Empresas que geram e que não geram valor

Segundo Oscar Malvessi, as empresas deveriam buscar o lucro econômico para remunerar o custo de oportunidade dos seus acionistas.

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Oscar Mavessi (foto FGV)
Oscar Mavessi (foto FGV)

Conversamos sobre empresas que geram e que não geram valor com Oscar Malvessi, especialista de criação de valor e professor de finanças corporativas da FGV EAESP. Recentemente, Malvessi publicou o livro Como criar valor na sua empresa – Método VEC*.


De uma forma geral, as empresas brasileiras geram valor?

Do ponto de vista de estratégia de negócio, o caminho para que uma empresa crie valor é entender que, realmente, suas decisões de investimento, crescimento e competitividade no mercado criam valor. As empresas procuram entender isso, mas de uma maneira muito simplificada, o que pode representar riscos.

O que vemos no mercado são poucas empresas com boa valorização e com crescimento de resultado que suporte o custo de oportunidade do dinheiro investido pelos acionistas no negócio. Essa é a diferença para entendermos se uma empresa cria ou não valor.


Uma empresa que possui lucro contábil está gerando valor?

Como eu tenho estudado o comportamento das empresas brasileiras desde 2001, uma coisa que me chamou muito a atenção é que, incrivelmente, nós estamos na contra-mão desse entendimento. Da década de 1970 para cá, as empresas americanas tiveram que assumir uma nova metodologia através da qual elas não deveriam buscar apenas o lucro, mas sim o lucro econômico.

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O lucro econômico é quando uma empresa, gerencialmente, insere nas suas Demonstrações Financeiras (DFs) o custo de oportunidade do dinheiro do acionista, pois, por mais que o lucro contábil exista, a pergunta é se ele é suficiente para remunerá-lo. Historicamente, as empresas brasileiras remuneram seus acionistas de uma forma muito baixa.

Para que se possa responder se uma empresa cria ou não valor, seria preciso entender, corretamente, que o capital investido nela tem que dar resultado operacional, pagar o imposto de renda e pagar o custo de oportunidade.

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Como saber se uma empresa gera ou não valor?

Seria necessário reestruturar as DFs de uma empresa como se fosse fazer seu valuation. Para isso, é preciso entender, claramente, suas atividades operacionais e a qualidade dos seus resultados. Se a empresa tiver tudo isso alinhado, ela vai gerar um bom fluxo de caixa futuro, que quando trazido a valor presente, vai pagar o custo de oportunidade e as despesas financeiras, ou seja, o custo de capital.

É preciso fazer isso para que se possa responder algumas perguntas: a empresa gera, efetivamente, caixa operacional? Ela consegue ter um retorno que remunere o custo de oportunidade do negócio como um todo, e não somente da despesa financeira? Ela gera fluxo de caixa para bancar os novos investimentos? Quanto ela precisa buscar de capital de terceiros e de capital próprio? Em quanto tempo a geração de caixa e o retorno começam a acontecer?

Com isso, é possível medir, claramente, se a empresa tem lucro econômico. Nesse caso, trata-se de uma empresa diferenciada, mais valorizada e que cria riqueza. Essa é a grande lógica do conceito e da metodologia de criação de valor que eu uso e que as grandes empresas, bem geridas, também usam.


Quais são as principais características de uma empresa que gera valor?

Essa empresa administra, de forma consistente, seus ativos operacionais para que eles gerem resultado operacional crescente e compatível. Dessa forma, nós temos uma medida de eficiência operacional, pois se a empresa é operacionalmente eficiente, ela dá retorno econômico. Caso isso não aconteça, ela precisa buscar métodos, fórmulas e processos para modificar suas unidades operacionais de forma a que elas contribuam para o negócio como um todo.

Outro detalhe: não é só crescer. A empresa precisa crescer com resultados operacionais mais do que proporcionais, senão a eficiência operacional se transforma em deficiência operacional, pois existe o custo do capital do negócio. Se não houver cuidado com as métricas e com os indicadores, você pode estar sendo iludido com a qualidade de resultado de uma empresa. Isso acontece quando se usa conceitos muito antigos e tradicionais, que vêm das décadas de 1940 e 1950, e que ainda são ensinados e utilizados por muitas empresas.

O último detalhe, tão importante quanto os outros, é que uma empresa somente deveria remunerar os executivos de forma variável se ela consegue remunerar antes o custo do capital do negócio. Se isso não for feito, os executivos serão remunerados apesar da empresa apresentar resultados cada vez menores.

Se a empresa não mede, corretamente, seus resultados no sentido econômico, o lucro acaba sendo um pedaço do lucro que a empresa deveria ter. Quando se paga remuneração variável em cima do lucro contábil ou do EBITDA, a empresa, com certeza, está sendo penalizada e desvalorizada.


Quais são as principais características de uma empresa que não gera valor?

Num primeiro instante, um investimento feito por uma empresa que não gera valor pode ter valor presente líquido positivo, mas como ela não o analisa periodicamente, ela não tem como saber se ele ainda tem o retorno previsto no início. Cabe ressaltar que uma empresa investe, todos os anos, em novos projetos para que eles aumentem o seu tamanho através do crescimento do resultado. 

A grande questão é que nas análises que eu tenho publicado dos últimos 10 anos, grande parte das empresas não possuem resultados operacionais mais do que proporcionais. Se elas não analisam isso de forma coerente, elas estão sendo vistas como parcialmente boas, quando na realidade isso não está acontecendo, tanto que o valor das suas ações não reagem.

É preciso entender com profundidade e critérios técnicos o que é o custo do capital investido numa empresa. Se não houver substância de análise econômica, não haverá resultado. É isso que eu tenho visto, historicamente, nas empresas brasileiras. No meu livro, eu falo da qualidade de resultados das empresas de 2012 a 2021, que precisa muito ser melhorada.


Por que a não geração de valor das empresas brasileiras não é debatida no Brasil?

As empresas brasileiras não dão a mesma atenção à geração de valor que se dá nos países desenvolvidos, talvez por uma diferença de competitividade. Por exemplo, nos Estados Unidos, se uma empresa não remunera o acionista, ele não pensa duas vezes e vende a empresa. Lá, o processo de fusões e aquisições é muito ativo, pois se a empresa não desempenhar, adeus. Ou ela quebra ou ela é comprada. O mercado americano é muito ágil e muito rápido. Aqui, existe um crescimento nas operações de fusões e aquisições, que vai aumentar ainda mais. Se isso não acontecer, as empresas brasileiras serão compradas a preços vis.

O conceito de criação de valor não é amplo, e sim específico. Eu diria que apenas 10% dos livros de finanças falam sobre a metodologia de criação de valor, sendo que os outros 90% falam de coisas do passado. Se a empresa utilizar um valuation gerencial, onde todos os decisores estarão numa mesma frequência e linguagem, ela vai buscar caminhos para reverter situações deficitárias em pontos de criação de valor.

*Valor Econômico Criado.

Atualizado em 06/10/2023, às 18:49

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