Bairros mais ricos são praticamente imunes às entradas da polícia em domicílio em busca de drogas. Em cinco cidades pesquisadas em estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) – Brasília, Curitiba, Manaus, Fortaleza e Rio de Janeiro – de 307 entradas da polícia em domicílios em busca de drogas, 91,2% ocorreram em bairros com renda domiciliar mensal per capita de até um salário mínimo.
Apenas seis entradas ocorreram em bairros com renda de cinco a dez salários mínimos, das quais metade foram entradas respaldadas por autorização judicial. Não houve nenhum registro de entrada domiciliar em bairros com renda superior a dez salários mínimos.
Como nos bairros mais pobres a população é majoritariamente negra, este é o perfil racial mais atingido pelas entradas em domicílio: 84,7% ocorreram em bairros predominantemente ocupados por pessoas negras. A exceção é Curitiba, onde em todos os bairros há predomínio de pessoas brancas. Ainda assim, na capital paranaense as entradas se concentram fora dos bairros em que há maior proporção de população branca.
As evidências estão no estudo “Entrada em Domicílio em Caso de Crimes de Drogas: geolocalização e análise quantitativa de dados a partir de processos dos tribunais da Justiça estadual brasileira”, publicado pelo Ipea.
Entre os casos com entrada da polícia em domicílio, verificou-se que em 56% não houve informação sobre a existência ou inexistência de consentimento para a entrada; em 34% houve alegação de que a entrada foi franqueada, autorizada ou consentida; e em 7% dos processos houve versões conflitantes ou dissonantes sobre autorização para entrada. Já a recusa ou negativa à entrada foi registrada em apenas 3% dos processos.
Nos casos de entrada em domicílio, as proporções em função da cor/raça dos réus foram parecidas às do universo pesquisado: 23,6% de processos referentes a réus brancos, enquanto os casos de entrada em domicílios onde estavam negros que seriam transformados em réus foi de quase o dobro, conforme registro em 44,3% de processos.
Nos casos de entrada em domicílio amparada por mandado judicial, a diferença entre réus brancos e negros diminui de forma significativa, tornando esse tipo de abordagem (com ordem judicial) mais isonômica. Ao ser comparada com a média geral, nota-se uma incidência de entradas com mandado em casas de réus brancos apenas um pouco menor (30,2%) se comparada com a entrada em casas onde estavam réus negros (34,7%).
“A hipótese, já bem conhecida na discussão acadêmica sobre as políticas de drogas (…) é que as entradas em domicílio se concentram nas casas de pessoas que vivem nas regiões mais periféricas e pobres das cidades, sendo mais frequente em bairros cujos moradores possuem cor/raça predominantemente negra”, escrevem os pesquisadores.
A pesquisa encontrou como principais motivações o patrulhamento de rotina ou a abordagem com base em comportamento suspeito (indicado em 32,5% dos processos) e a denúncia anônima (30,9% dos processos). Em menor proporção, foram registradas como motivação para a abordagem a existência de denúncia não anônima (7,2%) e o cumprimento de mandados de busca e apreensão (6%).