Como funciona o Colégio Eleitoral dos Estados Unidos?

Em toda a história dos Estados Unidos, em quatro oportunidades o Colégio Eleitoral elegeu um presidente que havia perdido no voto popular.

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Considerando a eleição presidencial dos Estados Unidos realizada em 2024, organizamos algumas informações que esclarecem o funcionamento do famoso Colégio Eleitoral dos Estados Unidos.

Como é formado o Colégio Eleitoral dos Estados Unidos?

O Colégio Eleitoral é formado pelos 50 estados americanos mais o Distrito de Columbia, onde fica Washington, a capital. Em 48 dos estados americanos mais o Distrito de Columbia, o vencedor da votação, independente da diferença de votos, leva todos os votos do estado, o que os americanos chamam de “winner-take-all”. As duas únicas exceções são os estados de Nebraska, que possui 5 votos, e Maine, que possui 4 votos.

Esses dois estados distribuem seus votos da seguinte forma: 1) o vencedor da eleição presidencial no estado leva dois votos e 2) o vencedor em cada distrito leva um voto, sendo que o Nebraska possui 3 distritos, e Maine, 2.

Quando surgiu o Colégio Eleitoral?

O Colégio eleitoral dos Estados Unidos surgiu com a promulgação da sua Constituição, em 17 de setembro de 1787. Cabe mencionar que os Estados Unidos haviam obtido a sua independência no dia 4 de julho de 1776, pouco mais de 10 anos antes. Até de se tornar uma federação e constituir um poder central através da União, as 13 colônias que lutaram a guerra de independência e formaram os Estados Unidos, tentaram se organizar em uma confederação, o que não deu certo.

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Pintura retratando a assinatura da Constituição do Estados Unidos. Howard Chandler Christy, 1940. Foto: Wikipedia.

Por que os Estados Unidos adotaram o Colégio Eleitoral?

Um dos temas que foi bastante discutido durante a elaboração da Constituição americana foi a forma como o presidente seria eleito. Entre as três opções discutidas, estava a eleição pelo voto popular, a eleição pelo voto dos governadores e a eleição pelo Congresso. Na época, todas essas opções foram analisadas e seus prós e contras avaliados. Como nenhuma delas prosperou, a assembleia constituinte dos Estados Unidos decidiu por uma opção intermediária, onde cada estado votaria para presidente considerando a votação da sua população. Foi assim que nasceu o Colégio Eleitoral dos Estados Unidos.

Aqui, nós temos um ponto importante. Não adianta olhar para o passado com os olhos de hoje, principalmente criando narrativas para criticar as decisões tomadas no passado ou justificá-las. É preciso ter humildade para tentar entender essas decisões. Os Estados Unidos foram o primeiro país a adotar o sistema presidencialista. Isso em 1787. O Brasil somente viria a adotar esse sistema em 1889, pouco mais de 100 anos depois. É um erro achar que o voto popular seria uma decisão natural naquela época.

Outro ponto importante é a forma como os dois países foram formados. Nos Estados Unidos, as 13 colônias, que lutaram pelas suas independências, e que deram origem aos 13 primeiros estados, tiveram que abrir mão de parte dos seus poderes para criar a União e a Federação, ou seja, a criação da federação americana se deu de baixo para cima. No Brasil, a União, originada a partir do Império, teve que abrir mão do seu poder para criar a Federação e os estados, ou seja, a criação da federação brasileira se deu de cima para baixo. É por isso que um estado americano possui muito mais atribuições que um estado brasileiro, entre elas a escolha do presidente através do Colégio Eleitoral e a organização da eleição na sua jurisdição.

As treze colônias que se uniram, obtiveram a independência da Inglaterra e deram início aos Estados Unidos. Foto: Wikipedia.

Como é formado o Colégio Eleitoral?

O Colégio Eleitoral possui 538 delegados estaduais. Esse número é espelhado na quantidade de congressistas americanos distribuídos no Senado, que possui 100 senadores, e na Câmara dos Deputados (House of Representatives), que possui 435 deputados. Cabe mencionar que cada estado americano possui dois senadores. Isso é fixo. Com relação a quantidade de deputados, a distribuição por estado é feita em conformidade com o tamanho das suas populações.

Um ponto importante é que periodicamente a quantidade de deputados, consequentemente de delegados estaduais que participam do Colégio Eleitoral, é revista em conformidade com o censo norte-americano. Por exemplo, o Colégio Eleitoral da eleição presidencial de 2024 e de 2028 tem como referência o censo de 2020. Assim, se a população de um estado aumentar, a sua representação na Câmara dos Deputados e, consequentemente, no Colégio Eleitoral pode aumentar.

Da mesma forma, se a sua população diminuir, a sua representação na Câmara e no Colégio também pode diminuir. Contudo, essa distribuição entre os estados é feita de forma a que o total seja 435 deputados e 435 delegados, ou seja, para que um estado ganhe um deputado/delegado, um estado tem que perder um deputado/delegado. Lembre-se que a quantidade de senadores é fixa.

Assim, cada estado possui um delegado para cada senador e um delegado para cada deputado. Por exemplo, a Califórnia, o estado mais populoso dos Estados Unidos, possui a maior quantidade de delegados, 54. Isso porque o estado tem 2 senadores e 52 deputados. Da mesma forma, como o Alaska, um dos estados menos populosos, possui 2 senadores e um deputado, ele tem três delegados no Colégio Eleitoral.

