As exportações de sucatas ferrosas, insumo usado na composição do aço, voltaram a cair em abril, diante de um cenário internacional desfavorável e ligeira melhora no mercado interno. As vendas externas somaram 34.561 toneladas no mês passado, retração de 58% em relação às 82.443 toneladas de abril de 2023.
Entre janeiro e abril, as exportações também caíram pela primeira vez no comparativo anual, 11,3%, para 222.824 toneladas, ante 251.103 toneladas em igual período de 2023. Os dados foram divulgados pela Secretaria de Comércio Exterior (Secex), ligada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). Em março deste ano, as vendas ao exterior já haviam se retraído 50,5% comparadas ao mês de fevereiro.
“Embora as dificuldades no mercado interno continuem, notamos pequena melhora desde março. Já o cenário internacional está desfavorável, com os fretes marítimos em alta em função de conflitos no Mar Vermelho e menor demanda de países como a Índia, um dos potenciais consumidores de sucata brasileira”, afirma Clineu Alvarenga, presidente do Instituto Nacional da Reciclagem (Inesfa).
Segundo ele, ainda há um cenário de incerteza no Brasil, mas a recuperação na construção civil e na venda de automóveis, com a baixa nos juros, podem impulsionar a demanda por aço e consequentemente por sucatas metálicas.
Uma das maiores preocupações do setor é a questão tributária. A reforma, conforme Alvarenga, castigous a reciclagem no Brasil.
“Caso não haja mudanças no texto, a PEC/45-2019, aprovada no Congresso, deverá onerar o setor em cerca de 27,5% de imposto. Atualmente, a reciclagem é isenta do PIS e Cofins na venda à indústria de transformação (situação ainda em análise pelo STF) e tem o diferimento do ICMS nas operações dentro do Estado”, afirma.
Apesar da pequena evolução na demanda por sucatas ferrosas no mercado interno, há enorme dificuldade com os outros insumos reciclados, como papel e plásticos. As indústrias de embalagens estão preferindo usar celulose na produção ao invés de papéis recicláveis, enquanto as recicladoras de plásticos sofrem com a ociosidade.
“Há falta de estímulo do governo ao consumo de materiais reciclados, que estão com os preços em queda, afetando diretamente a parte mais vulnerável da economia circular, os catadores”, afirma.
Segundo Aline Souza, representante do Movimento Nacional dos Catadores, que fez a entrega da faixa presidencial no ano passado, “a atenção e recomendações de incentivos que o presidente Lula passou ao Ministério do Meio Ambiente deveria também ser adotada pelo Ministério da Fazenda, que precisa desonerar a cadeia produtiva dos recicladores, chegando na ponta, ou seja, aos catadores”.
No Brasil, a reciclagem mecânica de plástico pós-consumo alcançou a marca de 25,6% em 2022, representando o maior crescimento desde 2018, conforme revelado pelo Índice de Reciclagem Mecânica de Plásticos Pós-consumo no Brasil, divulgado pelo PICPlast (Plano de Incentivo à Cadeia do Plástico), uma iniciativa promovida pela Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast).
O presidente da Aliança Internacional dos Catadores de Materiais Recicláveis (IAWP) e secretário de Articulação Internacional da UniCatadores, Severino Lima Júnior, destaca a importância das atividades dos catadores. “Se não fossem esses profissionais, os oceanos já estariam todos poluídos e os aterros, saturados. Os catadores são protagonistas e conhecem suas responsabilidades. A preocupação com a reciclagem do plástico é grande e nas reuniões do Tratado Contra a Poluição do Plástico, discutimos muito sobre a reciclabilidade e a importância desses materiais retornarem ao ciclo de vida normal, promovendo assim a economia circular”.
No entanto, Severino expressa preocupação com a disseminação de informações de ONGs que sugerem que a reciclagem não passa de uma solução falsa. “Estas afirmações desconsideram, desvalorizam e subestimam o trabalho árduo dos mais de 40 milhões de catadores ao redor do mundo. É lamentável ver uma discussão que só serve para estragar a histórica contribuição da nossa categoria para a economia circular de resíduos, especialmente no que diz respeito aos plásticos”, ressalta.
O representante dos catadores também critica matérias e pesquisas publicadas recentemente que não representam adequadamente a realidade da reciclagem. “De fato, nunca vi uma pesquisa que coletasse informações de catadores de rua ou dos lixões. Querem estabelecer pesquisas que não refletem a realidade do Brasil, nem da América Latina e continentes como África e Ásia-Pacífico. No Brasil, o mercado de sucata de plásticos é extremamente desafiador. Como catador de base, questiono qualquer dado ou pesquisa mercadológica gerada em outros países que não leve em conta a contribuição dos catadores de recicláveis e as particularidades geográficas que influenciam suas atividades”.
De acordo com Lucas Silva, responsável pelas relações institucionais da Cooperativa de Profissionais da Área de Reciclagem do Brasil (Cooperlínia), os catadores, tanto individualmente quanto por meio de cooperativas, são responsáveis por cerca de 90% de todo o material reciclável coletado no Brasil, conforme dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
“Este número por si só ressalta a importância crucial dos catadores no sistema de reciclagem nacional. É por meio do trabalho dos catadores que esse volume é alcançado. Eles são a linha de frente na coleta e separação de materiais recicláveis, especialmente plásticos, garantindo que esses itens sejam encaminhados para os processos corretos de reciclagem, contribuindo significativamente para a sustentabilidade ambiental”.
Lucas ressalta ainda que o plástico representa cerca de 20% do volume físico destinado para a reciclagem, mas contribui com aproximadamente 60% a 70% da rentabilidade financeira. “Isso evidencia o alto potencial de rentabilidade do plástico para as cooperativas. Se houver uma homogeneização dos tipos de plásticos recicláveis, poderemos aumentar a quantidade de material destinado à reciclagem, melhorando os resultados financeiros das cooperativas e, por consequência, criando mais empregos e gerando renda para milhares de famílias, fortalecendo a economia circular e promovendo a sustentabilidade econômica e ambiental em nosso país”, conclui.
Em 2022, foram gerados 14,7 mil empregos pela indústria recicladora com mais de 1,3 mil empresas. A indústria de reciclagem do plástico obteve mais de R$ 4,7 bilhões de faturamento, de acordo com a Pesquisa de Reciclagem PICPlast/MaxiQuim.
Segundo o Atlas Brasileiro de Reciclagem 2022, publicado pela Associação Nacional dos Catadores e Catadoras de Materiais Recicláveis, apenas 23% dos municípios brasileiros têm algum tipo de programa de coleta seletiva de resíduos, um índice significativamente baixo considerando a obrigatoriedade estabelecida pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), promulgada há mais de uma década.
Conforme indicado pelos dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS, 2021), os maiores percentuais de municípios com programas de coleta seletiva implementados estão nas regiões Sul e Sudeste, as mais desenvolvidas economicamente.