Conversamos sobre o Banco Digio com Marcelo Scarpa, diretor executivo do banco digital.
Como o Digio se posiciona no competitivo mercado de bancos digitais?
O que diferencia o Digio dos outros bancos digitais é que nós não abrimos uma conta digital. Nós iniciamos um relacionamento através de um cartão de crédito, e não através de uma conta digital. Assim, para que uma pessoa entre no Digio e tenha uma conta digital, ela precisa ser aprovada no cartão de crédito. Essa é uma diferença bastante importante do Digio para os outros players. Ela é uma estratégia, basicamente, diferente, mas não há melhor ou pior aqui.
Mensalmente, nós temos uma quantidade muito grande de solicitações de cartão, mas por questões, principalmente, de crédito e de fraude, nós atendemos uma fração desses pedidos.
Qual é o público-alvo do Digio?
Nós não temos um público-alvo específico. Nós temos as nossas políticas de crédito que são aprovadas de acordo com diversos critérios de crédito e de prevenção a fraude. O que eu posso dizer aqui não é nem o público-alvo, mas a base do banco, que é muito mais voltada para um público jovem, por volta de 25 a 30 anos. Como o nosso público-alvo é quem nós aprovamos no nosso cartão de crédito, isso faz com que não haja questões de renda, idade ou demografia.
Se a porta de entrada no Digio é a concessão de um cartão de crédito, como o banco controla a concessão desse crédito? Faço essa pergunta, pois a pessoa pode ter mais de um cartão de crédito, o que afeta a sua capacidade de pagamento.
Dar crédito no Brasil, no que chamamos de mar aberto, é uma questão difícil e complexa. Nós usamos toda a parte de machine learning e de Inteligência Artificial dos nossos modelos de crédito, colocamos mais de 1.200 variáveis que avaliamos dentro de um liquidificador e batemos, para que assim saiam as nossas aprovações.
Quando voltamos a 2016, quando o cartão de crédito do Digio foi lançado, a oferta de cartões de crédito para esse público era muito pequena, mas hoje há uma facilidade de acesso muito grande. Ao longo dos últimos anos, nós vimos a quantidade de cartões por CPF crescer muito, o que trouxe uma forte complexidade para o crédito, pois o bolso é único, já que o salário e a renda do cliente são um só. Tanto que, nos últimos anos, nós vimos uma crescente muito forte do endividamento da população.
A pandemia também acelerou muito a digitalização das pessoas, pois, de uma hora para a outra, elas não tinham mais acesso a uma agência física. Muitos clientes com faixa etária mais alta ou de baixa renda, que muitas vezes não eram digitalizados, tiveram que se digitalizar quase que a fórceps, pois como eles tinham que receber o auxílio emergencial, eles tiveram que começar a interagir com um aplicativo de celular para se servir na sua relação financeira. Isso também acelerou essa rampa que houve na quantidade de cartões de crédito por CPF.
Falando um pouco sobre a estratégia do Digio, de um tempo para cá nós começamos a diversificar um pouco a nossa carteira de crédito. Se olharmos essa carteira há dois, três anos, ela era muito forte no cartão de crédito, mas hoje ela está diversificada entre cartão de crédito, consignado e B2B.
No B2B nós temos uma parceria muito forte com a Uber, através da qual seus motoristas recebem os valores das corridas através de uma conta que é gerenciada pelo Digio. Essa é uma vertente que nós não tínhamos.
Nós começamos a diversificar a nossa carteira de crédito muito pelo momento difícil da economia, o que fez com que muitas instituições financeiras sofressem nos últimos anos por conta da exposição, principalmente, à baixa renda.
Com essa diversificação da carteira, o Digio tem atingido um sucesso importante, tanto que na divulgação de resultado do Bradesco nós temos uma página que mostra o crescimento das nossas contas, da nossa carteira de crédito e das nossas receitas. Em todos esses itens, nós temos números bastante expressivos no ano contra ano.
Como se ganha um cliente nesse mercado?
O cliente que bate aqui busca um limite de crédito. Como muitas vezes eles são jovens, novos entrantes e não têm crédito em outras instituições, o nosso grande diferencial é o acesso através de um produto de crédito, diferente das outras instituições, que abrem o relacionamento através de uma conta de pagamento ou de uma conta-corrente.
O grande desafio dos bancos digitais e das fintechs é que eles abrem uma quantidade enorme de contas, já que é muito fácil abri-las, bastando baixar o aplicativo do celular e fazer o onboard, sem o pagamento de taxas e tarifas, mas a dificuldade é a rentabilização dessa base, que se dá através de produtos de crédito, seguros e serviços.
Aqui entra um pouco da nossa diferença para o Next, que tem uma estratégia muito mais parecida com as estratégias do Inter, C6 e Nubank, que é abrir o relacionamento através de uma conta, enquanto o Digio, como te disse, abre o relacionamento através de um produto de crédito.
Como não se perde um cliente nesse mercado?
Eu diria que é a experiência. As fintechs e os bancos digitais trouxeram um equilíbrio interessante para o mercado. Os bancos incumbentes têm know how e uma prateleira de produtos e serviços imbatíveis, só que as fintechs e os bancos digitais trouxeram uma forma de servir o cliente com um custo muito mais agressivo e muito mais baixo. Isso porque eles não têm agências físicas e todos os custos alocados para isso e possuem uma experiência muito mais fluida, pois como eles não têm unidades físicas de atendimento do cliente, eles têm que desenvolver todo o autosserviço e toda a resolução de problemas de uma forma muito mais fluída.
