Alienado e imerso num mundo utópico que concebeu para seus abnegados seguidores, o presidente Bolsonaro menospreza alertas e comentários em relação à realidade e perspectivas futuras.
Com tal atitude, além de acumular críticas na comunidade internacional, posiciona o Brasil como pária e submisso seguidor do decadente Trump, supremacista, insensível à degradação do meio ambiente e aos direitos das minorias.
Nossa população sofre os malefícios dessa postura, ao ver o governo impassível frente às aglomerações nas agências do inoperante INSS e à trágica pandemia, que, já tendo provocado mais de 150 mil óbitos, se intensifica pela falta de ações a nível nacional.
Com visão puramente eleitoreira e em busca de resultados a curto prazo, o presidente faz uso político da distribuição de migalhas a milhões de desassistidos e desempregados. Para assegurar apoio no Congresso, oferece cargos e regalias a renomados convivas do pantanal político e religioso. Todos sabem que tais benefícios se esgotarão já no início do próximo ano, mas, como aproveitadores de ocasião, contam com retorno eleitoral nas eleições municipais.
Para o enfrentamento do ameaçador cenário de recessão e desemprego, previsto por destacadas organizações internacionais, o Governo Federal se mostra incapaz de conceber programas e concretas providências para fortalecer o sistema produtivo doméstico.
Ao repudiar as críticas, reforça seu posicionamento no caminho das desastradas lideranças populistas que, uma vez no poder, fazem uso de estratégias de autopromoção política e ideológica. Com o uso intensivo das redes sociais, enfatizam notícias inverídicas em relação a imaginados opositores e, para ofuscar as angústias da sociedade, agem para mascarar inseguranças em relação ao futuro.
Nos “fóruns” internacionais, reiteram aleivosias ideológicas e oportunistas, ombreando-se a agremiações e países que rejeitam cooperar no concerto das nações. Foi dessa forma que, no recente discurso de abertura dos trabalhos da ONU, histórico privilégio concedido ao Brasil, nosso presidente se manifestou rispidamente, ao rejeitar críticas pela desatenção com o meio ambiente e as queimadas na floresta amazônica.
Atingiu o ápice da insanidade ao alegar serem tais males resultado da ação de índios e matutos, se contrapondo às investigações da Polícia Federal, que as concluiu incriminando fazendeiros e empresários pelos crimes ambientais.
Mas, mesmo sob a pressão de profissionais e agentes da pós-verdade, a sociedade brasileira vem buscando informações verdadeiras através da mídia independente e livres manifestações nas redes sociais. Com justificado alívio, acompanha investigações policiais e inquéritos que intimidam baderneiros, empresários e agentes da subversão, dentre os quais estão incluídos familiares do presidente.
As pretensões subalternas vêm motivando debates e contraposições no Congresso e no Judiciário, valorizando o diálogo institucional e a desejada integração política. Nesse ambiente republicano se sobressai a anticorrupção, bandeira vitoriosa para ascensão ao poder. Mas ela ressurge como contra ponto, ao serem cobrados esclarecimentos sobre manobras para enfraquecer o espírito da Lava Jato.
Faltando ao presidente argumentos para mobilizar os fanáticos que ainda cultivam suas proposições supremacistas, num discurso que beira a irracionalidade, ousou declarar não haver necessidade de acabar com a Lava Jato, pois a mesma não mais se justifica no seu governo, imune à corrupção. Tão fantasiosa realidade acaba transformando arroubos e falácias em verdadeiro canto do cisne, que “mudo durante toda a vida, poderá cantar uma bela canção, mas para anunciar sua morte eminente”.
No que resta de credibilidade para a nação brasileira, caberá à sociedade esclarecida impor o cessar de tantas e repetidas agressões à convivência democrática. Nesse momento de inadiáveis definições, nos ilumina o ensinamento que a história registrou no Senado romano, antes do alvorecer da cristandade. Elevando a voz contra o desagregador Catilina, o brilhante tribuno e filósofo Cícero bradou: “Quo usque tandem abutere patientia nostra”.
Da mesma forma, resta à ludibriada população bradar, em bom português: “Até quando abusará da nossa paciência, senhor presidente?”.
Sergio Xavier Ferolla
Tenente-brigadeiro, ministro aposentado do Superior Tribunal Militar.