Bolsonaro, o não-presidente e o anticandidato

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Jair Bolsonaro, sonda hospital (Foto: reprodução Twitter)
Jair Bolsonaro, sonda hospital (Foto: reprodução Twitter)

O ano é 2018. As eleições definem-se pelo nojo em relação aos setores políticos dominantes ao longo da Nova República, notadamente PT, PSDB e PMDB. Esse nojo, que sempre existiu, era potencializado pela Operação Lava Jato, amplamente apoiada pela grande mídia, com quem formou um consórcio para criminalizar as grandes empresas nacionais e os investimentos públicos e estatais. A esquerda, recém-impeachmada e com o seu principal líder preso, mostra-se acuada.

Nesse cenário, Bolsonaro, o capitão de pijama desprezado pelas elites intelectuais, arrebata corações e mentes desejosos de uma renovação moralizadora e, insuflado por uma facada para lá de duvidosa (embora na época poucos ousassem levantar dúvidas), quase crava a sua vitória eleitoral em 1º turno.

Hoje, em 2021, o cenário mostra-se bastante diverso. Desvaneceu-se a esperança messiânica em torno de Bolsonaro, mesmo entre seus mais leais apoiadores. Os setores políticos dominantes da Nova República, com apoio tácito do presidente Bolsonaro, conseguiram reunir forças para derrotar a Lava Jato e, assim, impedir o completo desmantelamento institucional do país, mesmo que ao preço de aceitar o desmantelamento econômico e social. A esquerda volta ao palco político pela reabilitação judicial e midiática da figura de Lula, o franco favorito (até o momento) das longínquas eleições de 2022.

O que aconteceu no meio do caminho para haver uma reversão tão profunda da conjuntura? Resumidamente, Bolsonaro, eleito para ser um ditador, para “fechar o regime” e sanear a política nacional, revelou-se aquilo que ele sempre foi, um não-presidente, incapaz de qualquer comando executivo que não seja para beneficiar a si e aos filhos, um ergófobo avesso às responsabilidades do cargo que ocupa.

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A ideologia ultraliberal de seu não-governo, sob inspiração da caricatural Escola Austríaca de Economia, desprezada na própria Áustria, reflete não apenas a subserviência às finanças transnacionais, mas, pior do que isso, a indisposição para cumprir o mandato institucional que lhe foi conferido pelo povo em favor do povo, em absoluto desdém pela vontade democrática.

Em plena crise pandêmica e econômica internacionais, que exigem, como nunca, o papel ativo do governo federal para proteger os cidadãos e a economia nacional, o não-presidente Bolsonaro lava as mãos, esperando que os milagres mercadistas de São Mises resolvam os problemas. Pior ainda, desfaz-se dos instrumentos de proteção nacional já existentes, como as unidades produtivas da Petrobras, criminosamente entregues a fundos estrangeiros em tenebrosas transações.

Ao que tudo indica, Bolsonaro será candidato à reeleição. O que ele terá a mostrar? Absolutamente nada. Se, em 2018, ele representava, pelo menos simbolicamente, um anseio por melhorias, hoje isso não é mais possível, pois ele não só se mostrou incapaz de melhorias, como decididamente escolheu não agir para efetivá-las.

Sua próxima candidatura, se houver, será absolutamente vazia e despropositada, um peso morto, uma verdadeira anticandidatura, e tende, pela própria lógica de movimentação das forças políticas, a se tornar supérflua e inexpressiva. Caso não se torne, apenas mostrará a nulidade das demais candidaturas e que o buraco negro em que mergulhou o Brasil é ainda mais devastador do que se imaginava.

 

Felipe Maruf Quintas é doutorando em Ciência Política pela Universidade Federal Fluminense (UFF).

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