Ao dar posse ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva como ministro-chefe da Casa Civil, a presidente Dilma Rousseff criticou hoje as interceptações de conversas telefônicas entre os dois, divulgadas ontem, e disse que pedirá a apuração dos fatos.
– Convulsionar a sociedade brasileira em cima de inverdades, de métodos escusos, de práticas criticáveis viola princípios e garantias constitucionais, viola direitos dos cidadãos e abre precedentes gravíssimos: os golpes começam assim.
Dilma repudiou as versões divulgadas das escutas telefônicas com conversas entre ela e Lula.
– Estaremos avaliando as condições deste grampo que envolve a Presidência da República. Queremos saber quem autorizou e por que o autorizou, e por que foi divulgado porque não continha nada que possa levantar qualquer suspeita sobre seu caráter republicano. Investigações baseadas em grampos ilegais não favorecem a democracia. Quando isso acontece, fica nítida a tentativa de ultrapassar o limite do Estado Democrático de Direito, de cruzar a fronteira que é tão cara para nós que a construímos: a fronteira com o estado de exceção. Estamos diante de um fato grave: uma agressão não à minha pessoa, mas uma agressão à cidadania, à democracia e à nossa Constituição.
O juiz federal Sérgio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava Jato, divulgou ontem à tarde o teor desta e de outras conversas do ex-presidente, que teve suas ligações telefônicas interceptadas pela Polícia Federal. Às 13h32, Dilma ligou para Lula a fim de avisá-lo de que um funcionário do Planalto estava levando até ele o documento com o termo de posse, para ser utilizado “em caso de necessidade”.
Conforme as interceptações, a presidente diz ao novo ministro da Casa Civil:
– Eu tô mandando o “bessias” junto com o papel pra gente ter ele, e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse, tá?!
O Palácio do Planalto negou que a assinatura do termo de posse do ex-presidente Lula como ministro-chefe da Casa Civil tenha sido antecipada para garantir a ele foro privilegiado de modo imediato.
De acordo com a Secom, Lula poderia não comparecer à cerimônia de posse marcada para esta quinta-feira. Por este motivo, explicou, o termo de posse foi enviado para que Lula assinasse e fosse devolvido à Casa Civil. O Planalto, no comunicado, esclarece então que a expressão “pra gente ter ele”, utilizada por Dilma, se refere à necessidade que havia de o governo ter o documento caso Lula não comparecesse à posse. Informa ainda que o trecho “só usa em caso de necessidade” faz referência à possibilidade de “o governo usar” o termo de posse.
Segundo a Secom, a divulgação do telefonema foi feita “ilegalmente” por decisão da Justiça Federal do Paraná.
– Em que pese o teor absolutamente republicano do diálogo que tive com o ex-presidente Lula, ele foi publicizado com uma interpretação desvirtuada. Mudaram tempos de verbo, mudaram “gente” para “ele”, ocultaram que o que fomos buscar no aeroporto era a assinatura do presidente Lula, mas não tem a minha assinatura. Portanto, isto não é posse. A posse ocorreria aqui – afirmou Dilma durante o discurso da cerimônia de posse de Lula.
Dilma voltou a criticar o vazamento seletivo de informações.
– Não há justiça quando delações são tornadas públicas de forma seletiva para execração de alguns investigados e quando depoimentos são transformados em fatos espetaculares. Não há justiça para os cidadãos quando as garantias constitucionais da própria Presidência da República são violadas. Se se fere prerrogativas da Presidência da República, o que farão com as prerrogativas dos cidadãos? – questionou.
A presidente também criticou a oposição, que, segundo ela, desde a eleição em 2014, tenta paralisar o governo.
– A oposição tenta me impedir de governar ou me tirar o mandato de forma golpista. Nós temos de superar os ódios e a atuação daqueles que não estão do lado da verdade e não terão força política para provocar o caos e a convulsão social. A gritaria dos golpistas não vai me tirar do rumo e não vai colocar o nosso povo de joelhos.
PT reage à decisão da Justiça que anula nomeação de Lula
Minutos depois da divulgação da decisão da Justiça que suspende a nomeação de Luiz Inácio Lula da Silva para o cargo de ministro-chefe da Casa Civil, o vice-líder do PT na Câmara, Henrique Fontana (RS), classificou o fato como “boataria” e disse que não são juízes de primeira instância que escolhem ministros.
