Brasil não pode ser um Cavalo de Troia nos Brics

Lula tem que parar de pisar em ovos e esmagá-los com força Por Eduardo Vasco

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Cúpula do Brics 2024 em Kazan (foto de Ramil Sitdikov, Brics Russia)
Cúpula do Brics 2024 em Kazan (foto de Ramil Sitdikov, Brics Russia)

Há uma pressão enorme e crescente sobre o governo brasileiro vinda dos Estados Unidos, exercida principalmente através dos agentes do imperialismo americano no Brasil — em particular, políticos da direita, burocratas dentro do Itamaraty e grandes meios de comunicação.

O Partido da Imprensa Golpista (PIG), como cunhou o saudoso Paulo Henrique Amorim, já passou da fase de ignorar os Brics (embora ainda insista em diminuir sua importância) para a de combate direto contra o bloco. Faz isso apresentando Rússia e China como países que tentam impor suas “agendas”, que seriam contrárias às do Brasil, ao mesmo tempo em que manipulam, a seu bel-prazer, os interesses do governo brasileiro.

Folha, Estadão, Rede Globo, CNN Brasil e Jovem Pan — acompanhados de todo o cartel dos veículos de comunicação em nosso país — pressionam para que Lula adote posturas subservientes aos interesses dos EUA. Quando logram bons resultados, elogiam as “vitórias” da diplomacia brasileira, que, na verdade, são derrotas para o Brasil. Essas vitórias são, de fato, dos Estados Unidos.

A profunda e antiga campanha de desinformação e propaganda do PIG contra Venezuela e Nicarágua, bem como contra a Rússia, mostra-se, assim, de importância fundamental para os EUA ganharem terreno dentro do governo. Fortalece a quinta-coluna que opera sub-repticiamente (às vezes de forma mais aberta) dentro das engrenagens do Itamaraty, dos ministérios da Defesa e da Fazenda, e em outros órgãos-chave. Os próprios titulares dessas três pastas já deram mostras de que não merecem confiança.

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Diz-se, até mesmo, que a expansão dos Brics é um plano de Rússia e China voltado contra o Ocidente e exclusivamente para atender às pretensões expansionistas desses dois países. Washington, obviamente, é absolutamente contra a expansão dos Brics, pois isso significa fortalecer o bloco. Mas os EUA precisam apresentar esse interesse em sabotar o bloco como não sendo deles, ou não somente deles, mas dos países livres e democráticos. E, inclusive, de membros dos próprios Brics. Assim, os agentes dos EUA no Brasil dizem que não é de interesse do Brasil a expansão do bloco.

O presidente Lula, por sua vez, tem tentado aplicar uma política soberana extremamente moderada. Ele sabe perfeitamente dessas pressões, e, por isso, tem adotado grande cautela quando precisa se opor a elas. Acha que poderá ser bem-sucedido se fizer concessões, mas pensa que os Estados Unidos e seus agentes se satisfazem com algumas concessões. No entanto, eles não querem somente a aliança; querem os dedos e, depois, as mãos e os braços.

Lula tenta se equilibrar em uma corda bamba. É um conciliador experiente. Contudo, a margem para manobras vai se estreitando à medida que a polarização Norte-Sul se intensifica. Ou seja, à medida que crescem as contradições entre as potências imperialistas, que buscam manter e aprofundar a exploração do resto do mundo, e as nações que tentam combater e acabar com essa exploração. Estas últimas se esforçam no sentido de se aliar para resistirem de forma unida a tamanha opressão. Os Brics estão se tornando a materialização dessa aliança; por isso, é essencial às potências imperialistas sua contenção e enfraquecimento.

O presidente já deu declarações muito felizes e contundentes contra as pressões imperialistas. O problema é que suas ações não têm acompanhado o discurso. Ele não toma medidas efetivas contra essas pressões. Precisa começar por combater os agentes dos Estados Unidos no Brasil, particularmente o PIG e a quinta-coluna dentro dos principais ministérios.

Esse democratismo expresso na abordagem das relações internacionais repete o famigerado republicanismo do PT quando da ofensiva golpista da década passada. Como naquela ocasião, a frouxidão é um convite para o inimigo elevar a pressão, tanto que ela aumentou de um ano para cá. Se, na política exterior, Lula tinha mais liberdade do que na política interna, livre das amarras do Congresso, o imperialismo americano aumentou a campanha através da imprensa e da sua quinta-coluna no Itamaraty, infestado de neoliberais e bolsonaristas.

Sem rompimento com as crenças ingênuas e ilusórias nos acordos (ora espúrios) com esses setores antinacionais, será difícil adotar qualquer medida prática para tirar o discurso do papel. Esse discurso será apenas demagogia e declaração de boas intenções, enquanto, na prática, aperta as correntes que prendem o Brasil.

A presidência brasileira dos Brics em 2025 será fortemente sabotada pelos agentes dos EUA no Brasil. O PIG e a quinta-coluna já começaram o trabalho. Washington vai investir muito dinheiro em seus agentes e redobrar a pressão sobre o Brasil, porque vê nas vacilações de Lula e do governo uma fragilidade a ser explorada para enfraquecer os Brics.

Lula tem que parar de pisar em ovos e começar a esmagá-los com força, pois dentro deles há filhotes de serpentes esperando o momento certo para sair e engoli-lo.

Eduardo Vasco é jornalista especializado em política internacional, foi correspondente na guerra da Ucrânia e escreveu os livros-reportagem O povo esquecido: uma história de genocídio e resistência no Donbass e Bloqueio: a guerra silenciosa contra Cuba.

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