Desdobramentos da intervenção na Petrobras

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Ministro da Economia, Paulo Guedes (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr)
Ministro da Economia, Paulo Guedes (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr)

Na sexta-feira, o mercado recebeu uma notícia muito negativa. O presidente da República, Jair Bolsonaro, informou que faria interferência na Petrobras dizendo que “algo vai acontecer na Petrobras”. Esse “algo” foi a troca do então presidente Roberto Castello Branco, um “Chicago boy”, indicado pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e alinhado com agendas liberais. Assim, substituição de Castello Branco contribuiu para o mau humor do mercado, fazendo com que as ações preferenciais PTRE4 perdessem 6,32% e PETR3 caissem 7,92%.

Nesta segunda-feira (22), dado que após o pregão de sexta-feira o presidente da República anunciou a troca de comando da companhia, colocando o general Joaquim Silva e Luna, o temor do mercado era de que o Conselho da companhia aceitasse o comando de Luna, um general aposentado que, até então, atua como presidente da usina elétrica de Itaipu e que também foi ministro da Defesa do ex-presidente Michel Temer, o que pode interromper o processo de desinvestimentos e vendas de refinarias da companhia.

O novo presidente da Petrobras informou que não possui interesse em política de interferência de preços, enquanto Bolsonaro afirmou não ter interesse em interferir na política de preços. Na visão do general, se o Brasil adotar um sistema de estabilização de preços, tal quais os existentes em países europeus, os consumidores poderão ser beneficiados. No entanto, para o mercado, a medida de Bolsonaro e sua mudança de postura gerou mau humor por vários motivos, podendo impactar, inclusive, a economia real.

O problema de ingerência está relacionado a mudança na condução da política da Petrobras. O antigo presidente, Roberto Castello Branco, tinha compromisso com a política de desinvestimentos da companhia e a privatização das refinarias, com objetivo de reduzir o endividamento e os custos da empresa. Focando apenas na extração de petróleo, o que fazia os investidores olharem com bons olhos, ainda mais após a elevação nos preços, tendo em vista um eminente novo ciclo das commodities. Tal problema entra na questão do conflito de agência, parte importante da teoria econômica que estuda os contratos feitos entre os agentes econômicos.

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A Teoria do Conflito de Agência ou Teoria do Agente-Principal, desenvolvida pelos economistas Jensen e Macking, parte do princípio de que os agentes econômicos, sejam eles governo, família ou empresas, firmam contratos bilaterais, os quais podem ser rompidos a qualquer momento.

Como o contrato é bilateral, existem dois atores econômicos dentro da negociação, um intitulado como “agente” e outro como “principal”. O agente é o participante da negociação que possui todas as informações referentes ao contrato, logo é o participante da operação que pode tomar decisões que resultem em consequências negativas para o principal. Assim, o principal é a parte do contrato que não possui todas as informações e é quem pode ser prejudicado no momento da operação.

Além disso, pode gerar mais outros dois problemas: a seleção adversa e o risco moral. A seleção adversa se baseia na hipótese de que a demanda pelo contrato ocorre de forma ineficiente, por exemplo. Ao selecionar um veículo, o agente não tem todas as informações referentes ao veículo, sem saber se é um bom carro ou não. O outro possível problema ocasionado pelo conflito de agência ocorre depois que contrato é feito e é chamado de risco moral. No caso do risco moral, quando o principal aceita o contrato, o agente pode ter diversas atitudes que podem afetar o principal sem que este último saiba.

Um exemplo é no mercado de serviços, onde o principal é a seguradora e o principal é o cliente. Ao contratar o serviço de uma seguradora, o cliente pode não tomar os cuidados necessários, gerando custos para a corretora de seguros que poderiam ser incluídos no valor do seguro antes das duas partes firmarem o contrato.

Feitas as considerações sobre o conflito de agência, agora é possível entender melhor o motivo da queda da Petrobras e de outras companhias do setor público que também podem ter intervenção governamental. No caso da Petrobras, foi dito pelo próprio presidente da República que não haveria intervenção na companhia, tal como em outras estatais.

Mas diante do aumento dos preços internacionais do petróleo, Bolsonaro mudou sua postura, sinalizando para o mercado, a posteriori, que pode não se comprometer com as pautas liberais anunciadas anteriormente. Assim, a situação pode ser vista como um problema de risco moral, pois todos os investidores que aplicaram seus respectivos recursos nas ações da Petrobras tinham projeções criadas quanto à companhia e sua gestão. Como o governo é o acionista majoritário, é ele que pode tomar as decisões que podem afetar os demais acionistas, logo o Estado assume o papel de “agente” e os demais investidores de “principal”, de modo que o investidor minoritário fique com o ônus.

Outros efeitos da situação também foram evidenciados, com a alteração nas expectativas de outras variáveis econômicas importantes como câmbio, risco Brasil e taxa de juros. A mudança na política de preços da Petrobras não é o único problema. Para o mercado, a postura do presidente da República também mostra uma guinada populista que pode ser expandida para outras companhias estatais como Banco do Brasil (BBSA3) e Eletrobras (ELET3), que também tiveram forte desaceleração no pregão de segunda-feira. Com isso, a perspectiva de uma agenda liberal voltada às privatizações pode ser preterida por populismo, aumentando o risco percebido em relação ao país, como pode ser visto no avanço da taxa de juros futuros:

A taxa de juros futuros para 2027 fechou o dia com alta de 3,27%, cotado em 7,57%. A elevação dessa variável aumenta o prêmio pelo risco para que os investidores apliquem no mercado brasileiro e, por consequência, faz o dólar subir. Juntamente com as perspectivas de alta da inflação por conta do aumento dos preços das commodities, os juros futuros recebem um impulso adicional, levando o mercado a antecipar um aumento na Selic, a taxa básica de juros.

A situação também piora para a força do governo em relação a outras pautas fiscais. Isto porque o governo pode assumir uma postura mais populista, além do fato de que Paulo Guedes ainda não se manifestou quanto ao ocorrido, jogando dúvidas do mercado quanto à continuação de suas agendas econômicas e como ficará a sua figura no governo. A percepção é de que o “superministro” de Bolsonaro pode estar ficando cada vez mais isolado.

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Matheus Jaconeli

Economista

Nova Futura Investimentos

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