Caso das herdeiras de Silvio Santos: lições aprendidas e perguntas em aberto

Disputa das herdeiras de Silvio Santos: desafios da gestão patrimonial, planejamento tributário e segurança jurídica em bens no exterior. Por Rodrigo Martins.

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Rodrigo Martins

A recente disputa judicial envolvendo as herdeiras de Silvio Santos e o pagamento de R$ 17 milhões de ITCMD (“Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação”) à Fazenda do Estado de São Paulo traz à tona a relevância da gestão patrimonial planejada e da observância rigorosa das regras tributárias.

O caso, que gira em torno da cobrança de imposto sobre uma herança de R$ 429,9 milhões, majoritariamente composta por ativos mantidos no exterior, é emblemático. Ele expõe não apenas lacunas na legislação brasileira, mas também as consequências de interpretações conflitantes entre estados e a União.

Quero esclarecer que não estou questionando nem as ações do Estado de São Paulo, nem as estratégias de gestão patrimonial da família Abravanel. No entanto, essa discussão nos oferece uma oportunidade valiosa para refletirmos sobre os desafios e as complexidades envolvidas no alinhamento entre o patrimônio empresarial e familiar, investimentos pessoais, sucessão e outras questões correlacionadas.

Um planejamento patrimonial robusto não se limita a organizar bens ou reduzir cargas tributárias. Ele deve antecipar potenciais disputas legais, promovendo a regularização de ativos e protegendo herdeiros contra imprevistos que possam resultar em longos e desgastantes processos judiciais. Mais do que um tema jurídico ou tributário, trata-se de uma ferramenta estratégica para assegurar a segurança jurídica e a paz de espírito de todas as partes envolvidas.

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No centro da controvérsia do caso das herdeiras está o fato de que os ativos em questão estão localizados fora do Brasil, especialmente em contas no Daparris Corp Ltd, nas Bahamas. A família defende que a legislação tributária brasileira não deveria incidir sobre bens situados em jurisdições estrangeiras. Esse argumento é respaldado por decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), que declararam inconstitucionais as leis estaduais que exigem ITCMD sobre bens no exterior sem a existência de uma lei complementar nacional, conforme estabelece o artigo 155, §1º, inciso III, da Constituição Federal.

Apesar disso, os estados – São Paulo incluído – continuam tentando cobrar o imposto, mesmo após o julgamento do Tema 825 pelo STF, em 2020. Essa insistência prolonga disputas, gera custos elevados e aprofunda a insegurança jurídica, reforçando a necessidade de uma abordagem proativa na gestão de bens.

Para gestores patrimoniais e famílias com ativos significativos, o caso Silvio Santos traz lições práticas e aplicáveis. Estratégias como testamentos bem estruturados, antecipação de doações em vida, a criação de fundos patrimoniais internacionais ou o uso de veículos societários podem oferecer maior previsibilidade tributária e proteção legal. A transparência nos acordos familiares também é indispensável para evitar conflitos internos e minimizar a exposição a interpretações divergentes da legislação.

Além disso, o caso ressalta a importância de um planejamento patrimonial que considere as regras locais das jurisdições onde os bens estão localizados, bem como o impacto das normas brasileiras. Para famílias com bens no exterior, ignorar essas camadas de regulamentação pode resultar em surpresas desagradáveis e implicações financeiras significativas.

A gestão patrimonial vai além de preservar o presente: trata-se de garantir um futuro seguro, previsível e em conformidade. Ao trabalhar com transparência, planejamento estratégico e envolvimento de todos os interessados, conseguimos evitar cenários de instabilidade e disputas desnecessárias, preservando tanto o patrimônio quanto os relacionamentos familiares.

Por isso, sempre recomendo que discussões sobre planejamento patrimonial sejam tratadas com prioridade e com a participação ativa de todas as partes envolvidas. Assim, além de proteger os bens, asseguramos um legado harmonioso para as próximas gerações – algo que nenhuma disputa judicial ou questão tributária deve comprometer.

Rodrigo Alonso Martins – Advogado, Economista e CEO da Ripol Alliance

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