A atual dinâmica da inflação, da taxa de juros e da taxa de câmbio na economia argentina representa desafios para o governo do presidente Javier Milei e sua atual proposta de liberar as restrições cambiais e, posteriormente, realizar um plano de dolarização, sugeriram economistas do Centro de Economia Política Argentina (Cepa).
A diretora do Cepa, Julia Strada, disse à agência Xinhua que a política levada a cabo pelo presidente Milei tem como prioridade melhorar o balanço do Banco Central da República Argentina (BCRA), com o qual procedeu à “liquefação do passivo em pesos” da entidade monetária através da forte desvalorização inicial em Dezembro passado e da descida sustentada da taxa de juro de referência.
“O que Milei quer com a desvalorização? Reduzir a base monetária e liquefazer a poupança em pesos. Isso reduz, em termos relativos, a quantidade de dólares que o Banco Central tem versus a quantidade de pesos que estavam na economia, que é o Banco Central O passivo do banco, com a desvalorização, o peso, ou o impacto da quantidade de pesos sobre a quantidade de dólares, é reduzido”, disse Strada, também membro do Congresso argentino.
Porém, a atual relação entre a taxa de câmbio (que se manteve estável após a desvalorização de dezembro), a taxa de juros e a inflação contrariaria o objetivo de reduzir o volume da dívida do Banco Central em moeda estrangeira se quiser avançar com a dolarização plano no futuro, explicado pelo Cepa.
“O fato de o gap cambial não ter aumentado é um problema para Milei porque o dólar está mais barato. Como você tem um dólar financeiro (Cash With Settlement, bolsa paralela) que não se movimenta, então o peso do passivo do Banco Central é o mesmo em termos de dólares”, disse o economista e também diretor do Cepa, Hernán Letcher, em diálogo com a Xinhua.
Ressalte-se que o gap cambial na Argentina ou a diferença entre os valores da moeda no mercado oficial e no segmento paralelo, hoje é de 32 por cento. Nos últimos dois meses, isso tende a oscilar, chegando até a atingir recordes mínimos não vistos desde 2019.
O dólar oficial avança a uma taxa mensal de 2 por cento (crawling peg) contra a inflação cujo nível mensal mais baixo registado desde o início do ano foi de 8,8 por cento; Portanto, até agora neste ano, o aumento de preços acumulou 65 por cento enquanto o dólar valorizou apenas 9,3 por cento.
A este cenário, soma-se a queda das taxas, que passaram de 133 por cento em dezembro para 40 por cento atualmente. Letcher acrescentou que numa situação em que os juros dos instrumentos de poupança em pesos diminuem devido à política tarifária do BCRA mas, mesmo assim o preço da moeda está abaixo desses níveis, as responsabilidades do BCRA aumentam.
“O prazo fixo está perdendo frente à inflação, mas vence o dólar. É uma grande contradição porque, se o que se quer é dolarizar, isso é errado, porque toda vez que os prazos fixos são atualizados, a taxa que o BCRA paga ao os bancos comerciais, a taxa repo, essa variação supera o dólar, o que aumenta o dólar no meu passivo é uma grande contradição”, explicou.
Para Strada, esta “contradição” não teve grandes implicações nem exerceu pressão sobre a economia argentina porque continuam em vigor controles rígidos de câmbio no país sul-americano. Para ambos os economistas, o objetivo do Governo Milei é eliminar as restrições cambiais no final do ano em curso, enquanto a dolarização seria proposta para as eleições presidenciais de 2025, depois de criadas as condições exigidas.
“A dolarização amanhã apresenta riscos elevados porque não há dólares suficientes. O governo propôs uma espécie de roteiro. O roteiro consiste em duas etapas: a primeira etapa é a eliminação das restrições cambiais, que em princípio é o que estamos buscando agora”, disse Letcher. . Segundo ambos os especialistas, o Governo não pode levantar o controle cambial no curto prazo devido à fragilidade que ainda vivem as reservas do Banco Central da Argentina.
“Até dezembro, antes da mudança de governo, a Argentina tinha reservas negativas com base nas reservas líquidas; depois, embora Milei tenha conseguido melhorar as reservas, apesar da desvalorização e da liquefação, ainda não é suficiente para levantar os estoques”, comentou Strada. “Não é suficiente porque se todos os passivos do Banco Central pressionarem o dólar, a quantidade de dólares que integrará a procura será maior”, acrescentou.
Segundo estudos do Cepa, ao valor do dólar oficial no início de março passado, o passivo do BCRA em pesos exercia uma pressão de cerca de US bilhões, enquanto se houvesse uma nova desvalorização esse número cairia para US$ 35 bilhões. Finalmente, o que mais ajudará o Governo a levantar a barreira cambial é movimentar a taxa de câmbio”, concluíram os economistas.