativamente o mercado financeiro.