A diferença de 538 delegados para 535 congressistas se deve ao fato de que o Distrito de Columbia, onde está Washington, recebeu, através da Emenda Constitucional nº 23, três delegados no Colégio Eleitoral, apesar de não ter senadores e deputados no Congresso Americano.

O Colégio Eleitoral sempre teve a mesma quantidade de delegados?

Não, não teve. Na primeira eleição para presidente dos Estados Unidos, em 1788, George Washington foi eleito com 69 votos do Colégio Eleitoral (100%). Na eleição seguinte, ele foi reeleito com 132 votos (novamente, 100%). Com o passar do tempo e o crescimento dos Estados Unidos (expansão para o Oeste e transformação de territórios em estados), o tamanho do Colégio Eleitoral também foi crescendo. Por exemplo, em 1812, ele tinha 217 delegados; em 1860, 303; em 1844, 401, e em 1912, 531.

O Colégio Eleitoral atingiu o atual tamanho na eleição de 1964, quando Lyndon Johnson obteve 486 votos no primeiro Colégio Eleitoral composto por 538 delegados, número mantido desde então.

Quantas vezes o Colégio Eleitoral decidiu uma eleição americana em divergência com o voto popular?

Em quatro oportunidades: 1876, 1888, 2000 e 2016. O Colégio Eleitoral sempre existiu, mesmo que ele não tenha ficado evidente por muito tempo, já que os candidatos venciam no voto popular e no Colégio Eleitoral. Ele ressurgiu com força no radar em 2000, quando Al Gore venceu no voto popular, mas perdeu a eleição no Colégio Eleitoral para George W. Bush. Essa eleição foi marcada por uma interminável recontagem de votos na Florida a pedido dos democratas, que poderia reverter o resultado a favor de Al Gore.

Rutherford B. Hayes, vencedor da eleição de 1876; Benjamin Harrison, vencedor da eleição de 1888; George W. Bush, vencedor da eleição de 2000, e Donald Trump, vencedor da eleição de 2016. Todos eles venceram no Colégio Eleitora sem terem vencido no voto popular. Curiosamente, todos eles eram republicanos.

Depois disso, o Colégio Eleitoral voltou a ficar fora do radar em 2004, 2008 e 2012, para ressurgir com força em 2016, quando Donald Trump perdeu no voto popular, mas ganhou no Colégio Eleitoral uma eleição onde Hillary Clinton era dada como vencedora.

Ao contrário de todas as expectativas, de que se Trump vencesse a eleição de 2024, ele ganharia no Colégio Eleitoral, mas perderia no voto popular, Trump venceu Kamala Harris de forma inconstestável nos dois pleitos, tanto no voto popular, 73,4 milhões de votos contra 69 milhões, quanto no Colégio eleitoral, 295 votos contra 226.

Como os delegados são definidos?

Essa é uma atribuição de cada um dos cinquenta estados americanos e do Distrito de Columbia.

O Colégio Eleitoral se reúne?

Não, ele não se reúne. Uma vez que os delegados votam nos seus estados, o estado conta seus votos e emite um documento chamado Certificado de Voto. Emitido o documento, ele é enviado para o Congresso Americano, que fica em Washington, para ser contado, junto com os certificados dos demais estados, em uma sessão conjunta do Senado com a Câmara. Isso acaba sendo uma mera formalidade, pois a partir do momento em que a contagem dos votos dos eleitores de cada estado é fechada, já se sabe como seus delegados vão votar no Colégio Eleitoral.

Por exemplo, com relação à eleição presidencial de 2024, os delegados do Colégio Eleitoral vão votar no dia 17 de dezembro. No dia 6 de janeiro de 2025, seus votos serão contados em uma sessão conjunta da Câmara e do Senado no Congresso americano. No dia 20 de janeiro, Donald Trump tomará posse para o seu segundo mandato como presidente.

Um delegado pode votar em divergência com o que foi definido pelos eleitores do seu estado?

Em tese, é possível. A Constituição dos Estados Unidos não toca nesse assunto. Cabe verificar como cada estado aborda essa questão. O ponto é que os Estados Unidos são um país extremamente tradicional. Sendo assim, não é preciso que tudo esteja escrito, ao contrário de outros países. Se um estado tem como tradição respeitar o voto popular, o voto popular será respeitado, e os delegados desse estado vão votar pelo candidato escolhido pela maioria da sua população.

É possível acabar com o Colégio Eleitoral?

Sim, é possível, mas é muito pouco provável que isso aconteça. Isso por causa de algumas razões: 

  • o Colégio Eleitoral é uma instituição muito antiga dos Estados Unidos, que está na sua Constituição desde a sua promulgação em 1787. Como disse, os Estados Unidos são um país extremamente apegado às tradições e dificilmente o Congresso mexeria no Colégio Eleitoral, tanto que já tentaram, mas não conseguiram;
  • alterar a Constituição dos Estados Unidos é muito difícil. Não apenas pelo processo legislativo, mas pela tradição em não mexê-la. Por exemplo, a Constituição americana, uma espécie de “Dez Mandamentos” dos Estados Unidos, possui apenas 7 artigos e foi emendada apenas 27 vezes desde 1787, sendo que a última emenda foi feita em 1992. Em termos de comparação, a atual Constituição brasileira, que quer abraçar o mundo e tratar de tudo, foi promulgada em 1988, possui 250 artigos e já foi emendada 134 vezes;
A Constituição original dos Estados Unidos. Foto: Wikipedia.

Artigo atualizado no dia 8 de novembro de 2024.

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