Expectativa para a próxima reunião do Copom

Para Beto Saadia, mais importante que a confirmação da manutenção da Selic em 15%, é a mensagem que será passada pelo Copom no seu comunicado.

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Beto Saadia, economista-chefe da Nomos
Beto Saadia, economista-chefe da Nomos (foto divulgação)

Conversamos com Beto Saadia, economista-chefe da Nomos, sobre a sua expectativa para a próxima reunião do Copom, que será realizada nos dias 4 e 5 de novembro.

Qual a sua expectativa para a próxima reunião do Copom?

Como a manutenção da Selic em 15% está bem consolidada, tanto pelo mercado quanto pelos discursos, vou analisar o comunicado, que pode ter dois caminhos possíveis. O primeiro é o Copom abrir as portas para uma possível queda na reunião de dezembro. O segundo é o Copom manter as portas fechadas para uma possível queda na reunião de dezembro. Na minha visão, o Copom vai seguir pelo segundo caminho.

O Copom não deve reconhecer uma melhora contundente da inflação para 2027, que é o horizonte relevante, com um pequeno ajuste de 3,4% para 3,3%, e ainda deve manifestar uma preocupação em relação, especificamente, ao mercado de trabalho, que está muito aquecido. Além disso, é importante dizer que, no comunicado anterior, o Copom manteve as portas abertas para uma eventual alta. Obviamente, isso é muito improvável, mas é uma forma de mostrar rigidez. Provavelmente, o Copom vai reconhecer que a taxa de juros atual é suficiente para que a inflação convirja para meta, o primeiro passo para um afrouxamento monetário no futuro.

Se tivermos um comunicado mais dovish, ele deve seguir essa linha, algo que não aconteceu no comunicado anterior, que mostrou que o Copom ainda estava avaliando se o patamar atual era suficiente.

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A inflação já está sob controle?

De forma alguma, mas nós tivemos alguns avanços, sendo que grande parte desses avanços se deram por motivos alheios ao Brasil, como uma condição climática, um preço do petróleo e um câmbio favoráveis. Obviamente, a taxa de juros teve o seu papel, mas ele foi pequeno no contexto geral de desinflação, e quando nós temos uma desinflação causada por questões externas, isso significa que, se esses ventos mudarem, nós vamos ter um problema, o que é perigoso.

Outro ponto é que a desinflação só ocorreu mais recentemente, pois nós não tivemos mais do que três boas divulgações do IPCA, ou seja, essas leituras não mostram uma consistência, até porque não estamos sequer perto da meta. O que se pode comemorar, de alguma forma, é que entramos dentro do teto da banda da meta de inflação, que é 4,5%, sendo que, para o fechamento de 2025, nós devemos ficar abaixo desse teto.

O que está ditando o compasso de espera do Banco Central para que ele inicie o ciclo de baixa da Selic?

Sendo bem objetivo, o mercado de trabalho. Os números do último Caged mostraram uma desaceleração, mas ainda vieram fortes, mostrando que o mercado de trabalho está aquecido. Se analisarmos o cenário de inflação no Brasil, grande parte dos itens que estão com dificuldades relacionadas à inflação estão ligados à renda, como, principalmente, serviços. Essa é uma inflação mais teimosa, que, normalmente, é a última a ceder e não tem tanta correlação com a taxa de juros alta, que causa pouco impacto no setor de serviços.

Além disso, esse é um setor pouco suscetível a crédito. Recentemente, o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, reconheceu que o setor de serviços está desafogando, mas que ainda não mostrou uma desinflação suficiente para que a autoridade monetária baixasse a guarda.

Nós também temos a questão política e a aproximação de um ano eleitoral. Isso porque boa parte da inflação de serviços, da renda mais alta e do mercado de trabalho muito aquecido é causada por políticas de impulso fiscal, como crédito consignado privado, Auxílio Gás e a Tarifa Social de Energia Elétrica. Os próprios ajustes dos gastos obrigatórios têm sido muito fortes através do salário mínimo, tanto do previdenciário quanto do BPC (Benefício de Prestação Continuada). Por fim, existe um risco, maior ainda, da Reforma do Imposto de Renda causar outro impulso fiscal.

Se um mercado de trabalho aquecido e o aumento de renda seriam bons para a economia, qual é o problema da economia brasileira que faz com que isso se torne um problema?

