“Corporação: um dispositivo engenhoso para obter lucro individual sem responsabi

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Ambrose Bierce (1842-1914, jornalista)

O investimento socialmente responsável é uma realidade ou limita-se ao discurso dos que acreditam na sua importância? Este foi um dos temas do seminário “Mercado de capitais e o balanço social” realizado semana passada em São Paulo pela Abamec (Associação Brasileira dos Analistas de Mercado de Capitais – SP).

O patrimônio dos investidores institucionais socialmente responsáveis, representado por ações de empresas em que eles investem, totaliza algo superior a US$ 5,5 trilhões, quando representava “apenas” US$ 730 bilhões em 1996. A cifra alcançada este ano representa mais de sete vezes o PIB do Brasil, medida do valor agregado em um ano da economia de um dos dez maiores países do mundo.

Um dos participantes do seminário, Pedro Bastos, diretor de Pesquisa e Desenvolvimento do Unibanco, apontou a evolução dos critérios de seleção das empresas socialmente responsáveis pelos investidores. No início, a escolha era feita por exclusão das empresas identificadas com a produção de bens nocivos às pessoas. Caso das empresas produtoras de fumo, bebidas alcoólicas ou armamentos.

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Depois, a seleção passou a privilegiar as empresas pela presença em seu processo produtivo de componentes inovadores ou ambientalmente corretos. Caso das empresas que utilizam fontes limpas de energia – fotovoltaica, eólica ou biomassa -, que utilizam a reciclagem etc. Neste caminho, os investimentos acabaram fluindo em grande parte para as empresas intensivas em tecnologia. Com a posterior queda da Nasdaq, uma nova tendência surgiu nos investimentos socialmente corretos.

Os investidores institucionais orientam-se hoje principalmente pelo conceito de best-in-class, isto é, privilegiar as empresas que consideram os investimentos sociais e ambientais como integrantes do processo de gestão e que instituem sistemas de garantia de prevenção e controle do seu passivo ambiental ou comunitário.

O questionamento sobre a natureza dos bens produzidos pelas organizações na hora de classificá-las como empresas-cidadãs gera um outro tipo de desafio que esteve presente nos debates do seminário. Trata-se de considerar como responsáveis socialmente ou não as empresas que produzem bens notoriamente nocivos à sociedade – caso de cigarros, armas de fogo etc. Outra face deste questionamento é considerar essencialmente cidadã a empresa que produz bens inequivocamente úteis – como antibióticos, produtos alimentícios etc. – independentemente de examinar os processos que levam até os produtos gerados.

A diretora executiva do Instituto Souza Cruz, Letícia Sampaio, questionada sobre a possibilidade de uma empresa produtora de fumo ser considerada cidadã, argumentou com a exibição de investimentos comunitários realizados pela Souza Cruz e com as estatísticas de danos que empresas de outras áreas podem produzir, em princípio isentas da marca de nocivas pelos bens que produzem – como as do ramo automobilístico.

A controvérsia, no entanto, persiste. É a mesma que envolve a luta pela quebra de patentes de medicamentos que integram o coquetel anti-Aids. A patente e o laboratório são partes construtivas do sistema produtivo, em princípio, mas o papel desempenhado por estas instituições econômicas no caso do tratamento da epidemia da Aids contraria qualquer possibilidade de aceitação ética.

QUALIDADE DE EMPRESA-CIDADÃ
O cidadão é o centro das atenções de empresas quando estipulam para si uma estratégia de responsabilidade social. O cidadão-consumidor, quando escolhe o bem e conseqüentemente a empresa que o produz. O cidadão-investidor, quando decide pelas ações que adquire ou participa das decisões do seu fundo de investimento ou de seu fundo de pensão. Ou ainda o cidadão-trabalhador, quando pode escolher a empresa em que trabalhará ou com que se identificará no exercício da sua criatividade profissional.
Encontrar este diferencial competitivo é desafio encarado pelo Banco do Brasil, através da Fundação Banco do Brasil, diante da padronização que a automatização impõe aos produtos bancários, segundo Heloísa Oliveira, executiva da FBB, presente no seminário. Entre outras iniciativas, a fundação empreende o programa Escola Campeã, em cooperação com o Instituto Ayrton Senna. O objetivo principal do programa é a racionalização dos recursos públicos destinados à educação. O programa atua em 52 municípios que totalizam 1,2 milhão de matrículas escolares.

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