O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de outubro registrou inflação de 0,24%. No ano, o índice acumula alta de 3,75%, e nos últimos 12 meses, alta de 4,82%. Para entendermos melhor a inflação do mês passado, conversamos com três especialistas sobre suas avaliações.
Segundo o último boletim Focus, divulgado na segunda-feira, o mercado tem a expectativa de uma inflação de 4,63% para 2023. Para 2024, a expectativa é de 3,90%. A próxima reunião do Copom está programada para os dias 12 e 13 de dezembro.
Rachel de Sá, chefe de economia da Rico
De uma maneira geral, o IPCA de outubro foi positivo, vindo abaixo da expectativa de 0,29% do mercado. Esse resultado mostra que se não fosse o risco fiscal e o cenário internacional bastante incerto, e aqui eu me refiro às taxas de juros de longo prazo nos Estados Unidos que ainda estão muito elevadas e a incerteza muito grande sobre os juros no mundo desenvolvido, o Banco Central (BC) até poderia acelerar o ritmo de redução da Selic.
Basicamente, o BC tem falado nos últimos meses que os países estão passando por dois processos de desinflação pós-pandemia. O primeiro é relacionado ao mundo voltando ao normal, com a normalização das cadeias de produção tanto de produtos industrializados quanto básicos. Isso é um reflexo do fim da pandemia e da readaptação do mundo à guerra entre Rússia e Ucrânia. Essa primeira pernada de redução da inflação, que chamamos de desinflação, que é diferente de deflação, já se consolidou.
A segunda fase de desinflação é mais relacionada aos serviços, cujos preços são menos sensíveis aos choques de oferta, como questões climáticas ou uma guerra. É por isso que o BC fala muito dos preços do setor de serviços, pois eles são mais difíceis de serem controlados uma vez que sobem. É nesse estágio que está o Brasil e boa parte do mundo. O resultado da inflação de outubro consolida essa segunda fase de desinflação.
Quando olhamos para os números da inflação de serviços, eles estão cedendo bastante, até mais rápido do que o esperado. Os serviços subjacentes, que tiram os preços que são mais voláteis, subiram em linha com a nossa expectativa, 0,19%. Quando fazemos a média móvel de três meses, eles caíram de 3,6% para 3,4%, já se aproximando da meta do BC. Isso mostra que o segundo estágio de desinflação está ganhando força e seguindo o seu curso.
Contudo, isso não significa que a inflação saiu do radar, pois alguns preços seguem pressionados, mas esses são movimentos pontuais. O que vemos como risco está mais adiante, principalmente o risco fiscal, pois existem três canais de transmissão de inflação relacionados ao maior gasto público. O primeiro é o aumento da demanda, pois se o governo está colocando muito dinheiro em circulação, a demanda por bens e serviços aumenta, o que pressiona os preços.
O segundo é formado pelas expectativas. Se o governo está gastando bastante e todos sabem que existe esse movimento de aumento de demanda, a expectativa dos preços no futuro não converge para a meta do BC. Por enquanto, as expectativas estão desancoradas. Elas estão acima da meta, mas não muito, mas se o risco fiscal for desancorando, isso pode piorar ainda mais, o que mexeria no terceiro canal: a taxa de câmbio.
Quanto mais o governo gasta e quanto menos as contas públicas tem credibilidade, mais os investidores vão precificando isso nos ativos do país, incluindo a moeda, e quanto mais desvalorizada a moeda, mais se pressiona a inflação.
Helena Veronese, economista-chefe da B.Side
O IPCA de outubro veio melhor do que o esperado e desacelerou com relação ao resultado de setembro. Com relação à sua composição, foi uma inflação muito benigna, embora o índice de difusão tenha aumentado um pouco. Ele ficou próximo dos 50%, sendo que esse aumento se explica, na minha leitura, pelos alimentos, que saíram de deflação para um patamar positivo, em boa parte devido a efeitos climáticos. Outro fator que contribuiu para esse resultado foram os combustíveis, devido aos cortes recentes anunciados pela Petrobras.
Daqui para a frente, há uma tendência de números mais altos por conta da inflação de alimentos voltando a crescer. Mais altos, porém sob controle, pois eu não vejo grandes surpresas na inflação. Os impactos das mudanças climáticas nos alimentos vão continuar acontecendo, mas, pelo menos por hora, isso está na nossa conta. Inclusive, se tivermos agora uma alta muito forte dos alimentos por conta dos efeitos climáticos, a inflação de 2024 pode acabar ficando um pouco mais baixa devido a antecipação desse efeito.
Honestamente, se fosse só pela Inflação Brasil, daria até para falar que o BC vai acelerar o corte de juros, mas temos o cenário externo super adverso com os juros longos nos Estados Unidos subindo.
Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research
Quando observamos a composição do IPCA de outubro, o cenário segue apresentando uma trajetória benigna para a inflação. Os preços de serviços e de serviços subjacentes desaceleraram tanto na variação mensal quanto no acumulado de 12 meses, o que é bastante positivo para o cenário do BC; a média dos núcleos de inflação passou de 5,0% em setembro para 4,7% em outubro, e o índice de difusão subiu para 52,5% ante a 42,7% de setembro, mas isso não é preocupante, pois o nível está abaixo dos últimos anos.
De forma geral, esse IPCA corrobora o nosso cenário de inflação controlada, sendo que esse contexto dá segurança para que o BC continue realizando cortes na taxa de juros. Além disso, o boletim Focus continua mostrando estabilidade das expectativas de inflação. Para 2023, o mercado começou a projetar uma inflação terminal dentro do intervalo da meta. Para os períodos mais longos, a inflação segue estável há algumas semanas, levemente acima da meta de 3,0% por conta de incertezas como, por exemplo, o risco fiscal.
O BC enxerga uma melhora no cenário, mas é preciso que a inflação continue dando sinais claros de convergência para meta, principalmente, as medidas subjacentes.
*Atualizado em 10/11/2023, às 20:47