Conversamos sobre o resultados do Banco do Brasil (BB) no 1T25 com Evandro Medeiros, analista CNPI da Suno Research.
Qual a sua avaliação sobre o resultado do BB no 1T25?
É inegável que o resultado foi fraco, já que houve um decréscimo da margem financeira em decorrência da receita de juros ter subido em uma proporção inferior ao custo de captação. O resultado de tesouraria também foi muito fraco. Houve um impacto da 4966, mas como esse impacto foi pontual, eu prefiro ver o resultado normalizado do BB.
O que me chamou a atenção foi, realmente, a inadimplência do agro. Dos quatro principais bancos, o BB é o mais presente no agronegócio, originando cerca de 50% do crédito rural do país. Esse posicionamento tem sido uma força nos últimos anos, já que, ao longo de 30 anos, essa indústria cresceu cerca de 3% ao ano de forma consistente e acima da média do crescimento do PIB (Produto Interno Bruto). Contudo, no curto e médio prazo, isso tem sido um problema para o BB muito por conta da elevação dessa inadimplência.
Quando olhamos a inadimplência do agro, nós vemos um impacto relevante do custeio do agronegócio, como o produtor de soja que utiliza o crédito para comprar insumos. Isso fez com que essa inadimplência fosse elevada para cerca de 3% da carteira. Com relação à inadimplência consolidada, o BB foi para 3,86%, o que fez com que ele se aproximasse dos níveis do Bradesco, que tem passado por esse problema por conta da originação feita nos últimos anos.
Se olharmos o IC-Br (Índice de Commodities – Brasil), nós vemos que ele, realmente, está em baixa, especialmente quando comparado a 2022 e 2023, o que mostra como as margens dos produtores têm sido pressionadas. Dito isso, na minha opinião, esse é um efeito pontual, pois, no longo prazo, o posicionamento do BB no agro é uma vantagem estrutural do banco, já que o setor é muito resiliente. Nós achamos que o agro brasileiro é só botar semente no chão que sai soja, mas ele é muito tecnológico.
De positivo, o BB teve o resultado da BB Gestora, que hoje possui 19% do mercado nacional de gestão de ativos. Esse é um mercado muito rentável que tem gerado uma receita de cerca de R$ 9 bilhões anuais e impulsionado a rentabilidade do banco nos últimos anos, mas essa é uma linha que tem sido subestimada pelos investidores, já que ela não fica tão clara.
Com relação à BB Seguridade, que é responsável por cerca de 20% do resultado do BB, como ela também possui um posicionamento muito forte no agro, nós vimos um arrefecimento da emissão de prêmios, o que é natural nesse contexto. A seguradora reportou um resultado um pouco fraco, mas isso também é pontual, já que ela é muito eficiente. Por exemplo, o Índice Combinado da BB Seguridade, que é a sinistralidade + perdas operacionais em relação aos prêmios, sendo que quanto menor esse índice, mais eficiente é a seguradora, é de 65% contra 80%, 85% da Bradesco Seguros, sendo ele um dos mais baixos do planeta. Com relação a BB Corretora, que é responsável por cerca 40% do resultado consolidado da BB Seguridade, consequentemente, 8% do resultado consolidado do BB, ela é uma corretora que opera com pouquíssimo capital, vende seguros pelo balcão do banco e possui uma rentabilidade que excede os 800% anualizados.
Em termos de alavancagem, nós tivemos uma leve melhora. O Índice de Capital Principal, que mensura os ativos de melhor qualidade em relação aos ativos ponderados ao risco, teve um leve aumento, o que significa que a alavancagem foi reduzida marginalmente. Isso foi positivo. O Índice de Cobertura subiu para 183%, o que significa que existe um maior nível de provisões constituídas em relação à inadimplência observada nos últimos 90 dias, o que também merece ser destacado como positivo, apesar de que seria mais saudável se esse índice estivesse mais próximo de 200%.
Em termos de rentabilidade, o BB teve um ROAE (Return on Average Equity) de 16,7% sem o ajuste gerencial. Com esse ajuste, nós estamos falando de um ROAE mais próximo de 16%, o que é uma queda bem expressiva para um banco que vinha entregando 20% de ROAE, quase o retorno do Itaú, que é o benchmark do setor.
Por mais que o resultado tenha sido, em suma, negativo, eu espero uma certa recuperação, especialmente para o segundo semestre, quando vamos ver uma melhora do agro, já que a safra deste ano deve vir muito positiva, o que, invariavelmente, acaba impactando o BB positivamente.