Na nossa avaliação, o excesso de emprego que está sendo gerado agora vai ter que ser devolvido, de alguma forma, no longo prazo, pois, por mais que um desemprego muito baixo gere um crescimento do PIB, esse crescimento vem carregado de inflação. Com isso, para que a inflação volte a ficar na meta, o PIB vai ter que crescer menos no futuro, pois o seu crescimento está acima do seu potencial, o que não é saudável e sustentável. Isso porque não se trata de uma geração de emprego e de um crescimento de PIB de longo prazo.

Na sua avaliação, quais são os impactos gerados pela redução da taxa de juros nos Estados Unidos com a manutenção da taxa de juros no Brasil?

A queda de juros dos Estados Unidos promoveu, via câmbio, uma valorização bem contundente das moedas dos países emergentes, Brasil incluído, sendo que essa valorização do câmbio bateu direto na inflação de alimentos e de bens industriais.

Um ponto importante é que os Estados Unidos estão passando por uma mudança de percepção institucional do papel do Fed, pois está havendo uma influência muito grande da Casa Branca no comitê como um todo. No seu primeiro mandato, Trump falava como todo presidente fala, mas no seu segundo mandato, ele está conseguindo mexer algumas peças, pois a sua influência está ganhando um tom mais prático e pragmático. Por exemplo, Stephen Miran, que fazia parte do Council of Economic Advisors da Casa Branca, que é uma instituição que não tem similar no Brasil, pediu licença e foi eleito, em poucas semanas, diretor do Fed com assento no Fomc.

Outro ponto é que, recentemente, o secretário do Tesouro, Scott Bessent, lançou cinco candidatos à presidência do Fed, já que o mandato de Jerome Powell termina no primeiro trimestre de 2026. Na desconfortável percepção do mercado, é como se fosse, vamos dizer assim, uma competição, uma espécie de Big Brother.

Como deve acontecer a baixa da Selic em 2026?

Nós acreditamos que a queda da Selic vai começar em janeiro e que ela deve chegar ao final do ano em 12%. Por mais que a desinflação esteja acontecendo, ela está acontecendo de uma forma mais lenta do que o mercado estava esperando, principalmente por conta do componente de serviços, que deve ceder pouco por causa das políticas fiscais. Cabe ressaltar que o próximo ano vai ser muito parecido com 2022, quando o governo anterior também utilizou muitos impulsos fiscais. É por isso que nós vemos uma taxa de juros com dificuldade para cair tão forte como o mercado está esperando.

Para que haja uma queda mais contundente, é preciso que aconteça alguma coisa pelo lado fiscal que nos coloque em uma trajetória sustentável da dívida. Diga-se de passagem, existe um papo de mercado de que uma alternância política faria com que houvesse um ajuste fiscal, mas no mundo inteiro está havendo dificuldade para se fazer ajustes fiscais. Como a Argentina estava quebrada, ela não é um bom exemplo, mas países como Estados Unidos e França, que possuem alternância de poder, estão com dificuldades para fazer seus ajustes fiscais.

Dessa forma, mesmo que haja um novo presidente em 2027, ele terá dificuldades para fazer um ajuste fiscal, pois isso causa turbulência política e insatisfação social. Isso em um mundo polarizado e ideológico, cuja população está envelhecendo, o que consome recursos previdenciários.

Com isso, a dívida pública brasileira só não é um problema maior, pois outros países estão com o mesmo problema. Se o Brasil fosse o único país com esse tipo de problema, o real não estaria no atual patamar, pois já teria havido uma fuga para outras moedas, mas esse não é o caso. Não é à toa que o ouro está sendo uma proteção para esse tema específico.

Considerando a nossa conversa, você gostaria de acrescentar algum ponto à sua entrevista?

O Brasil vai enriquecer mais nos próximos anos se houver a promoção de um ambiente econômico de redução de juros, já que uma queda de 1 ponto percentual da Selic gera mais riqueza que o crescimento de 1 ponto percentual do PIB. Isso porque o PIB está crescendo, a renda está alta, mas o país também está se endividando muito, o que faz com que, no limite, esses movimentos se neutralizem.

Esse ponto é muito importante, pois quando se fala em uma queda de 1 ponto percentual da Selic, nós estamos falando de R$ 50 bilhões de economia com o pagamento da dívida pública.

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