-Quem tem a prerrogativa de ministros é a presidente da República e para chegar à Presidência da República é preciso os votos da maioria dos brasileiros – afirmou.
Fontana, que participou da cerimônia de posse de Lula, disse ainda estar absolutamente seguro da legalidade da posse.
– Neste momento, ele é o chefe da Casa Civil e pode estar assinando atos neste momento. Ele goza de todos os direitos constitucionais. Será um excelente ministro e vai contribuir muito para o governo e enfrentar este momento de golpe – completou.
Fontana alertou que o momento do país exige “muito equilíbrio” e afirmou que a convulsão social que, segundo ele, estimulada pela oposição, “é extremamente negativa para o país”.
A oposição reagiu. O líder do PPS, Rubens Bueno (PR) comemorou a decisão da Justiça. “Este país tem leis que não podem ser afrontadas.”
Durante toda a manhã, o clima na Câmara dos Deputados foi de apreensão. As bancadas partidárias passaram as últimas horas reunidas, escolhendo os nomes de deputados que vão integrar a comissão especial que vai analisar o impeachment de Dilma. O presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), estendeu o prazo para entrega destes nomes do meio-dia para as 13h. A expectativa é que a comissão seja instalada por volta das 17h, com escolha de presidente e relator do colegiado.
As manifestações ainda não chegaram às portas do Legislativo hoje, mas os protestos e confrontos que ocorrem na Praça dos Três Poderes, atrás do prédio do Congresso Nacional, acabaram com o lançamento de bombas de gás lacrimogênio que alcançaram a parte interna do Salão Verde, provocando mal-estar. Uma jornalista teve que ser atendida pela Brigada após sofrer uma intensa falta de ar.
Partidos definem nomes que vão compor a comissão do pedido de impeachment
A comissão que analisará o pedido de impeachment da presidente Dilma Rousseff definiu alguns dos integrantes que vão integrar o colegiado. Em reunião na manhã de hoje, o PSDB, DEM, PSD, PR, Solidariedade, PT e o PSB chegaram aos nomes que vão compor a comissão.
Com menos polêmicas internas, o PSDB confirmou os nomes que já tinham sido indicados: Carlos Sampaio (SP), líder do partido na Casa, Bruno Covas (SP), Nilson Leitão (MT), Paulo Abi-Ackel (MG), Valdir Rossoni (PR) e Shéridan (RR). O DEM também confirmou os nomes de Mendonça Filho (PE), Rodrigo Maia (RJ) e Elmar Nascimento (BA).
Na mesma linha, o PSB confirmou nomes que estavam na lista apresentada no ano passado, quando a comissão chegou a ser eleita e anulada por questionamentos em torno das chapas avulsas, não indicadas pelos líderes. Pelo PSB, estão os deputados Bebeto (BA), Tadeu Alencar (CE), Danilo Fortes (CE) e Fernando Bezerra (PE).
O PR confirmou os nomes de Maurício Quintella (PR-AL), Aelton Freitas (PR-MG), Édio Lopes (RR) e Zenaide Maia (RN).
O Solidariedade confirmou Paulinho da Força (SP), Fernando Franscichini (PR).
O PT confirmou José Geraldo (PA), Pepe Vargas (RS), Arlindo Chinaglia (SP), Henrique Fontana (RS), José Mentor (SP), Paulo Teixeira (SP), Vicente Candido (SP), Wadih Damous (RJ).
A liderança do PSD informou que o líder Rogério Rosso (DF) junto com os deputados Júlio César (PI), Paulo Magalhães (BA) e Marcos Montes (MG) serão membros titulares da Comissão.
A comissão será formada por 65 deputados titulares e outros 65 suplentes indicados pelos respectivos líderes das bancadas, de acordo com o tamanho dos partidos na Câmara. Com a janela partidária que permite até amanhã a troca de legendas, sem sanções para os parlamentares, a Mesa Diretora da Casa redistribuiu o número de vagas.
