América racista quer guerra!

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O tropel da cavalaria americana avançando sobre os índios peles-vermelhas no velho Oeste dos EUA foi o brinde de Hollywood até a década de 1960 quando então, a luta do negro americano por mais liberdade, tornou politicamente incorreto defender o racismo, tradição que o homem branco e anglo-saxão americano incorporou a sua cultura, sem qualquer marca de compaixão ou de verniz religioso. Este grupo, hoje auto-intitulado WASP, iniciais de White (branco), anglo-saxão e protestante, e integrado por guerreiros saxões têm conduzido as guerras raciais de sempre: contra os índios americanos, totalmente dizimados; contra a comunidade negra, contra os amarelos do Japão – duas bombas atômicas desnecessárias -; contra os amarelos da Coréia e do Vietnã e desde há muito contra os árabes, reeditando a saga templária européia dos séculos XII e XIII, enraizada na memória histórica daqueles povos a ponto de ter sido recitada por Bin Laden em sua Carta aberta ao Ocidente. A América armada e seu complexo industrial crescente precisam desta e de muitas outras guerras para atualizar e renovar seu estoque de armamentos.A saga dos Cavaleiros do Rei Artur, no cinema, continuamente alimenta este mito co-fundador da cultura anglo-saxã do último milênio.
Os brancos não-anglo-saxões não comungam desta ideologia. Veja-se o exemplo da Igreja católico-romana, hoje mais do que nunca multirracional, a condenar a própria invasão do Iraque por anglo-saxões da América e da Inglaterra, a desejar uma Europa continental encurralada pelo mundo árabe, por sua dependência de petróleo.  
A América racista pró-guerra espalha-se ao longo de seu território, em zonas rurais e interioranas cujos estados, eleitores do Partido Republicano, eram apresentados na cor vermelha e sanguínea distintiva deste Partido, no mapa eleitoral do país, em oposição ao azul dos democratas.O Partido Democrata recebeu sua votação predominante nas Costas Leste e Oeste, estados americanos que sofreram maior fluxo imigratório e que desenvolveram a prática de maior exercício de liberdade face aos grupos minoritários que os integram. Exceção foi mesmo a Flórida que, com grande população afro-latina, sufragou a legenda conservadora republicana.
A meu ver, a grande lição deste processo eleitoral americano foi o debate aberto e constante dos principais temas da agenda atual daquele país: a guerra ao terror e ao Iraque; o déficit público em contínua ascensão, revertendo um imenso superávit deixado pelo Presidente Clinton e os problemas centrais da economia interna: desemprego, saúde e educação. Mas a ênfase foi a manutenção da Guerra ao Iraque, com Bush se vangloriando de ser o comandante-em-chefe das forças militares da América e zombando da capacidade de Kerry em sê-lo, malgrado sua experiência no Vietnã, que Bush aliás, sumido, não teve.
A argumentação contínua dos dois candidatos – Bush e Kerry – nos seus muitos discursos de campanha em torno destes pontos, acrescida ainda dos três debates entre ambos, além de outro entre candidatos a vice, exibiu, à exaustão, todo o temário, retirando dúvidas e pontos obscuros à compreensão do eleitor.
Além disto, o confronto continuado nos jornais entre os diversos pontos de vista e a extensa literatura circulante na Internet por ambos os comitês de campanha, não só motivou eleitores a comparecerem às urnas – recorde de mais de 125 milhões de eleitores – como aprofundou a compreensão dos problemas acima, dissecados com a apresentação das inúmeras variáveis de cada um, retirando dúvidas para a decisão eleitoral e o exercício do voto, bastante racional, embora as festas das Convenções enfatizassem o aspecto emocional das campanhas. Dúvidas desfeitas: o custo da guerra não pesou na decisão.
Com uma percentagem de 51% pró-Bush X 48% pró-Kerry – contrariando boa parte das pesquisas antecedentes, o povo americano disse sim à guerra e a seu aprofundamento e ampliação; disse sim à perda de vidas humanas; disse sim ao déficit público que financia a guerra; disse sim ao corte de impostos em prol dos mais ricos; disse sim à destruição filmada do Iraque. (Vide Hollywood, Bagdá: o prazer de matar!, neste MM, a 18.04.03, de minha autoria)
A América apóia a guerra ao Iraque, convencida de que assim luta contra o terror. A América quer esta guerra. Aqueles muitos estados do interior americano falaram bem mais alto que as passeatas pacifistas oferecidas pelos estados litorâneos na televisão.   As passeatas não representam a América. Quem as representa são os estados vermelhos que sufragaram republicanos e Bush, aumentando sua bancada no Congresso. Sim à guerra.
A América da maior frota automobilística do mundo, e com motores de alto consumo, sabe ainda que precisa gasolina do petróleo importado do Oriente Médio. Sabe ainda que a ocupação do Iraque se insere numa estratégia americana de predomínio militar para assegurar fontes de abastecimento do cru, alvo material da guerra, racionalizado com a suposta oferta ao Iraque de uma democracia que mal praticam. Menos ainda cristianismo, presente, aliás, entre aqueles povos desde o tempo do próprio Cristo, habitante local. Crises futuras no abastecimento do petróleo oriundo do Oriente Médio forçarão cada vez mais a América Latina a abastecer os EUA, sendo-lhes vital desde logo destruir nacionalismos e antiamericanismos de décadas anteriores.
“O petróleo ainda será nosso?” Qual o grau de destruição dos valores brasileiros para aderir aos EUA? Já está em curso a campanha desmoralizadora de  valores nacionais: a superação de Vargas, criador da Petrobras, a supressão do trabalhismo, a adoção e a discussão continuada do neoliberalismo pela imprensa internacionalizada, e assim por diante. Até esta besteira do dia das bruxas (Halloween) se insere neste circuito.
A América racista, e não apenas Bush, quer guerra! Com petróleo, também estamos na reta. E pior, sem lideranças treinadas para resposta, sem uma denúncia à invasão, com Lulas e FHCs orgulhosos e supondo-se amigos de Bush. A América está, isto sim, de olho em suas necessidades futuras de petróleo. Por isto permanecerá em guerra! E por mais quatro anos (“More four years”), brado continuo da multidão presente aos comícios de Bush. Brado da América! Brado de guerra!

Paulo Guilherme Hostin Sämy
Ex-conselheiro da Associação Brasileira dos Analistas do Mercado de Capitais (Abamec).

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