O artigo 38 do atual Código Florestal (Lei 12.651/2012) reproduz o art. 27 do Código Florestal revogado (Lei 4.771/1965), que estabelecia a proibição de uso de fogo em vegetação, salvo se peculiaridades locais ou regionais o justificassem e desde que houvesse permissão do poder público e normas de precaução.
A queima de vegetação em função de atividade agrícola constitui exceção prevista pelo legislador ordinário, que chamou a si a tarefa de harmonizar a propriedade privada com o meio ambiente.
No âmbito do STF, foi reconhecida a repercussão geral do Recurso Extraordinário 586224/SP, que tinha por objetivo decretar a inconstitucionalidade de uma lei municipal que proibiu queimadas em palha de cana-de-açúcar no Município de Paulínia, interior do Estado de São Paulo.
Em audiência pública, técnicos de diversos setores explicitaram os problemas gerados pelo processo de automação, tais como: perda de postos de trabalho para os rurícolas; diminuição do plantio de cana, pelo desestímulo ao produtor rural diante dos altos custos de maquinário; impossibilidade de mecanização em pequenas propriedades e em áreas com declives; e impossibilidade de mudança sem um período de transição.
Por outro lado, foram destacados os problemas relativos ao meio ambiente e à saúde da comunidade, que sofre com a inalação da fumaça e com o processo de desertificação decorrente das “queimadas”. Na oportunidade, levantou-se o problema acerca do fator dissuasivo na comunidade internacional para a aceitação do etanol proveniente da queima de palha de cana-de-açúcar.
A tese em discussão envolveu a legislação supletiva do Município, prevista no art. 30, I e II, da CF88, sobre o tema de meio ambiente, que dispôs acerca da proibição de queima de palha de cana-de-açúcar, impondo a mecanização imediata das lavouras.
Apesar de reconhecida a competência concorrente formal e material do Município para legislar sobre meio ambiente, no que tange a assuntos de interesse local, no julgamento final, ocorrido em março de 2015, foi declarada, por maioria de votos, a inconstitucionalidade formal da lei municipal em questão, uma vez que leis estadual e federal, ainda que editadas posteriormente, já dispunham acerca da eliminação gradativa da queima de palha de cana-de-açúcar.
O voto do ministro relator, Luiz Fux, ressaltou que as normas sobre o assunto, inclusive o art. 40 do Código Florestal vigente, apontam a necessidade de um planejamento para a colheita de cana-de-açúcar.
É possível constatar que as soluções adotadas nos litígios privados envolvendo o meio ambiente guiavam-se, anos atrás, pelo propósito de desenvolver e fortalecer a economia capitalista. Com o passar do tempo, o legislador procurou cada vez mais conciliar a proteção da propriedade ou o interesse econômico com o meio ambiente.
Com as mudanças climáticas impondo períodos cada vez mais longos de estiagem, cabe aos possuidores rurais, por dever de prevenção, interromperem imediatamente o uso de fogo em lavouras ou em qualquer outra atividade, como queima de lixo ou preparo de solo para novas plantações. À população em geral, cabe proteger o entorno de sua propriedade, desestimulando qualquer prática de ateamento de fogo, considerado um ato criminoso pelo Código Penal em diversas situações.
As responsabilidades não se circunscrevem a prejuízos pessoais, mas a toda a população, que sofre com as inúmeras consequências do fogo descontrolado. Em muitos casos, vidas se perdem e o meio ambiente não poderá se recompor.