Em que sociedade você quer envelhecer?

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Idosos (Foto: ABr/arquivo)
Idosos (Foto: ABr/arquivo)

Parece que o tema longevidade e envelhecimento estão na moda. Entretanto, o nosso apelo aqui não visa os holofotes para as palavras de busca com maior número, e sim, gerar de fato uma sensibilização sobre uma realidade que vem se construindo sem que se faça o necessário para transformá-la.

Vivemos em um contexto em que se corre a todo instante atrás da produtividade e do hiperconsumo, como se esta fosse a atitude correta no inconsciente coletivo. Essa angústia que é gerada por ter que se fazer mais e melhor a todo instante é típica do capitalismo em que vivemos e é o que nos faz sentir a sensação de falta de dias suficientes para se fazer o que se pretende. Chegamos ao cúmulo de nos sentirmos culpados quando paramos um pouco para descansar, como se as horas de descanso significasse que somos inúteis e dispensáveis.

Por incrível que pareça, mesmo diante dessa insanidade, conseguimos avançar tanto com a tecnologia e a medicina que hoje temos condições de estender bastante a expectativa de vida humana, podendo o homem chegar a idades bem avançadas com melhor saúde.

Não parece algo maravilhoso poder curtir a terceira idade cada vez mais longa e com bem estar e qualidade de vida? Conviver por mais tempo com nossos familiares e amigos; curtir mais a vida após a aposentadoria, já que os filhos nessa fase já estão criados; viajar e conhecer o mundo, já que a vida financeira já estaria estabilizada nessa fase; enfim, poder fazer tudo aquilo que sempre quisemos e que ainda não tínhamos tempo de pôr em prática!

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Só que não é assim que a coisa acontece! Aqui pelos cantos do Brasil a realidade é bem diferente. A verdade crua é a seguinte: aos 45 anos, aproximadamente, por mais qualificado e experiente que você seja, você é demitido por discriminação etária. Sim. Existem inúmeras justificativas para camuflar o ageismo, que nada mais é do que um preconceito baseado em estereótipos já caídos por terra por pesquisas científicas. Considerados resistentes, não inovadores, não tecnológicos, não adaptativos e muito mais, a pessoa na maturidade é obrigada a sair de seus empregos e, não consegue mais se reinserir no mundo corporativo. Muitas partem para o empreendedorismo por necessidade.

Não bastasse isso, não serem produtivos nessa sociedade capitalista, sem função, passam de altos executivos, muitas vezes, a seres invisíveis na sociedade. Sem um trabalho qualificado, não conseguem fazer o que tanto sonharam, muitas vezes usam a reserva financeira para sobreviverem e, até mesmo, para ajudarem seus filhos, já na maturidade, a sustentarem suas famílias.

Diante da não produtividade e, por que não dizer, da “inutilidade” e “invisibilidade”, passam a diminuir cada vez mais seus luxos e acabam, muitas vezes, sem terem planos de saúde, comprometendo e muito sua saúde.

Em paralelo a essas questões, o cenário social não enxerga os idosos como consumidores e, apesar das estatísticas mostrarem que manuseiam vários milhões de reais, não se sentem atendidos pelo Marketing das empresas e vivem de produtos que não possuem design e adaptações adequadas para suas necessidades.

As ações políticas neste país parecem desconhecer essa realidade, da qual enumeramos apenas alguns aspectos. Incentivos empresariais também parecem não caminhar ao encontro dessas necessidades da terceira idade e todo o modismo de se falar em envelhecimento se reverte apenas em varias vagas de emprego para subfunções dentro das organizações, mas que já contabilizam vagas para um grupo marginalizado e enaltecem, pelo menos em aparência, a responsabilidade social da empresa.

Quando será que vamos acordar para o fato de que nós também estaremos na terceira idade um dia? Será que nem isso sensibiliza a população? Se não conseguimos tomar atitudes visando o bem estar social, que seja pelo menos pelo fato de que a pirâmide etária está se invertendo e teremos mais idosos do que jovens em um futuro bem próximo. E nós seremos eles a curto prazo!

Enxergar o idoso como um sujeito incapaz é um reflexo do mundo que temos hoje e suas exigências no que diz respeito à produção, consumo e supervalorização da juventude como forma de sustentar tal lógica de produção/consumo! Não parece transparente?

Diversas pesquisas demonstram que a mente não acompanha o envelhecimento corporal e que ela cria alternativas e mecanismos para lidar com o corpo menos favorecido pelo tempo, de uma forma adaptativa. Ser velho para os idosos tem sido relatado como parar de sonhar, amar, à falta de autonomia, à falta de energia, dentre outros detalhes já relatados em pesquisas. Nenhum dos idosos se sente velho.

É claro que a maneira como cada sujeito envelhece é única e passa pelo individual, mas passa pelo social também. Se não oferecermos melhor qualidade de vida, bem estar e inserção social, não teremos uma saúde integral para o idoso mesmo com os melhores remédios e sistemas de saúde!

Afinal, que envelhecimento queremos para nós?

Seguramente a resposta que cada um vai dar, temos certeza, será que queremos uma fase de liberdade, de recreação, de divertimento, de tempo livre para distrações, de tempo para novos aprendizados, momentos de qualidade com nossas famílias e amigos, saúde devidamente controlada, dentre outros objetivos mais.

Assim, por que não olhar para o envelhecimento como apenas mais uma fase da vida e que, como em todas as outras, teremos perdas e ganhos? Por que não pensamos em fornecer dignidade e respeito, no mínimo, aos idosos de hoje? Cabe a nós mesmos fazer a nossa parte de esforço para transformarmos o olhar que a população tem, inclusive os próprios idosos, sobre o que é envelhecer. Afinal, cada ser humano é muito mais que suas limitações. Que idoso você quer ser amanhã? E em que sociedade você quer envelhecer? Pensemos nisso!

 

Eliana Cristina Motta da Silva é idealizadora do Projeto Acalme Terapias Integradas.

4 COMENTÁRIOS

  1. Maravilhosa reflexão e extremamente abra gente na descrição do cenário
    Toca na ferida que a maioria prefere ignorar.
    Vamos juntos e firmes transformar essa realidade e promover a mudança cultural que nossos anciãos (e nós) necessitamos.

  2. Lúcida e bem fundamentada análise por parte de quem dedica boa parte do seu tempo a oferecer uma melhor qualidade de vida para o(a)s idoso(a)s através da Acalme Terapias Integradas

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