China e EUA: a volta de Lutero

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Deus rejeitou a nós, alemães, a ponto de termos que entregar nosso ouro e prata a países estrangeiros, enriquecendo o mundo todo e permanecendo mendigos nós próprios. A Inglaterra certamente teria menos ouro, se a Alemanha lhe deixasse seu tecido, e o rei de Portugal também teria menos, caso o deixássemos ficar com suas especiarias. Calcule quanto dinheiro é levado para fora da Alemanha durante uma feira de Frankfurt, sem qualquer necessidade. É de se admirar que ainda reste um centavo na Alemanha. Frankfurt é o ralo da prata e do ouro, pelo qual se escoa da Alemanha tudo que entre nós brota e cresce, se cunha e forja.” A colocação do líder protestante, Martinho Lutero, na época pré-capitalista, ilustra perfeitamente o retrocesso comercial vivido hoje no mundo diante do cabo de guerra entre China e EUA.

A disputa comercial entre os dois países começou no ano passado, quando Trump, impôs tarifas a uma série de produtos chineses para reduzir as importações e estimular a compra de produtos nacionais e a criação de empregos. Em retaliação, a China também taxou produtos norte-americanos. A trégua, decretada ao final de 2018, foi interrompida em maio deste ano, e, para desespero dos mercados, tem se intensificado.

Agora, a China anunciou mais tarifas sobre cerca de US$ 75 bilhões em produtos norte-americanos, com alíquotas entre 5% e 10%, que devem ser implementadas em dois lotes – em 1º de setembro e 15 de dezembro. O anúncio veio logo após os EUA imporem tarifas de 10% a uma lista de US$ 300 bilhões em produtos fabricados na China, a serem adotadas nas mesmas datas.

Em resposta, Trump ordenou que empresas norte-americanas saiam da China. “Não precisamos da China e, francamente, ficaríamos muito melhor sem eles. As vastas quantias de dinheiro produzidas e roubadas pela China dos EUA, ano após ano, durante décadas, vão e devem parar”, escreveu Trump no Twitter, algo similar ao que Lutero falava sobre o comércio internacional. Trump ainda complementou: “Nossas grandes empresas norte-americanas estão ordenadas a começar imediatamente a procurar uma alternativa para a China, incluindo trazer suas empresas para casa e fabricar seus produtos nos EUA.”

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A briga provoca a instabilidade dos mercados financeiros, pois deve provocar a desaceleração da economia mundial, inclusive os EUA correm risco de entrar em recessão no próximo ano. Por isso o desespero de Trump em pressionar o Fed por menos juros. No entanto, ainda é muito difícil entender todos os efeitos de uma guerra comercial sobre as variáveis macroeconômicas.

Para a famigerada economia brasileira, há um aspecto positivo. O agronegócio ganha, com o aumento das exportações de soja, por exemplo – a China substituiu as compras dos EUA pelo produto do Brasil, e nos tornamos o maior exportador do produto para o país. No primeiro ano da guerra comercial, as exportações brasileiras para a China cresceram 35% na comparação com 2017, gerando uma balança comercial positiva para o Brasil em US$ 30 bilhões. No entanto, isso não tem sido visto com bons olhos e pode também haver retaliação norte-americana para o Brasil, pois uma das condições de Trump para negociar a retirada de tarifas sobre produtos chineses era que a China passasse a comprar mais produtos agrícolas norte-americanos.

Ao mesmo tempo, a economia brasileira sente a forte escalada do dólar, que chegou a R$ 4,13 nesta sexta-feira. Outro problema vem retaliação dos países europeus ao comércio com o Brasil devido às queimadas na Amazônia. Os investidores se protegem, saindo de ativos mais arriscados, onde a volatilidade permanece elevada, mesmo que os juros estejam em patamar baixo. As falas do presidente tampouco ajudam a melhorar a expectativa do país cujo número de desempregados, subempregados e desalentados só aumenta, junto com a retração da renda. Para completar, nossa vizinha Argentina não sairá da recessão tão cedo. É hora de tomar medidas para que a economia brasileira reaja. É preciso medidas que levem à recomposição da renda, e não são R$ 500 do FGTS que solucionarão o problema.

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