Quando sai um resultado do BB quais são os primeiros números que você analisa?
Eu gosto muito de olhar o Índice de Cobertura e o Índice de Capital Principal, que é parecido com a Basileia, apesar de ser mais conservador, já que a Basileia considera o capital complementar. Eu também gosto de olhar o ROA (Return on Assets), que é o retorno sobre o ativos, antes do ROAE, já que ele representa a rentabilidade desalavancada do banco. Se você pegar o ROA e multiplicar pela alavancagem, que são os ativos em relação ao patrimônio líquido, você chega em uma aproximação muito válida do ROAE, que é o retorno sobre patrimônio líquido que todo mundo olha. Eu olho também o ROAE, que é o que importa no final das contas, mas o ROA também é muito importante.
Outros números que eu gosto de olhar são a margem financeira (NIM, Net Interest Margin), sendo que o BB chama de margem financeira o resultado líquido de juros, que é a receita de juros menos o custo de captação; a inadimplência de 90 dias; o PDD (Provisão para Devedores Duvidosos) como percentual da carteira; o nível de provisionamento em relação à carteira de crédito; e o crescimento da receita de serviços, que tende a ser muito rentável para o banco, já que requer menos capital.
Onde o BB faz o seu resultado?
Boa parte do resultado do BB vem da margem financeira, mas o banco também tem um resultado relevante com a receita de serviços, onde entram a BB Gestora, a BB Seguridade, com as suas receitas de seguros, previdência e capitalização, e as tarifas de contas correntes, que geram, aproximadamente, R$ 5 bilhões anuais.
R$ 5 bilhões em tarifas por ano?
É muita coisa, mas isso vem caindo, e eu fico feliz que isso esteja acontecendo. Isso porque existe uma conta gratuita básica do Banco Central, que eu recomendo para todo mundo, ideal para pessoas que fazem muito Pix, não tiram muitos extratos e não fazem TEDs e DOCs. Se não for isso, a pessoa pode ir para um banco digital. Existe um grande receio com esses bancos, mas, por exemplo, o Nubank e o Inter, que eu olho muito e gosto, apesar de estarem muito caros, estão muito capitalizados. Por exemplo, o Índice de Capital Principal do Nubank e do Inter são superiores ao do Itaú. Esses dois bancos são pouco alavancados e possuem uma carteira muito sólida, além dos seus correntistas contarem com a proteção do FGC (Fundo Garantidor de Créditos) até R$ 250 mil.
Onde o BB poderia render mais como banco?
O BB teve um crescimento das despesas administrativas na ordem de 7% quando comparado ao 1T24. Dessa forma, o banco poderia melhorar o controle dessas despesas, já que esse crescimento assusta um pouco, especialmente em um momento em que a inflação está um pouco mais elevada.
O BB também poderia melhorar na originação de crédito, já que o banco focou muito no agro por conta da expansão agressiva no setor, mas, novamente, isso vai ser positivo no longo prazo, por mais que seja detrator de resultado em 2025.
As ações do BB caíram após a divulgação do resultado do 1T25, mas ele não foi tão ruim assim. Eu já esperava esse resultado, mas não tão fraco, pois eu não trabalho com projeções trimestrais, e sim com bases anuais, mas o ROAE de 20% do BB não me parecia sustentável. Talvez ele seja mais em linha, com 15%, 16%, talvez com 17% nominais. O BB também tem as incertezas de que a cada quatro anos pode mudar o controlador. Por exemplo, é visível que a gestão do BB mudou nos últimos dois anos, sendo que no governo anterior, o CEO do BB fez uma alocação muito diligente, fechou agências e reduziu o quadro de funcionários, o que melhorou a eficiência e o resultado do banco. Dessa forma, o BB poderia melhorar a sua estrutura de despesas administrativas e se digitalizar mais.
O aplicativo do BB é bem razoável. Você consegue fazer transações, acha tudo, e a parte de investimentos é bem razoável, apesar de os investimentos oferecidos pelo banco serem muito ruins, já que boa parte da rentabilidade do BB vem do baixo nível de juros que ele entrega para os seus clientes. Por exemplo, o custo de captação do BB no 1T25, foi de cerca de 72% da Selic, sendo que 20% do total de R$ 1 trilhão em depósitos foram colocados na poupança, que foi remunerada a 0,6% da Selic no período, ou seja, um juros de cerca de 8% líquidos no ano. Como essa estrutura de funding é muito positiva para o banco, mas não tanto para o cliente, eu prefiro ser acionista do BB a cliente, ainda que reconheça que o serviço do banco não é ruim na maioria das áreas onde ele atua.
