Endividamento das famílias recua pelo segundo mês consecutivo, diz CNC

Segundo entidade, inadimplência está no mesmo patamar há três meses; para especialista, mercado de apostas pode gerar aumento de inadimplência a médio prazo

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Carteira com cartões de crédito (Foto; Wilson Dias/ABr)
Carteira com cartões de crédito (Foto; Wilson Dias/ABr)

Pelo segundo mês consecutivo, a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), realizada mensalmente pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), registrou queda do endividamento das famílias brasileiras. O percentual de famílias que relataram ter dívidas a vencer diminuiu para 78% em agosto de 2024, abaixo dos 78,5% observados em julho, mas ainda superior ao índice de 77,4% registrado em agosto do ano passado. Esse resultado reflete uma cautela crescente das famílias em relação ao uso do crédito. Apesar dessa redução do endividamento geral, o número de famílias que se consideram “muito endividadas” aumentou para 16,8%.

O presidente do Sistema CNC-Sesc-Senac, José Roberto Tadros, comenta que o comportamento recente do endividamento está diretamente ligado ao cenário macroeconômico.

“O resultado do PIB, que apontou um crescimento de 1,4% no segundo trimestre, superou as expectativas, mas também revelou um ambiente econômico ainda desafiador. O alívio do endividamento é positivo, mas precisamos considerar que os juros elevados e a recuperação econômica lenta ainda geram incertezas para as famílias brasileiras. Uma possível retração no consumo pode afetar a retomada do crescimento”, ressalta Tadros.

No que diz respeito à inadimplência, o percentual de famílias com dívidas em atraso se manteve estável em 28,8% pelo terceiro mês consecutivo, permanecendo ligeiramente abaixo do registrado em agosto de 2023. No entanto, o percentual de famílias que não terão condições de pagar suas dívidas atrasadas subiu para 12,1%, um indicativo de que, mesmo com a estabilização no número de contas em atraso, as dificuldades financeiras permanecem. Além disso, o percentual de dívidas em atraso há mais de 90 dias aumentou para 48,6%, o maior desde março de 2020.

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O economista-chefe da CNC, Felipe Tavares, observa que, embora o endividamento esteja em queda, o comprometimento da renda das famílias com o pagamento de dívidas ainda é elevado. “O percentual médio de comprometimento da renda foi de 29,6% em agosto, demonstrando que as famílias estão buscando manter suas finanças sob controle, mas precisam alongar os prazos e lidar com juros altos, o que complica a situação”, explica Tavares.

O percentual de famílias com mais da metade da renda comprometida com dívidas atingiu 19,9%, o maior desde junho deste ano. As projeções da CNC indicam que o endividamento deve voltar a subir no último trimestre do ano, acompanhando um aumento gradativo da inadimplência, que poderá atingir 29,5% até dezembro.

Nas modalidades de crédito, o cartão de crédito continua liderando com 85,7% de participação entre os devedores, apesar de uma retração de 0,4 p.p. em comparação ao mês anterior. O crédito pessoal destacou-se com um aumento de 0,5 p.p. em relação a julho e 1,8 p.p. na comparação anual, refletindo as recentes reduções das taxas de juros dessa modalidade.

O Rio Grande do Sul, afetado por enchentes em maio, vem apresentando um aumento contínuo do endividamento, que alcançou 92,9% em agosto, o maior percentual desde outubro de 2023. Com isso, o estado registrou 39,1% de famílias endividadas com contas em atraso, o maior índice desde dezembro de 2023, e 3,7% sem condições de quitá-las, o mais alto desde agosto de 2021.

Já de acordo com especialistas da Recovery, empresa do Grupo Itaú, o crescimento acelerado das bets traz preocupações em relação à saúde financeira dos brasileiros e possibilidade de aumento de inadimplência em cartão de crédito.

Pesquisa do banco Itaú estima que brasileiros e brasileiras perderam quase R$ 24 bilhões em jogos e apostas online em um ano, fator este que pode aumentar o índice de endividamento das famílias brasileiras, que segundo a CNC, já atingiu 78,8% em maio, sendo o terceiro mês seguido de crescimento.

“As bets oferecem uma forma de entretenimento, associada à promessa de ganhos financeiros rápidos. No entanto, é muito importante entender que essas plataformas não devem ser vistas como uma fonte de investimento ou renda extra, pois fazer apostas carrega um risco altíssimo de perda de dinheiro. Pode acontecer dos apostadores se deixarem levar pela emoção de uma possível vitória, mas vale sempre lembrar que, para cada grande vencedor, há milhares de pessoas que perdem quantias significativas. Essa realidade pode levar os brasileiros ao endividamento, especialmente quando as apostas começam a ser feitas de forma compulsiva. Além disso, estamos mensurando o impacto dessas apostas no bolso do cliente, o que evidencia ainda mais a necessidade de conscientização sobre os riscos financeiros envolvidos”, alerta Bruno Russo Franco, diretor da Recovery.

Ainda segundo o levantamento, o impacto das apostas online ainda será percebido no mercado de cessão de dívidas em atraso.

“As plataformas de apostas costumam aceitar cartões de crédito ou Pix como meio de pagamento e existe a possibilidade de que mercado de apostas influencie a inadimplência no país a partir do ano que vem”, relata o especialista.

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