Com uma magnitude de oportunidades e de opções muito grande no mercado, você não perde um cliente através de uma boa experiência, pois se o cliente tem uma experiência ruim por algum motivo, é muito simples trocar. Antes havia uma complexidade para se fechar uma conta, mas hoje, como você não tem um custo atrelado, uma tarifa, é só, basicamente, parar de usar a conta. O problema é que o banco digital ou a fintech já teve custos, como com a análise de crédito e o envio do cartão para a casa do cliente.
Como o Digio pertence ao Bradesco, como manter a independência de forma a que o pensamento de um banco tradicional não interfira no pensamento de um banco digital?
Excelente pergunta. Eu diria que é a complementariedade. O Bradesco nos enxerga como um laboratório. Isso é dito de forma pública pelo Marcelo Noronha, que até pouco tempo atrás era o presidente do Conselho de Administração do Digio e que conhece muito a nossa operação. Existem muitas oportunidades que chegam ao Bradesco, mas que talvez não façam sentido pela questão financeira ou pela questão de prioridade sistêmica de desenvolvimento, mas que conseguimos fazer aqui dentro de uma forma mais rápida e mais fluida.
Trazendo um pouco a sardinha para o lado do Digio, nós testamos muito as questões de crédito. Com relação à Uber, nós lançamos a Uber Conta, que é gerenciada pelo Digio, abrimos mais de 1 milhão de contas e começamos a oferecer crédito para esse público, que muitas vezes é desassistido de crédito, pois, por exemplo, perdeu o emprego e foi ser motorista.
Como nós vimos que esse público não tinha acesso a crédito de forma muito simples no mercado, e com o comportamento que nós fomos vendo ao longo do tempo, já que temos esse projeto há mais de três anos aqui no banco, nós passamos a oferecer um produto de crédito para um público que o próprio Bradesco, até então, meio que não sabia como trabalhar. Isso mostra a complementariedade que o Digio traz para a estratégia do Bradesco.
Enquanto o Bradesco é um banco incumbente, com todo o seu tamanho e pujança, o Digio é uma operação mais leve, com um custo de servir menor e com uma plataforma muito mais fluida e desconectada do legado sistêmico do Bradesco, o que também traz para o Digio uma grande agilidade de desenvolvimento.
Você deixou bastante claro como o Digio aporta no Bradesco, mas como o Bradesco aporta no Digio?
De muitas formas. Eu vejo um equilíbrio muito interessante entre uma “startup”, entre aspas, um banco digital leve e pequeno, com 400 funcionários, que tem um time to market muito bom, e uma governança que nos traz um conforto muito grande, como, por exemplo, na questão de funding, já que todo o nosso funding vem, exclusivamente, da tesouraria do Bradesco, o que nos traz uma vantagem competitiva sobre um player que não tem um dono com a robustez do Bradesco. Além disso, nós temos a parte de compliance e de auditoria que o Bradesco nos aporta, fora as oportunidades que o Bradesco nos traz, seja por oportunidade, seja por time to market, e que o Digio acaba absorvendo.
Quando o Digio foi comprado pelo Bradesco, ele era um banco S4, sendo que os cinco maiores bancos, Bradesco, Itaú, Santander, Banco do Brasil e Caixa, são S1 (veja Regulação Prudencial do BC). Quando um banco é S1, ele tem um nível de governança e de observância do Banco Central, obviamente, muito mais elevado que uma fintech e um banco digital. Inclusive, há uma discussão aberta no mercado entre os bancos incumbentes e digitais, pois há um certo desequilíbrio de observância do Banco Central entre os bancos incumbentes e os novos entrantes. O ponto é que quando o Digio foi comprado pelo Bradesco, ele se tornou um banco S1, o que nos trouxe um nível altíssimo de complexidade, regulação e supervisionamento do Banco Central.
O Digio também tem a questão de suporte do Bradesco. Dando um exemplo prático, como o Bradesco tem uma área enorme de segurança da informação, que possui as melhores práticas do mercado, nós abordamos muito aqui o que o Bradesco já viveu. Outro ponto importante que o Bradesco aporta no Digio é o ganho de escala, como a negociação com fornecedores que já fornecem para o Bradesco, o que faz com que o Digio já entre na escala do Bradesco.
Quando nós comparamos o Digio com outros bancos digitais grandes, mas que não possuem um dono do tamanho do Bradesco, esse equilíbrio traz um ponto muito positivo.
Com relação a atuação do Digio no consignado, existe tanto mercado assim para tantas instituições?
O que está acontecendo no mercado de consignado é muito parecido com o que falamos no início sobre bancos digitais. Como o consignado acabou virando uma commodity, a diferença passou a ser a experiência do cliente. Hoje, esse mercado ainda é muito pautado em correspondentes bancários, nos famosos pastinhas, só que poucos bancos fazem uma experiência digital muito boa desse produto. Aqui, o nosso desafio, como um banco 100% digital nativo, é ter uma experiência do consignado fluida no digital.
Como esse produto virou uma commodity, ele é até regulado com relação ao teto da taxa. Como as taxas são muito parecidas entre os players, a experiência de uma forma digital, seja do aposentado, do servidor público ou da pessoa que tem FGTS para antecipar, sem precisar ir a um correspondente bancário ou uma agência, conta muito.
Na minha visão, nós estamos fazendo um bom trabalho nesse aspecto, tanto que quando comparamos a nossa carteira de crédito de consignado do 1T22 com o 1T24, nós temos um crescimento de 70%.
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