– É sabida a necessidade de atuação incisiva na superação do racismo e da discriminação racial, tanto no âmbito das políticas públicas, quanto das políticas empresariais. A divulgação recente do estudo organizado pela Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal), pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), denominado “Emprego, Desenvolvimento Humano e Trabalho Decente – A Experiência Brasileira Recente” (www.pnud.org.br), acentuou esta necessidade.
– Consta do estudo que, em 2006, os percentuais de negros (pretos e pardos) e de brancos com jornada de trabalho superior às 44 horas semanais, previstas na Constituição, alcançaram cifras próximas a 35% (pretos e pardos) e 34,4% (brancos). No entanto, pretos e pardos recebiam, em média, 46,8% menos que os brancos.
– No período compreendido entre 1992 e 2006, a desigualdade praticamente não acusou qualquer correção significativa. Em 1992, os pretos e pardos recebiam, em média, 50% do que recebiam os brancos. Depois de 14 anos, os negros passaram a receber 53,2% do que recebiam os brancos.
– Uma crença recorrente, tão prezada por alguns economistas, é desmentida pelo estudo, a de que a desigualdade decorre da diferença de escolaridade. Em 1992, os homens pretos ou pardos com maior escolaridade (15 anos ou mais de estudos) recebiam 70,4% do rendimento dos homens brancos com a mesma escolaridade. Em 2006, os negros passaram a receber 72,9% do rendimento dos homens brancos, uma pequena correção da desigualdade.
– Entre os de menor escolaridade, a desigualdade recuou em proporção maior, no mesmo período. Em 1992, pretos e pardos recebiam, em média, 61,3% da remuneração dos brancos. Em 2006, chegaram a 73,9% da remuneração dos brancos, em média. Uma recuperação, nesta faixa de escolaridade mais baixa, proporcionalmente maior do que no segmento dos de maior escolaridade.
– Entre as mulheres, verificou-se a mesma tendência. No segmento com menos tempo de escolaridade, o rendimento comparado ao dos homens brancos passou de 40,5%, em 1992, para 54,9%, em 2006.
– Entre as mulheres negras, com 15 anos ou mais de estudos, a evolução da remuneração média, comparada à dos homens brancos com escolaridade semelhante, representava 41,4%, em 1992. Depois de 14 anos, esta proporção alcançou 44,9%, uma melhoria mais discreta neste segmento do que entre os menos escolarizados.
– Resultado da III Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada em setembro de 2001, a Declaração de Durban leva o nome da cidade da África do Sul onde a conferência foi realizada e faz referências objetivas a algumas possibilidades objetivas de atuação das empresas neste temário.
– É o caso do parágrafo 63, que incentiva o setor empresarial, em particular a indústria do turismo e os provedores de serviços da Internet, a desenvolverem códigos de conduta, visando a impedir o tráfico de seres humanos e a proteger as suas vítimas.
– No item referente ao emprego, a Declaração de Durban menciona a necessidade de organização e funcionamento de empresas cujos proprietários sejam vítimas de racismo, discriminação racial, xenofobia e intolerância correlata, com a correspondente promoção da igualdade de condições de acesso ao crédito e a programas de treinamento.
– O parágrafo 104 menciona o apoio à criação de locais de trabalho livres de discriminação, através de estratégias multifacetadas que incluam o cumprimento dos direitos civis e a proteção dos direitos dos trabalhadores sujeitos ao racismo e à intolerância racial.
– No parágrafo 215, no título “Setor privado”, a declaração insta os Estados a adotarem medidas para assegurar que as corporações transnacionais operem nos territórios nacionais, respeitando preceitos e práticas de não-racismo e de não discriminação. Incentiva ainda a colaboração com sindicatos para o desenvolvimento de códigos de conduta de adoção voluntária, destinados à prevenção, ao combate e à erradicação do racismo.
– Além de políticas públicas, políticas empresariais de responsabilidade social são indispensáveis para corrigir a iniqüidade derivada de práticas de discriminação racial. A Declaração de Durban oferece às empresas responsáveis um roteiro de possibilidades de intervenção e orientação sobre caminhos capazes de aproximar Brasis tão afastados.
Paulo Márcio de Mello
Professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
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