Enlarge your PIB

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O convite, tão frequente nos anúncios comerciais na internet, “Enlarge your…”, bem poderia ser estendido ao PIB. Só que o tamanho do PIB, medida da soma de toda a produção final de bens (setores primário e secundário da economia de um país) e serviços (setor terciário), já não é uma medida tão reveladora assim.

Dos ricos anos 1960 para cá (ricos em questionamentos, sobretudo), uma nuvem crítica começou a gotejar dúvidas sobre a possibilidade da economia crescer indefinidamente ou sem um alto custo social e ambiental.

Um dos ícones destes questionamentos é o Clube de Roma, fundado em 7 de abril de 1968, pelo cientista escocês Alexander King e pelo industrial italiano Aurelio Peccei (ex-dirigente dos grupos Fiat, Olivetti e Italconsult), com o propósito de discutir as consequências do uso de recursos naturais escassos como se fossem abundantes ou mesmo infinitos.

Um dos momentos mais importantes do Clube de Roma ocorreu quando, em 1972, publicou o relatório “Limites do Crescimento”, baseado em modelos matemáticos, encomendado pelo grupo de pesquisadores liderado por Dennis Meadows ao Massachusetts Institute of Technology (MIT), sobre o uso nas políticas públicas do conceito de desenvolvimento sustentável, sempre com ênfase na alternativa de se prevenir a exaustão dos recursos finitos (clubofrome.org).

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Com isso, a expectativa com os anúncios de aumento maior ou menor do PIB fica submetida a um enfoque em que, nem sempre, uma taxa de crescimento muito alta é boa notícia. Sobretudo para as futuras gerações que, no Brasil, têm assegurado o direito ao meio ambiente na Constituição Federal.

Revela também como a ciência econômica caducou, desde o século XVIII, quando Adam Smith publicou o quase ingênuo Riqueza das Nações. Em um filme de animação com o Rei Leão há mais maldades do mundo do que na obra seminal de Smith.

A Ciência Econômica tradicional ainda trata o crescimento do PIB como sendo de possibilidades indeterminadas, bastando para obtê-lo de disponibilidade de poupança, uma parte não consumida da renda, que pode ser viabilizada com mais facilidade junto aos detentores de maiores parcelas da renda e da riqueza nacionais, fazendo assim com que a poupança necessária ao crescimento seja obtida através da indução de mais concentração e desigualdade consentidas. É exemplo disso a indução de sistemas tributários como o do Brasil e o dos EUA, que são inclementes com a base da pirâmide social, muito mais oneradas por tributos do que o topo da pirâmide.

A Ciência Econômica nada diz sobre a possibilidade de disposição no ambiente do que é produzido ou refugado, nem sobre o esgotamento de recursos naturais não renováveis. Até manuais de Economia escritos na segunda metade do século passado por professores de importantes universidades norte-americanas, laureados com Prêmio Nobel, falam da água como exemplo de bem livre (os que podem ser obtidos sem correspondente renúncia de produção de outros bens).

Nada diz também sobre dificuldades impostas, por interesses próprios, visando à aceleração do autocrescimento, à livre circulação dos fluxos internacionais de pessoas, de bens e financeiros, impedindo-os de se beneficiarem de novas possíveis vantagens comparativas locacionais, como se verifica agora, através do pretexto de prevenir uma pandemia do coronavírus, pelos EUA, no cerco oportunista, com o propósito de sufocar a economia chinesa.

Nada diz ainda sobre a oferta de trabalho, fator de produção, explicada pelo nível de salários, tão mais atraentes quanto piores forem as condições de trabalho, a exemplo da uberização provocada pela reforma trabalhista levada a efeito no Brasil pela Lei 13.467/2017.

Nada diz, finalmente, sobre a superexploração do trabalhador, a partir do entendimento de que a remuneração do trabalho corresponde ao que é por ele oferecido à produção (salários deveriam corresponder à produtividade marginal do trabalho).

 

A CF88 diz assim

Título VIII – Da Ordem Social; Capítulo VI – Do Meio Ambiente.

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

(…)

 

Tamanho é documento?

O crescimento do PIB não deve, portanto, ser tratado como um fetiche, que nem naqueles comerciais da internet, pois o mais importante não é o tamanho do PIB, mas o uso que dele se faz. Crescer sem gerar mais desigualdades, sem subtrair o que a natureza não é capaz de repor, sem ser excludente. Crescer com ética, ou seja, desenvolver-se, com o aperfeiçoamento democrático das instituições e o vigor pleno das universidades e dos centros de pesquisa.

 

Paulo Márcio de Mello é professor aposentado da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

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