Decisão na Justiça do Trabalho acende alerta sobre a análise de dados

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Direito digital (ilustração Pixabay)
Ilustração: Pixabay

A jurimetria, a famosa “estatística aplicada ao Direito”, importante ferramenta de análise jurídica, que nos ajuda a compreender tendências e posicionamentos judiciais, através de dados matemáticos e estatísticos, está com todos os holofotes voltados a ela após decisão proferida pelo desembargador João Batista Martins César, da 11ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho de Campinas.

O desembargador não homologou acordo realizado entre reclamante e reclamada, sob o argumento de que a reclamada, através do uso da jurimetria, pratica fraude trabalhista ao tentar uniformizar a jurisprudência, optando por formalizar acordo apenas em comarcas em que tem tido decisões desfavoráveis, com o intuito de não permitir a criação de jurisprudências negativas.

Ora, não é de hoje que advogados estudam e analisam decisões judiciais objetivando compreender melhor quais os possíveis caminhos que um juiz adotaria em uma sentença ou quais desdobramentos um litígio poderia tomar. Essa atividade sempre foi feita através do estudo de casos e buscas jurisprudenciais.

Trata-se, portanto, de uma atividade intelectual que, com a grande ajuda da tecnologia, tornou-se mais abrangente e eficiente. Sendo assim, por que culpar a inovação e aqueles que a utilizam de forma estratégica e inteligente por usufruírem dessa ferramenta da melhor forma?

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Por essa razão, referida decisão nos traz algumas preocupações. A primeira delas diz respeito à segurança jurídica, pois analisar jurisprudência e tendências decisórias é algo que sempre foi presente no Direito. Existiam livros com repositório de jurisprudências e, com o avanço da tecnologia, essa análise ficou mais eficiente e mais inteligente. Com isso, tomar decisões estratégicas sobre esse repositório que é disponível não representa fraude.

Inclusive o próprio Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem trabalhado muito a análise dos bancos de dados judiciais e está em uma campanha de organização desse acervo junto aos tribunais.

A segunda preocupação esbarra na questão do investimento em tecnologia e inovação, pois ao vir uma decisão como essa, impacta diretamente nos modelos e negócios de muitas startups jurídicas, as chamadas legal e lawtechs, que hoje já movimentam muito o mercado de tecnologia com autos investimentos, inclusive se investidores de fora.

E a terceira, mas não menos importante, se dá pela interferência que ocorreu na vontade das partes. No caso em comentado, reclamante e reclamada formalizaram acordo, respeitando os ditames da lei. As partes são representadas por advogados, inclusive o motorista, logo, ele não estava desamparado, pelo contrário, os advogados em casos de acordo também fazem essas análises de risco sobre perder e ganhar para levar em conta na negociação do acordo.

A inovação e tecnologia vieram para impactar positivamente a área jurídica como um todo, dos órgãos públicos a iniciativa privada, principalmente pelo volume de informações e burocracias que temos nesse universo no Brasil. Assim, temos que ter muito cuidado para não gerar insegurança e desincentivar essa constante melhoria que as ferramentas podem trazer para toda a sociedade.

 

Thiago do Val é advogado, professor da Pós-Graduação em Relações Institucionais e Governamentais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Brasília.

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