‘Crise cambial mata’ (Mario Henrique Simonsen)

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O saudoso professor Mario Henrique Simonsen (Rio de Janeiro, 1935 – Rio de Janeiro, 2007), engenheiro e economista, também ministro do Planejamento (Governo Geisel) e da Fazenda (Governo Figueiredo), foi ainda um a emérito autor de frases bem-humoradas. Uma delas, querendo explicar o estabelecimento de prioridades nas políticas econômicas, didaticamente, dizia: “Inflação dói. Crise cambial mata”.

Considerando a ilimitada capacidade do Governo Federal de mexer com quem não deve, ou com o que não deve e quando não deve, a nossa economia parece caminhar célere para o corredor da morte. Em uma conjuntura de retração mundial da atividade econômica, com o anúncio de aterrissagem forçada de grandes economias, como a da Alemanha, temperada com guerra comercial das duas maiores economias mundiais (China e EUA), com uma complicação não resolvida na UE (Brexit), com nuvens pesadas no cenário político das maiores reservas petrolíferas (Venezuela e Arábia Saudita), com as taxas dos títulos do Fed (banco central norte-americano) situadas entre 1,75% e 2%, enquanto a taxa básica de juros do Brasil situa-se em 5,5% e está neutralizada como objeto de desejo em massa de especuladores e de investidores externos, ou seja, as coisas agora não vão nada bem para esta praça.

Para piorar, em agosto passado, o Banco Central (Bacen) se deu conta de que assumiu com um legado deixado por aqueles “demônios” que estavam antes no governo: reservas internacionais de mais de US$ 380 bilhões. Se assim não fosse, o Brasil já teria sentado no colo do FMI, como a Argentina de Macri sentou. Com a desculpa do inevitável “custo de carregamento”, nome que se dá à diferença entre o que recebe pela aplicação, principalmente, em títulos do Fed, e o que paga aos tomadores dos títulos brasileiros. Para tentar estabilizar a paridade entre dólar e real em uma relação menos desconfortável, recomeçou a fazer operações de swap (não eram feitas desde 2009) cambial, em linguagem mais clara, vender dólares para baixar seu preço. Para minimizar o aspecto de irresponsabilidade de tocar nas divisas em uma conjuntura política e econômica em que a chapa está esquentando, o Bacen combina operações de swap cambial com swap reverso (mercado futuro). Assim, quando perguntarem quem mexeu no meu queijo, fica parecendo que não mexeram tanto. Ah, mas a conjuntura é sinistra. Olha só no que deu.

 

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Situação das contas externas

Divulgados os dados mais recentes do equilíbrio externo brasileiro, destacam-se: de janeiro a agosto de 2019, constata-se um déficit em transações correntes de US$ 30,2 bilhões. Comparado a igual período de 2018, é 65% maior. O déficit de transações correntes (exportações menos importações) é estrutural, repete-se sempre. A preocupação é que este déficit é financiado pelos chamados Investimentos Externos Diretos, uma espécie de “cheque especial” que o Banco Central utiliza. Com a cama de gato armada pela conjuntura internacional e pelo balanceamento entre taxas de juros do Fed e do Brasil, fica mais difícil utilizar o tal “cheque especial”.

Principais elementos do desequilíbrio das contas externas apontados são as remessas de lucros e de dividendos do Brasil para os não-residentes (exterior). É histórico, quem mexe com remessas de lucros não se mantém no posto por muito tempo. E para fazer a economia brasileira voltar a girar, tirando a bola de ferro que a retém, não há de ser quem faz as escolhas erradas de “amizades” (Pinochet, Macri, Trump), despreza o maior parceiro comercial (China) e não tem educação para conviver em sociedade (xinga a mulher dos outros, ou manda usar o dinheiro para reflorestar o próprio quintal). Acaba não sendo mais convidado para as reuniões importantes, como foi a Cúpula do Meio Ambiente da ONU, em 23 de setembro.

 

Direitos Humanos – estado da arte

Semana passada, a ONG Human Rights Watch divulgou, em seu site (hrw.org) o relatório 2019, tendo 2018 como ano-base. Dividido em 13 capítulos, cada um deles abordando um tema crítico da realidade dos direitos humanos, além de uma sessão específica sobre o Brasil, com artigos assinados por diferentes analistas.

 

Direitos Trabalhistas

De janeiro a outubro, o Ministério do Trabalho identificou 1.246 casos de trabalhadores sujeitos a condições abusivas que, de acordo com a lei brasileira, são análogas à escravidão, como trabalho forçado ou condições degradantes de trabalho. Em resposta a uma decisão judicial, o Ministério do Trabalho publicou em abril uma lista de 166 empregadores sobre os quais havia imposto penalidades desde 2010 por empregar pessoas em condições de trabalho análogas à escravidão”.

 

Comissão do Senado de Direitos Humanos opina

Sobre este tema, a Comissão do Senado de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH), com a participação de representantes e entidades de assistência social, debateu na segunda-feira (16 de setembro), sobre os riscos de aumento da miséria e da informalidade em decorrência da aprovação da reforma da Previdência. Ao abrir o debate, o presidente da CDH, Senador Paulo Paim (PT-RS), afirmou que a maioria dos senadores e deputados sequer conhece o texto da reforma, tida por ele como “a mais cruel de todos os tempos”. A proposta do Executivo (PEC 6/2019) já foi aprovada pela Câmara dos Deputados e está em análise no Senado. O primeiro turno de votação no Plenário do Senado está previsto para 24 de setembro.

Senador Paim citou preocupações pontuais, como a aposentaria por invalidez, que atualmente é paga levando-se em conta a integralidade do salário. Ele disse que, a partir da promulgação dessa reforma, quem tiver um problema grave e não puder mais trabalhar vai se aposentar com a metade do salário. Isso vai gerar miséria, criticou.

O senador lembrou as aposentadorias especiais, como o caso dos trabalhadores das minas de carvão, que a partir da reforma terão uma idade mínima vinculada ao tempo de contribuição (hoje em dia só o tempo é considerado para fins de aposentadoria). A situação de metalúrgicos, professores e vigilantes também foi destacada pelo senador. “Essa reforma prejudica gerações do passado, do presente e do futuro. Retira de quem está ganhando no trabalho formal e não resolve nada para aqueles que nem têm chance de um emprego formal.”

 

Paulo Márcio de Mello é professor aposentado da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

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