O Copom (Comitê de Política Monetária), do Banco Central, decidiu manter a taxa de juros em 13,75% na sua última reunião. A expectativa é que os juros comecem a cair no próximo encontro, em agosto, mas em ritmo lento, até chegar em 12% no fechamento deste ano, conforme projeção do último boletim Focus.
Para especialistas, os juros elevados restringem a economia, elevando a atratividade de investimentos e desincentivando a tomada de crédito.
“Os empresários ficam menos incentivados a contrair recursos externos para novos investimentos, o que por consequência pode travar a contratação de novos empregados. Ou até travando o nível de operação atual, provocando demissões. Aos olhos das pessoas físicas, fica menos interessante comprar itens a prazo, pois as parcelas serão maiores, financiamentos imobiliários ou de automóveis pesarão muito mais em orçamentos”, destaca Gustavo Cruz, estrategista-chefe da RB Investimentos.
“Se as pessoas consomem menos, teremos menos recursos em circulação. Menos vendas, menos investimentos, menos empregos, atividades menores”, complementa.
Taxa de juros na economia: consumo desestimulado
Fabrício Gonçalvez, CEO da Box Asset, concorda que os juros elevados podem ter vários impactos na economia. “Em primeiro lugar, eles podem desestimular o consumo e o investimento, uma vez que o custo de tomar empréstimos fica mais alto. Isso pode levar a uma redução no crescimento econômico, pois as empresas investem menos e as famílias consomem menos.”
“Além disso, os juros altos podem aumentar a carga financeira das empresas, tornando o pagamento de dívidas mais difícil, o que pode levar a um aumento na inadimplência e a problemas no setor financeiro”, elenca Gonçalvez.
Por outro lado, a intenção é, justamente, encarecer o crédito para desaquecer a economia. “Com o crédito mais caro, as pessoas tendem a consumir menos, e as empresas a fazerem menos investimentos e contratações. O resultado disso é um cenário de maior cautela para os agentes, que tendem a fazer movimentos mais conservadores, podendo gerar um saldo negativo em contratações e com isso, uma consequente desaceleração na economia”, comenta Calil Filippelli, gestor de fundos da Ouro Preto.
Para o mercado financeiro, o investidor tende a tomar menos risco, migrando parte da sua carteira de renda variável para a renda fixa, com o intuito de maximizar a relação de risco/retorno com maiores rendimentos e menos volatilidade. “As empresas listadas em Bolsa por sua vez, tendem a pagar mais juros das suas dívidas, diminuindo seu resultado”, complementa Filippelli.
Juros altos funcionam contra inflação de demanda?
De acordo com Gonçalvez, a decisão de manter os juros elevados por um longo período de tempo para combater a inflação é uma escolha complexa. Juros altos podem ajudar a controlar a inflação, especialmente se ela for causada por demanda excessiva na economia.
“No entanto, é importante considerar outros fatores, como o impacto negativo nos investimentos e no consumo. Além disso, existem outros instrumentos de política econômica, como políticas fiscais e regulatórias, que também podem ser usados para controlar a inflação. Portanto, a manutenção de juros elevados por tanto tempo requer uma análise cuidadosa dos custos e benefícios”, diz Gonçalvez.
Cruz considera acertado manter os juros elevados para fazer a inflação convergir. Lembra que o Brasil conviveu com períodos longos de inflação elevada, novas gerações não viveram nesses momentos.
“Estudos da FGV e do Ipea ainda mostram que a inflação atinge mais as pessoas mais pobres. Os itens mais consumidos por essa faixa de renda são os que mais oscilam em momentos de descontrole. A qualidade de vida das pessoas é maior com uma inflação menor. A confiança dos consumidores é maior, dado que a desconfiança que os preços irão diminuir”, diz Cruz.
Cruz comenta ainda que a economia dos países não gira em torno da Selic atual, boa parte está conectada com a “curva de juros”, ou seja, quanto os bancos estimam que será a taxa de juros no futuro.
“Quando o Banco Central consegue controlar a inflação, esses vencimentos recuam. O banco se sente mais confiante em emprestar para uma empresa, ou financiar um imóvel com taxas menores que a Selic atual. Caso os bancos entendam que o Banco Central está reduzindo os juros antes de controlar a inflação, esses empréstimos seriam mais caros. Com a desconfiança que seria necessário subir mais os juros no futuro, para compensar o movimento”, explica Cruz.
Mais recuperação judicial
A consequência dos períodos longos de juros altos é uma economia rodando em níveis menores. E o resultado tem sido o aumento nos pedidos de recuperação judicial, que cresceram 105,2% em maio deste ano, comparado ao mesmo mês do ano passado, conforme dados do Indicador de Recuperação Judicial e Falências da Serasa Experian.
“Empresas com boa gestão financeira conseguem atravessar esses períodos com impactos menores. As recuperações judiciais costumam ser de companhias que já estavam pressionadas anteriormente”, analisa estrategista-chefe da RB Investimentos.
“Um efeito mais negativo é em startups, que necessitam de aportes recorrentes, mas terão esse dinheiro mais caro no mercado, o que pode desacelerar essas empresas. Os investidores delas são mais seletivos em momentos assim”, comenta Cruz.
Ele lembra ainda que o custo de se rolar a dívida pública fica mais cara, ainda mais com um desequilíbrio fiscal que possuímos.
“Caso estivéssemos com uma relação saudável, superavits primários, o impacto seria menor. Por outro lado, juros mais altos atraem recursos de investidores estrangeiros. Estes captam recursos em seus países e buscam os juros mais altos brasileiros. Trazendo alternativas de financiamento para empresas brasileiras”, diz Cruz.
Para a população, comenta o estrategista-chefe, os juros mais altos elevam a inadimplência. O que provoca uma oferta menor de crédito do lado de bancos, financeiras, entre outros. As famílias brasileiras, historicamente, vivem com situações financeiras apertadas, o que as torna vulneráveis a momentos de juros maiores.