A SEMANA QUE PASSOU NO MERCADO
Tivemos uma semana carregada de indicadores e eventos econômicos que chacoalharam o mercado.
Na segunda-feira passada (16), saíram os PMIs (Purchasing Managers’ Index ou índice de gerentes de compras) de dezembro que nos deram uma boa fotografia da economia americana. A pesquisa Flash PMI de dezembro atestou a tendência já observada neste indicador ao longo do ano, ou seja, de crescimento na atividade empresarial (evidenciado pela leitura do índice composto acima de 50) puxado pelo forte desempenho do setor de serviços, que mais do que compensou a desaceleração por parte da indústria. O gráfico abaixo apresenta essa discrepância entre os dois setores. Em linhas gerais, houve uma aceleração do crescimento econômico em dezembro, com a produção aumentando na taxa mais acentuada em 33 meses.
Interessante notar que o dado trouxe uma percepção positiva das empresas sobre a produção para o próximo ano, que aumentaram as suas expectativas para o maior valor nos últimos 2 anos e meio, refletindo o crescente otimismo com relação à melhora das condições de negócios sob a administração Trump. O emprego também subiu pela primeira vez em cinco meses, em meio a essa perspectiva mais otimista das empresas. No entanto, o crescimento permaneceu fortemente inclinado para o setor de serviços, contrastando com um declínio acentuado na indústria.
De acordo com Chris Williamson, Chief Business Economist da S&P Global Market Intelligence:
“Os negócios estão se expandindo nos EUA, puxados pelo segmento de serviços, com a atividade de produção crescendo a uma taxa mais acentuada desde a reabertura da economia pós bloqueios da COVID, em 2021. A expansão do setor de serviços está ajudando a impulsionar o crescimento da economia para a sua maior taxa em quase três anos, consistente com o PIB aumentando a uma taxa anualizada de pouco mais de 3% em dezembro. No entanto, há um quadro diferente na indústria, com a produção caindo acentuadamente e a uma taxa maior, em parte devido à fraca demanda de exportação”.
Ou seja, o dado reforçou a percepção de uma economia americana evoluindo de forma consistente e condizente com uma taxa de crescimento próxima a 3% – vide gráfico abaixo.
Na terça-feira (17), acompanhamos as vendas no varejo que trouxeram dados mistos em novembro, já que o índice cheio veio acima do esperado (+0,7% versus +0,6% estimado) enquanto o núcleo ficou aquém do previsto pelo mercado (+0,2% versus +0,4% estimado). O número apresentou crescimento ante o mês anterior, refletindo a resiliência do consumo e dando um sinal de que a temporada de compras de fim de ano nos EUA começou bem. Além disso, as vendas no varejo de outubro foram revisadas para cima em 0,5% com relação ao registro anterior, que trazia um aumento de 0,4% no mês.
Contudo, o indicador mais importante da semana foi, sem dúvida, a decisão de juros nos EUA (FOMC Meeting). Conforme esperado, o Fed reduziu a taxa de referência da economia para um intervalo de 4,25% a 4,50% (corte de 25 bps), tal como aguardado pelo mercado.
Além da definição da taxa de juros, tivemos destaques importantes relacionados às projeções econômicas do comitê de política monetária americana. Abaixo vemos o quadro completo com as projeções do FOMC (Federal Open Market Committee), com os seguintes destaques:
- – A decisão de corte não foi unânime, com o registro de um voto para a manutenção da taxa;
- – A projeção de inflação para 2025 foi elevada de 2,1% para 2,5%;
- – São esperados outros dois cortes de juros ao longo de 2025, com a taxa encerrando o ano em um range de 3,75% a 4% (a expectativa anterior era de quatro cortes);
- – Houve um aumento marginal na taxa neutra de longo prazo de 2,9% para 3%.
Após a divulgação da decisão sobre os juros, o presidente do Fed, Jerome Powell, falou em sua tradicional entrevista coletiva sobre:
- – A necessidade dos cortes de juros. Ao ser indagado acerca da necessidade de cortes adicionais de juros, uma vez que a economia americana continua resiliente e ainda existam riscos inflacionários (especialmente num contexto em que o próprio Fed fez uma revisão das expectativas de inflação para cima em 2025), Powell deixou claro que a decisão tomada nesta última reunião foi apertada e que há diversas incertezas no cenário para o ano que vem. Ainda que não tenha especificado quais seriam essas incertezas, os receios com as eventuais mudanças de política econômica a serem implementadas por Trump ficaram implícitas.
- – As políticas do governo Trump. Segundo Powell, seria prematuro tanto estimar quais mudanças efetivamente farão parte da nova política de tarifas de Trump quanto incorporá-las às projeções do órgão, já que ainda não há detalhes sobre a magnitude ou a duração dessas medidas. Tampouco é possível dizer se as políticas implementadas no governo anterior de Trump poderão servir como proxy para este segundo mandato, por isso o Fed afirma que não fará projeções ou tomará decisões pautadas em suposições. Powell também disse que os membros têm levado em conta essas possibilidades ao pensarem nos seus votos e projetarem os cenários futuros.
- – Pausa em janeiro? Em sua entrevista, Powell ressaltou os receios do comitê em relação à inflação, relativizando as preocupações com o desemprego. De acordo com o presidente do Fed, a dinâmica de política monetária exige um ajuste fino para que não haja descontrole ou desancoragem de expectativas inflacionárias. Ao frisar sobre a preocupação com a inflação, ficou implícito que o Fed deve pausar os cortes até que haja uma evolução dos dados.
- – Taxa neutra. Powell comentou que esse conceito se refere a uma taxa de juros de uma economia em equilíbrio e que as projeções atuais não necessariamente significam que a taxa de longo prazo estimada será a mesma para daqui três ou quatro anos.
