Apesar de o art. 225 da Constituição brasileira consagrar a visão de acesso equitativo aos recursos naturais, existe uma apropriação privada dos recursos naturais por uma parcela da população e, por outra parcela menos privilegiada, há uma assunção não voluntária dos riscos ambientais. Esta parcela sofre com os impactos ambientais de atividades que não levam em conta o fator social, e, por isso, comunidades carentes continuam privadas do acesso à água potável, aos solos agricultáveis e à energia.
Interpretar o direito ao meio ambiente de acordo com o princípio da dignidade da pessoa humana significa interferir na realidade social de muitos brasileiros, através de uma justiça mais equitativa. Nesse contexto, a proteção ao meio ambiente guarda relação direta com o combate à desigualdade social, pois é capaz de transferir os benefícios da exploração ambiental também às classes menos favorecidas.
Grandes projetos econômicos, como a instalação de indústrias ou de hidrelétricas que possam afetar o meio ambiente, a qualidade do ar ou das águas, bem como os recursos naturais que compõem as terras de povos originários e populações tradicionais, devem obter licenciamento ambiental nos termos do art. 225, inc. IV, da CRB, inclusive mediante a realização de audiências públicas.
Não obstante a grande aptidão econômica de nossas florestas, inclusive detendo a Amazônia a maior biodiversidade do planeta, os direitos territoriais e culturais das comunidades locais ainda não são tratados de forma eficiente para garantir-lhes condições dignas de sobrevivência.
O prejuízo que medidas de exploração econômica em território indígena, a exemplo da hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, Pará, representou à identidade cultural destes povos é enorme. Afetou não apenas os povos originários mas, também, as populações tradicionais que do rio retiravam o seu sustento e sobreviviam graças à fartura de peixes e qualidade das águas.
A escritora e jornalista Eliane Brum relata, ao narrar a saga dos “beiradeiros”, que a ideologia de desenvolvimento econômico que se impôs pela força em Belo Monte não combina em nada em nomear a arma de destruição de “belo”: “[…] e assim, aqueles por ela esmagados resistiram também pela palavra ao renomear a carcereira do Xingu de Belo Monstro […].”(in Banzeiro Ò KÒTÓ uma viagem à Amazônica centro do mundo, Companhia das Letras. p.81).
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Assegurar a integridade física, social e cultural aos povos indígenas e populações tradicionais através da proteção de suas posses originárias ou adquiridas, significa assegurar-lhes a sua qualidade de vida e dignidade.
Saliente-se que não há direito à livre iniciativa e ao desenvolvimento sustentável, a ponto de ferir a dignidade da pessoa humana, sob qualquer prisma, individual ou coletivo, de minorias ou não, de povos originários e populações tradicionais ou não tradicionais.
A liberdade só será possível num ambiente de pluralismo político se aliada à solidariedade e ao respeito à dignidade entre os homens na condição destes como responsáveis pelo seu próprio destino. Afinal, a proteção ao meio ambiente não se esgota numa questão de legitimação mas envolve inúmeros fatores que vão além da liberdade econômica, pois nesta proteção é que reside a possibilidade de nossa própria sobrevivência.