Para evitar questionamentos jurídicos, a redistribuição foi feita entre todos os partidos, evitando que uma vaga de partidos que perderam a representação na Câmara, como PNM e PTC, que estão sem deputados, ficasse dentro do bloco do qual participavam. Para ser eleita, a chapa precisará da maioria simples dos votos, desde que votem no mínimo 257 deputados
PSB vai ao Supremo para anular posse
O Partido Socialista Brasileiro (PSB) protocolou hoje no Supremo Tribunal Federal uma ação na qual pede que o decreto presidencial que nomeou o ex-presidente Lula como ministro da Casa Civil tenha seus efeitos e vigência suspensos. Solicita, ainda, que caso a posse ocorra, que os seus efeitos sejam suspensos. O decreto foi publicado ontem numa edição extra do Diário Oficial da União.
O PSB também quer que, apesar da nomeação de Lula, as investigações referentes ao ex-presidente permaneçam em Curitiba. “Em assim não sendo, ainda liminarmente, seja impedido que a nomeação de Luiz Inácio Lula da Silva ao cargo de Ministro de Estado Chefe da Casa Civil produza qualquer efeito que altere o juízo natural da 13ª Vara Federal de Curitiba/PR quanto às investigações referentes ao ex-Presidente”, diz o texto.
A legenda deseja que a ação seja julgada procedente e que o decreto de nomeação seja declarado inconstitucional. A relatoria da ação no STF é do ministro Teori Zavaski, do STF.
Ontem, o juiz federal Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal, em Curitiba, determinou que a investigação que envolve o ex-presidente Lula no âmbito da Operação Lava Jato fosse remetida ao STF. A decisão foi tomada após a indicação de Lula como ministro da Casa Civil. Por assumir o cargo, o ex-presidente terá foro por prerrogativa de função e responderá às acusações no STF e não mais na primeira instância da Justiça Federal.
Na ação, o PSB alega que o decreto presidencial significa uma ofensa a preceitos. “O ato impugnado representa grave ofensa aos preceitos fundamentais do juiz natural, da separação dos poderes e do devido processo legal, na medida em que revela utilização da prerrogativa da Presidente da República de nomear Ministro de Estado com intuito de burlar o sistema de repartição constitucional de competências, subvertendo assim os princípios basilares da República, conforme será demonstrado a seguir.”
E prossegue: “O ato impugnado nesta ação constitucional, consubstanciado na nomeação do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao cargo de Ministro de Estado Chefe da Casa Civil, tem como nítido objetivo se valer da prerrogativa de foro inerente ao cargo público mencionado para manipular circunstância particular e pessoal do indivíduo que o exercerá – o que configura evidente desvio de finalidade.”diz a ação.
O PSB destaca, ainda, as gravações divulgadas ontem. O juiz Sérgio Moro tornou públicas conversas do ex-presidente, que teve suas ligações telefônicas interceptadas pela Polícia Federal. Às 13h32 de ontem, Dilma ligou para Lula avisando-o que um funcionário do Planalto estava levando até ele documento com o termo de posse, para ser utilizado “em caso de necessidade”. O partido destaca também a alteração na data da posse. “Causa, ainda, enorme espanto o fato da posse, que estava publicamente marcada para a próxima terça-feira, ter sido repentinamente antecipada para a data de amanhã (dia 17), diante da possibilidade de qualquer medida coercitiva”.
A ação menciona, ainda, que o ex-presidente foi citado na delação premiada do senador Delcídio do Amaral, homologada esta semana pelo STF. “Tais episódios – que, frise-se, não são os únicos – já são suficientes para demonstrar que os supostos “casos de necessidade” que justificariam a utilização do termo de posse mencionado na ligação, estariam voltados a impedir quaisquer outros atos advindos daquele juízo”, afirma o PSB.
O partido diz que não questiona o direito que a presidente tem de nomear seus ministros de estado. “O que se questiona é a utilização de um direito para atingir fins outros que não os constitucionalmente permitidos (in casu, impedir o exercício da jurisdição pelo juízo competente).”
ACP repudia manobra com nomeação de Lula
Em nota, a Associação Comercial do Paraná (ACP) vem a público mostrar sua indignação com a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para o cargo de ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República, fato que constitui gravíssima afronta à sociedade e ao Poder Judiciário.
Com informações da Agência Brasil, citando a Lusa