Qual a sua avaliação sobre o payout e dividend yield do BB?
Nos últimos anos, o BB tem distribuído de 40% a 45% do seu resultado na forma de dividendos e juros sobre o capital próprio. Se imaginarmos um payout de 40%, o que me parece muito mais provável dado o possível consumo de capital por parte das perdas, nós estamos falando de uma distribuição de mais ou menos R$ 14 bilhões. Se o valor de mercado do BB estiver em R$ 148 bilhões, já considerando a queda da ação, e assumindo um lucro de R$ 34,9 bilhões, nós teríamos uma distribuição de R$ 13,9 bilhões com um dividend yield de 9,4%, o que é bem positivo, pois além do dividend yield, você tem o crescimento.
Cabe destacar que para calcularmos o retorno sustentável do BB, nós utilizamos uma fórmula muito simples. Ele vai ser uma função do ROAE pelo payout (Retorno sustentável = ROAE * (1 – payout). Por exemplo, se o BB tiver um ROAE de 10% e distribuir 40% do seu lucro líquido, esse crescimento vai ser de 6%, que somado ao dividend yield de 9,4%, dá um retorno nominal de 15,4%. Se considerarmos um ROAE de 16%, o crescimento do BB vai ser de 19,4%. Como eu gosto muito de olhar a regra do 72, se pegarmos 72 e dividirmos por 19,4%, nós teremos em 3,7 anos, ou seja, em pouco menos de quatro anos, um retorno de 19% que dobra o capital em termos nominais, o que é maravilhoso. Dessa forma, eu considero as ações do BB muito atrativas, mesmo considerando a sua gestão estatal que possui um desalinhamento de interesses com o minoritário.
Qual a sua avaliação sobre o preço da ação do BB?
Mesmo com esse resultado e com a queda das ações, nós recomendamos a compra de ações do BB.
Uma pessoa que compra ações do BB deve se preocupar com os movimentos de mercado ou em formar um patrimônio em ações do banco?
Formar patrimônio. No curto prazo, a cotação vai ser influenciada por fatores macroeconômicos que não estão sob o nosso controle, mas se você segurar a ação do BB por muitos anos, você estará exposto ao crescimento da economia brasileira, que acontece mesmo que aos trancos e barrancos; a um dos setores agropecuários mais eficientes do planeta, e ao crescimento do próprio banco, além de ganhar dividendos que são bem interessantes. Inclusive, com a queda da ação, o BB já apresenta uma margem de segurança mais robusta do que com a ação a R$ 30.
Qualquer investimento em ações deve ser feito com o objetivo de formar patrimônio, pois no curto e médio prazo, é impossível fazer qualquer previsão. Se no final de um ano você verificar as projeções de lucratividade que haviam sido feitas pelos analistas no início do ano, você vai ver que eles não acertam. Como disse, nós apenas trabalhamos com projeções anuais, e não com as trimestrais que os analistas gostam de fazer, pois o que realmente importa é o retorno ao longo do ciclo, a lucratividade normalizada do banco.
Qual a sua avaliação sobre as perspectivas do BB?
Eu enxergo um ambiente bem desafiador no curto prazo; acho que a gestão, claramente, errou a mão, especialmente na concessão de crédito, e existe a pressão na receita de tarifas das contas correntes, mas o que eu mais gosto no Banco do Brasil é, realmente, o seu posicionamento no agro. Como disse, o agro é um detrator de resultado no curto prazo, mas no longo prazo, ele vai se provar um diferencial competitivo para o banco. Veja que todo ano o agro produz mais com menos capital humano, tempo de produção e área plantada.
O que eu vejo de grande risco para o BB são as questões climáticas. Isso porque, por mais que o agro seja muito produtivo, o aquecimento global pode impactar algumas culturas. Esse é um risco que não deve ser ignorado.
Com a ação sendo negociada com um preço muito abaixo do valor patrimonial e com o banco tendo vantagens competitivas que o Bradesco e o Santander não possuem, com exceção do Itaú, que é um caso à parte, o BB é uma grande oportunidade.
Considerando a conversa que tivemos, você gostaria de acrescentar algum ponto à sua entrevista?
Nós podemos esperar um resultado mais fraco para o 2T25 e até para 2025, mas como a minha cabeça é voltada para como o BB vai estar daqui a 5, 10 anos, e o seu potencial de distribuição de dividendos, eu vejo que a ação terá um retorno muito interessante acima da Selic e da NTB longa.