A clássica zona da Schiava mistura tradição e modernidade, com um mix de brancos e tintos de uvas nativas e internacionais.
Bolzano é o ponto de maior concentração urbana da região do Alto-Ádige, que, apesar de reduzida, já conta com boa parte de sua produção regulamentada em DOCs. Muitos vinhos usam a assinatura da DOC regional Alto-Ádige, mas são, em boa parte, acompanhados dos nomes das uvas, quando varietais e das sub-regiões. Falamos antes sobre vinícolas do Vale Isarco, mais no extremo norte e focadas em vinhos brancos. Mais ao sul, nas proximidades de Bolzano e indo em direção a Trentino, há outras áreas, onde pode haver, inclusive, uma maior concentração de vinhos tintos.
Bem no entorno da cidade de Bolzano se encontra a área mais nobre de produção da Schiava, variedade popular, identificada nos rótulos muitas vezes como “Vernatsch”, nome pelo qual ficou conhecida junto à população que usa prioritariamente a língua alemã. A Schiava foi plantada extensivamente no século XIX, no período em que o Alto-Ádige estava integrado ao Império Austro-Húngaro, o que resultou numa produção de grande volume e má fama. Sua plantação foi reduzida posteriormente, e políticas de foco em qualidade geraram bons resultados, especialmente na DOC Santa Maddalena (Saint Magdalener em alemão), onde há Schiavas diferenciados.
A vocação da uva é para a produção de vinhos tintos leves e frutados. Um dos produtores que visitei se encontra justamente nessa área, a Weingut Obermoser: propriedade familiar, em conversão para vinhos orgânicos, com menos de 5 hectares e produção de 30 mil garrafas. A Obermoser hoje é administrada pela quinta geração de produtores de uma mesma família (desde 1890). Noventa e cinco por cento dos vinhos são tintos, e a Schiava é uma especialidade. Possuem vinhedos antigos, que chegam a 100 anos de idade, plantados em pérgola (uma tradição da região) a uma altitude de 350 a 500 metros.
Foi possível degustar um perfil mais clássico, frutado, fresco e levemente especiado da Schiava: o Saint Magdalener Classico Obermoser 2022. Mas o atual proprietário criou um rótulo que o supera em qualidade: o Saint Magdalener Classico Nobilis 2020, feito com 10% de Lagrein + 90% da Schiava Picolo de vinhedos antigos, com passagem por tonéis de 2000 litros e leve fermentação espontânea. Mais concentrado, apresenta aromas intensos de frutas vermelhas maduras, leve caráter animal, com notas iniciais de couro e bom potencial de guarda.
A Obermoser faz parte dos grupos de pequenos produtores do Alto Ádige. Seus Lagrein também fazem sucesso. Em se tratando de uma uva tinta mais encorpada, requer passagem por madeira para afinar sua estrutura tânica. O Lagrein Obermoser DOC 2022 traz aromas intensos de fruta negra compotada, paladar frutado, taninos maduros e bom volume. Já o Lagrein Grafenleiten Vigna Riserva 2019 vem de um terreno mais alto e íngreme, com melhor insolação e drenagem. A estrutura mais firme é trabalhada com barrica e tonel, e o resultado é um vinho com nariz rico em frutas pretas, notas terrosas, tabaco e aparente mineralidade.
Seguindo-se na direção sul, antes da área de Trentino, chega-se à região próxima ao Lago di Caldaro, um dos mais quentes para banho na região dos Alpes e que tem influência moderadora no clima da região. Ali, logo abaixo, está o vilarejo de Termeno (Tramin em alemão), uma das supostas origens da uva Gewurztraminer. Mais à frente, está a comuna de Montagna, onde se encontra a sede da Vinícola Franz Haas, com origem em 1880. De porte mediano, possuem 60 hectares de vinhedos e assinam 19 rótulos de vinhos, dentre brancos e tintos. Vinhos de perfis mais clássicos, elegantes, francos. A Pinot Nero é a especialidade da casa, perfazendo um terço de sua produção. Os vinhedos da vinícola se dividem entre Montagna, Aldino e Egna – não por acaso, Egna é considerada a melhor área para a produção de Pinots Noirs.
Dentre os vinhos brancos, destaco um Pinot Grigio com um perfil bem purista, elegante, com acidez fresca e o “Manna”, corte de cinco uvas brancas mais robusto, untuoso, com intensa aromaticidade.
Manna: Nos tintos da Franz Haas, diferentes estilos de Pinots Neros, mas também há Schiava, Lagrein e Merlot. Os vinhos da Obermoser ainda não são comercializados no Brasil, mas os da Franz Haas são importados pela Vinheria Percussi, de São Paulo. Esta mesma importadora traz os vinhos de Elisabetta Foradori, vinícola situada em Trentino, tema do próximo artigo.