“A reforma tributária levará ao aumento de preços de quase 600 mil itens, entre produtos e serviços, e impactará empresas fornecedoras enquadradas no Simples Nacional. Além disso, a alíquota do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual – constituído pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) – pode chegar a 30,3%, acima dos 26,5% até então divulgados.”
O alerta vem do advogado tributarista Lucas Ribeiro, fundador e CEO da Roit, que destaca pontos importantes que, até então, passavam despercebidos.
O estudo apresentado por Ribeiro se fundamenta em ampla base de dados da própria Roit, especializada em atender empresas de várias atividades econômicas enquadradas, principalmente, no regime Lucro Real, com obrigações acessórias do Sistema Público de Escrituração Digital (Sped), da Receita Federal e documentos fiscais. Foram compiladas as informações de 837 empresas de todo o país, que juntas faturam R$ 470 bilhões ao ano.
O especialista explica que a análise do impacto da reforma tributária deve se voltar cuidadosamente para o recálculo dos preços de compra de mercadorias, serviços e outros itens hoje não tributados, como é o caso do comodato, da locação de bens móveis e imóveis, dos empréstimos tomados, entre diversos outros.
“Até os pontos de programas de fidelidade serão tributados”, discorre o especialista.
O cálculo precisa considerar os tributos incidentes em toda a cadeia, para que só então inserir os novos tributos. A partir dessa recomposição é que se torna possível definir os novos preços de venda, para garantir que a margem não seja comprometida com o novo sistema. Essa é uma das razões pela qual uma empresa não pode se pautar pela mudança das alíquotas e precisa se atentar para a mudança de preços, item a item, desde já. Ribeiro constata que, em muitos casos, as empresas estão interpretando a reforma tributária de maneira equivocada, preocupadas com a alíquota, quando deveriam se preocupar com a base de cálculo, que será muito mais ampla.
Nesse sentido, o levantamento identifica quase 600 mil itens (584 mil, para ser exato) que precisarão sofrer aumento. São produtos e serviços dos mais variados tipos. Já por parte do Fisco, para não haver perda de arrecadação, Ribeiro adverte que é impossível, nas condições postas, que a alíquota do IVA dual seja de fato apenas 26,5%, considerando o cenário dessas empresas analisadas.
“Para entendermos o impacto da reforma, precisamos ver a base de arrecadação. E o Projeto de Lei complementar 68/2024 tem 28 páginas e mais de 20 artigos para definir cálculo de ‘neutralidade’. É complexo projetar esse cálculo, sem estarmos em risco de uma majoração extrema de arrecadação entre 2027 e 2029.
Por isso, Ribeiro chama o IVA da reforma tributária de “Ivão”, com características que fogem ao conceito de imposto sobre valor adicionado aplicado no mundo.
“Ele, IVA, se identifica como simples, ele se diz neutro e tudo mais, mas ele pula Carnaval, ele come feijoada, bebe caipirinha… É um IVA muito diferente, é um IVA muito especial, é um IVA brasileiro, e nós temos que tomar todos os cuidados com ele.”
Outro aspecto que merece cuidado e vem sendo negligenciado é o impacto da reforma tributária sobre as empresas do Simples Nacional. Isso porque esse segmento se caracteriza como fornecedor e cliente de grandes empresas, inseridas no Lucro Real, cuja tributação passa a ser alterada, entre outros aspectos, pela geração de créditos tributários financeiros, ou seja, o crédito corresponderá apenas ao valor efetivamente recolhido. Ocorre que adquirir de empresas do Simples não resultará em geração de créditos integrais, reduzindo a competitividade dessas empresas.
Desse modo, as grandes companhias podem perder R$ 1 bilhão em créditos, por comprarem, atualmente, R$ 6,4 bilhões em bens e serviços. A fim de não arcar com essa perda, um risco é que as empresas do Lucro Real dispensem, então, fornecedores do Simples Nacional, o que seria um estrago para esse segmento.
A saída apontada é as empresas do Simples migrarem para o Regime Regular, com o IBS e a CBS apurados como se estivessem no Lucro Real, o que é complexo. “São 6 milhões de empresas no Simples Nacional, que não estão habituadas com a complexidade do regime tributário não cumulativo. Migrar exige sistemas, processos, cultura, conhecimento; exige investimentos”, argumenta o tributarista.
Destinado a regulamentar a gestão do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e outros aspectos da reforma tributária, o Projeto de Lei Complementar (PLP) 108/2024 será tema de audiência pública na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado na quarta.
Esse projeto é o segundo a ser apresentado com o objetivo de regulamentar a reforma tributária instituída pela Emenda Constitucional 132 – que foi promulgada em dezembro. Além de instituir o Comitê Gestor do IBS, a proposição também trata da transição do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) para o IBS; define a distribuição dos valores do novo tributo para os entes federados; e altera as normas do Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) e do Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis (ITBI).
O texto-base do PLP 108/2024 foi aprovado na Câmara dos Deputados em 13 de agosto. Após a votação dos destaques, a versão final do projeto será enviada à análise do Senado, onde já tramita o primeiro projeto de regulamentação da reforma tributária (o PLP 68/2024.)
Com informações da Agência Senado
Leia também:
Senado e Câmara abrem cúpula parlamentar do G20 nesta quinta
Evento reúne líderes parlamentares para debater soluções legislativas para questões globais urgentes
Proposta altera Lei de Saneamento Básico para incluir drenagem de águas pluviais
Texto estabelece que saneamento deve incluir água de chuva e resíduos sólidos; se não houver recurso no Plenário do Senado, segue para a Câmara
Projeto facilita compra de veículos para motoristas de app com uso do FGTS
Conselho definirá critérios adicionais e procedimentos de fiscalização; condutor deverá estar cadastrado em aplicativo há, pelo menos, seis meses
Senado vota regulamentação do mercado de crédito de carbono
Organizações sujeitas à regulação deverão fornecer um plano de monitoramento e relatórios de suas atividades ao órgão gestor
Reforma tributária deve reduzir 90% da judicialização de processos
Nesta terça, Rodrigo Pacheco, pediu o compromisso de parlamentares para que a regulamentação aconteça ainda neste ano
As eleições para as presidências da Câmara e do Senado
Segundo Publio Madruga, a eleição no Senado está praticamente definida. Falta a definição da Câmara, que passa pelo PSD de Gilberto Kassab.