- – Recessão. Ficou claro que uma recessão americana foi evitada, com um crescimento econômico inclusive acima do esperado incialmente. As mudanças nas projeções já incorporam essa nova visão mais positiva. Powell disse que o ajuste feito às expectativas de inflação teve em conta a força e a resiliência da economia dos EUA e isso acaba sendo um bom sinal.
- – Meta de 2%. Questionado sobre a possibilidade de o Fed se resignar com uma inflação de 2,5%, um pouco acima da meta original, o presidente Jerome Powell foi veemente em sua resposta ao afirmar que o Fed se mantém comprometido com a taxa-alvo de 2%.
- – Aumento de juros? Nada é descartado, mas no cenário atual parece altamente improvável a necessidade de subir a taxa de juros em 2025.
Como a agenda da última semana foi bastante cheia, contamos com a divulgação de alguns outros dados além dos citados anteriormente, mas para não deixar esta Weekly muito extensa, citaremos apenas mais um indicador importante.
O PCE, índice de inflação mais acompanhado pelo Fed, apresentou uma inflação mais branda em novembro, com todos os recortes ficando abaixo do esperado pelo mercado, apesar de ainda estar acima da meta anual do Fed. O indicador mostrou um aumento de 0,1% em relação a outubro e de 2,4% em sua base anual. Excluindo alimentos e energia, o PCE teve uma alta de 0,1% no mês e de 2,8% em relação ao ano passado, com ambas as leituras ficando 0,1 ponto percentual abaixo da previsão. Os números de renda e gastos pessoais também permaneceram abaixo do esperado: a renda pessoal aumentou 0,3% após alta de 0,7% em outubro (abaixo da estimativa de 0,4%), enquanto os gastos pessoais aumentaram 0,4% – um décimo de ponto percentual abaixo do previsto.
Por fim, o PCE trouxe mais uma surpresa positiva no campo inflacionário em meio à resiliência da economia americana, medida pelos últimos dados de atividade. A tendência benigna se mantém, em especial no setor de serviços, mesmo com uma atividade econômica resiliente.
IMPACTOS NO MERCADO?
O principal driver que impactou a precificação de mercado foi a decisão de juros pelo FOMC, na última quarta-feira (18).
O corte de 25 bps veio totalmente em linha com o esperado pelo mercado. No entanto, fatores como a decisão não unânime dos membros do comitê, as mudanças nas projeções econômicas, os comentários de Powell ao balanço de riscos inflacionários durante a sua entrevista coletiva e a sua ressalva acerca das incertezas futuras indicam que devemos ver uma pausa nos cortes de juros na próxima reunião do comitê, em janeiro.
Essa leitura acabou por impactar as expectativas medidas pela ferramenta CME FedWatch, que agora apontam para apenas um corte de juros ao longo de 2025. Na sequência abaixo, vemos também o gráfico das curvas de juros de 2, 10 e 30 anos, que mostraram uma elevação dos yields nessa semana.
Olhando à frente, nos deparamos com alguns riscos potenciais relacionados à visão prospectiva e às possíveis políticas tarifárias do futuro governo de Donald Trump. Apesar dos números positivos do PCE, entendemos que a perspectiva de pausa nos cortes de juros para a próxima reunião do FOMC deverá se manter. O Fed deve aguardar novos dados referentes ao progresso na queda da inflação ou deterioração significativa do mercado de trabalho antes de tomar alguma decisão acerca de mais cortes de juros.
Na renda variável, a imagem de um Fed mais hawkish (inclinado à manutenção de juros mais altos para conter a inflação) catalisou um movimento de realização de lucros na bolsa americana, em especial após as fortes altas observadas durante o ano e em meio à entrada de um período de menor liquidez, com diversas pausas no mercado.
Vale ainda comentar o comportamento do dólar, que atingiu uma nova máxima histórica ante o real. Já falamos diversas vezes, tanto aqui quanto em nossas lives, que grande parte da alta observada na moeda americana este ano deriva da percepção negativa acerca da trajetória fiscal brasileira e à (falta de) importância que tem sido dada ao tema pelo atual governo.
No entanto, na semana passada, o vento externo também soprou contra a moeda brasileira, refletindo a percepção geral dos mercados globais sobre a redução dos cortes de juros nos EUA, com o índice dólar se valorizando ao redor do mundo – vide gráfico abaixo.
E claro que esse cenário teve impacto no dólar contra o real, que alcançou novas máximas mesmo após sucessivas intervenções do Banco Central brasileiro.
Sobre o dólar, não temos a menor pretensão em estimar o seu movimento. Ressaltamos apenas que as percepções de risco associadas ao Brasil se refletem em sua moeda, de modo que enquanto não houver um tratamento adequado à situação fiscal brasileira e uma conscientização da sua necessidade, com propostas efetivas de corte e/ou controle de gastos, é provável que continuemos a ver o real pressionado. Fora isso, na cena externa, o vento segue favorável à moeda americana, graças à resiliência da economia dos EUA e à perspectiva de menos cortes de juros.
A SEMANA QUE SE INICIA…
Para esta semana há poucos indicadores e resultados previstos para serem divulgados. Isso porque o mercado costuma parar durante as festas de final de ano, que desta vez serão bastante comemoradas pelo fato de 2024 ter sido particularmente excepcional para a renda variável.
- – Na segunda-feira (23), foi divulgado o dado de confiança do consumidor americano;
- – Já na terça-feira (24), não tivemos indicadores e o mercado fechou mais cedo, às 13h dos EUA;
- – Na quarta-feira (25), o mercado ficou fechado;
- – E na quinta-feira (26), haverá atualização dos pedidos de auxílio-desemprego.
William Castro Alves
Estrategista-chefe da Avenue Securities