Como o Receita Saúde impacta o seu Imposto de Renda e os serviços de saúde

Como o programa Receita Saúde impactará profissionais da saúde e pacientes, aumentando a fiscalização e a arrecadação do Imposto de Renda. Por Sysley Sampaio.

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Médico segurando celular
Médico segurando celular (foto AdobeStock)

Em tempos de crise econômica e com a promessa de uma reforma tributária no horizonte, o governo federal lança o programa Receita Saúde, obrigando médicos, dentistas, fisioterapeutas e outros profissionais da saúde a emitirem recibos eletrônicos por meio de um aplicativo da Receita Federal. A justificativa oficial é a modernização do sistema e o combate à sonegação, mas o que está em jogo é o aumento da arrecadação de impostos antes mesmo da reforma tributária sobre a renda entrar em vigor, prevista para 2026.

Imagine a seguinte situação: você consulta um médico particular e, ao final do atendimento, em vez do tradicional recibo em papel, recebe um recibo eletrônico emitido na hora pelo celular do próprio médico, por meio de um aplicativo da Receita Federal. Essa é a nova realidade imposta pelo programa Receita Saúde, que entra em vigor em janeiro de 2025.

A partir dessa data, profissionais da saúde, como médicos, dentistas, fisioterapeutas, psicólogos, fonoaudiólogos e terapeutas ocupacionais que atuam como autônomos, serão obrigados a emitir recibos eletrônicos por meio do aplicativo. O programa, que o governo apresenta como uma ferramenta de modernização, funciona como um mecanismo de fiscalização que registra automaticamente as receitas dos profissionais no sistema da Receita Federal.

Na prática, o Receita Saúde diminui consideravelmente a possibilidade de omissão de rendimentos por parte dos profissionais da saúde, que, hoje, muitas vezes utilizam recibos manuais e declaram apenas parte do que recebem. Com a digitalização do processo, essa prática se torna muito mais difícil, impactando diretamente a arrecadação do Imposto de Renda.

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A pressa do governo em implementar o Receita Saúde se explica pelo contexto econômico e fiscal do país. Com a reforma tributária sobre o consumo já aprovada e a reforma sobre a renda ainda em fase de elaboração, o governo busca alternativas para aumentar a arrecadação no curto prazo.

O Receita Saúde se encaixa nessa estratégia, atuando como uma espécie de “reforma fatiada”, na qual medidas pontuais são implementadas antes mesmo da aprovação da reforma como um todo. Isso levanta questões importantes sobre a transparência do processo e a participação da sociedade na discussão das mudanças tributárias.

Para os profissionais da saúde, o Receita Saúde significa mais burocracia e, possivelmente, aumento da carga tributária. A obrigatoriedade de declarar todos os rendimentos pode levar muitos profissionais a reavaliar seus regimes de tributação, migrando para opções como o Lucro Presumido.

No entanto, o impacto não se restringe aos profissionais. Os pacientes também podem ser afetados, já que o aumento da carga tributária pode resultar em reajustes nos preços dos serviços.

Especialistas do setor estimam que a informalidade na área da saúde chega a 40%, o que representa uma perda significativa de arrecadação para o governo. Com o Receita Saúde, essa fatia da economia tende a ser formalizada, gerando um aumento na arrecadação de impostos. No entanto, ainda é cedo para dizer qual será o impacto real da medida e se ela será suficiente para alcançar os objetivos do governo.

O Receita Saúde é apenas uma peça do complexo quebra-cabeça da reforma tributária. A discussão sobre a tributação da renda ainda está em aberto e precisa ser amplamente debatida pela sociedade. É preciso questionar se a implementação de medidas pontuais como essa, sem um debate aprofundado no Legislativo, é a melhor forma de construir um sistema tributário mais justo e eficiente.

Enquanto a reforma tributária não se concretiza, o Receita Saúde já é uma realidade. Profissionais da saúde e pacientes precisam se preparar para as mudanças e se informar sobre seus direitos e deveres.

Sysley Sampaio é advogado tributarista. Pós-graduado em Direito Público, mestre em Direito Tributário, MBA em Recuperação de Créditos Tributários, membro da Comissão Especial de Direito Tributário do Conselho Federal da OAB e do grupo de estudos da Jurisdição Constitucional Tributária do IDP.

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