Ciclo de commodities, popularidade e 2022

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Manifestação contra Bolsonaro (foto de Elineudo Meira, Fotos Públicas)
Manifestação contra Bolsonaro (foto de Elineudo Meira, Fotos Públicas)

Nas últimas eleições presidenciais, ao sul do equador, o bom desempenho em eleições e em índices de aprovação popular dos governantes de países latino-americanos decorreram de dois fatores externos que fugiam ao controle dos presidentes de plantão: a taxa de juros dos Estados Unidos e o preço das commodities (produtos primários, como alimentos, petróleo e minério). Atualmente, a política monetária ultraexpansionista do Fed e a recuperação dos termos de troca do Balanço de Pagamentos geram saldos comerciais crescentes no Brasil, por exemplo. Será que isso terá a mesma influência em 2022?

A lógica é a de que o eleitor vota de acordo com a situação da economia. E em países dependentes da exportação de produtos não industrializados e de investimentos estrangeiros, o cenário econômico varia conforme os preços das commodities e das taxas de juros dos EUA. O eleitor premia com reeleição os presidentes que têm a “sorte” de governar em períodos de “bonança econômica” promovida pela queda na taxa de juros norte-americanos e pelo boom das commodities, e pune os governantes que cumprem o mandato em período com indicadores externos menos favoráveis.

Fatores ligados à qualidade da gestão dos presidentes, como políticas sociais e ausência ou presença de escândalos de corrupção, até podem influenciar popularidade e resultado eleitoral, mas o impacto deles é bem menor que o dos fatores econômicos externos.

 

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Qual o impacto da pandemia na mudança disso tudo?

Com o aprofundamento da crise sanitária, os problemas da pobreza, da segurança social, da saúde, da educação, da habitação, do meio ambiente etc. se tornam muito mais graves. A fome voltou a crescer entre os brasileiros, e o consumo de carne e de frutas no país tem caído e afetado uma grande parte da população.

No final de 2020, foi realizada uma pesquisa pela Freie Universität Berlin em parceria com pesquisadores da UFMG e da UnB, que revelou que, durante a pandemia, mais precisamente entre os meses de agosto a dezembro, mais da metade dos lares brasileiros conviveram de alguma forma com a insegurança alimentar, isto é, não fizeram suas refeições em quantidade e qualidade adequadas. O consumo de alimentos tem sido puxado para baixo pelo altíssimo índice do desemprego no Brasil de hoje e a redução do auxílio emergencial, seguida da suspensão nos primeiros meses deste ano, decerto agravou essa situação.

Os brasileiros têm todos os motivos do mundo para se revoltarem coletivamente contra o atual estado de coisas. Porém, marchar apenas contra a elite plutocrática que dirige politicamente nosso país é pouco, não é o suficiente; marchar apenas contra a piora das condições de alimentação, saúde, trabalho etc. durante um governo ou outro, não é o suficiente. Para as manifestações contra Bolsonaro, podemos alertar sobre a necessidade de colocar a revolução social no horizonte e pensar objetivos distintos para a luta política que ultrapassem a dupla impeachment e eleições. Como sair dessa armadilha?

No limite, o que as manifestações também colocam em xeque é apenas o peculiar agravamento das condições da saúde e da alimentação dos brasileiros durante a crise econômica e a crise sanitária, gerenciada sob o governo Bolsonaro/Guedes/Centrão.

 

Ranulfo Vidigal é economista.

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