Desmantelamento do sistema nacional de ciência e

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tecnologia
Depois de ter entregue a maior empresa de mineração do mundo, a Vale do Rio Doce, na bacia das almas, para um grupo assessorado pelo filho do presidente da República, o atual governo faz de tudo para enfraquecer e inviabilizar a Petrobras, e para entregar as empresas de geração de eletricidade (Furnas, Cesp, Chesf, Cemig, Copel etc.). As mais estratégicas e lucrativas empresas de distribuição (Light, Eletropaulo, parte da Cemig etc.) já foram transferidas para grupos estrangeiros.
Além de altamente lucrativo (pode gerar lucros líquidos da ordem de US$ 11 bilhões por ano), o setor elétrico é o mais dinâmico e estratégico da infra-estrutura produtiva. Sua entrega não deixa margem para dúvidas: há algo de muito suspeito, senão de podre, no governo de FHC. E mais nos convencemos disso, à medida em que assistimos às sessões da CPI dos bancos, transmitidas pela TV do Senado.
Segundo o governo, as privatizações “diminuiriam o déficit público e resgatariam a dívida externa, deixando mais recursos para as políticas sociais”. Mas os fatos mostram que, com elas, o Brasil só perdeu: de 1994 a 1998 o déficit público saltou de R$ 60 bilhões para R$ 350 bilhões e a dívida externa passou de US$ 120 bilhões para US$ 235 bilhões, apesar de, no período em questão, terem sido pagos US$ 126 bilhões aos credores externos. Por força dessa sangria de recursos, a saúde pública debilita-se; os sistemas de ensino primário e de segundo grau vão à deriva; os índices de desemprego são os maiores de nossa história; os salários são indignos e a violência nas cidades é assustadora e crescente. Os grandes jornais e emissoras de TV, obsessivamente, procuram esconder essa decadência generalizada, pintando de cores alegres as múltiplas viagens do presidente da República a Washington, Nova York, Paris e Londres, onde ele recebe muitas homenagens de empresários favorecidos pelas políticas entreguistas de seu governo. Por isso, sente-se tão bem em seus inúmeros encontros com banqueiros, ansiosos por extraírem cada vez maiores lucros de suas filiais brasileiras, deixando-nos dívidas injustas, a serem pagas até pelos netos de nossos bisnetos.
Com a “flexibilização” tarifária sem contrapartida e a política cambial desastrada e contrária aos interesses brasileiros, o governo FHC forçou empresários nacionais que, nas últimas quatro ou cinco décadas, contribuíram com grande mérito para o desenvolvimento do Brasil, a fechar ou desnacionalizar estabelecimentos industriais dos mais dinâmicos, no tocante ao desenvolvimento e utilização de tecnologias de ponta. Nem Calabar, associado a Joaquim Silvério dos Reis, cometeria traição semelhante.
A comunidade científica prepara-se para comemorar o centenário da fundação do Instituto Oswaldo Cruz, glorioso iniciador da moderna pesquisa científica no Brasil, de onde saíram homens do gênio de Carlos Chagas. Mas essa comemoração é estranha ao governo FHC, empenhado em desmantelar o que resta de nossos sistemas de pesquisa científica e tecnológica e de educação universitária.
Para esse desmantelamento, um passo importante foi a nomeação de um economista com experiência profissional na área dos supermercados para gerir a sistema de ciência e tecnologia. Em vez de ser conhecido por meio de publicações em revistas científicas, o novo ministro tornou-se célebre pelo envolvimento de parentes próximos no escândalo da privatização do Banespa. Quanto ao ministro da Educação (já no cargo há mais de quatro anos), também economista, é conhecido apenas por sua medíocre passagem pela reitoria da Unicamp, e pelas viagens turísticas, pagas com dinheiro público.
Por isso, não é de se estranhar que ambos prefiram monopólios privados até na educação, em prejuízo da Universidade Pública, e que desejem introduzir, no sistema de ciência e tecnologia, a canibalesca lógica do neoliberalismo, pela qual a exposição das instituições locais à concorrência externa conduziria o Brasil à inovação tecnológica e ao desenvolvimento, graças a ganhos de competitividade. Como se o sistema de ciência e tecnologia fosse um supermercado!

José Leite Lopes
Foi, durante 15 anos, professor titular de Física Teórica da Universidade Louis Pasteur, de Estrasburgo. Atualmente é pesquisador do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas e professor emérito da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Joaquim Francisco de Carvalho
Foi coordenador do Setor Industrial do Ministério de Planejamento, diretor da Nuclen (atual Eletronoclear) e engenheiro da Cesp.

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