O debate público brasileiro está voltado, pelo menos desde o fim do ano passado, para a elevação do preço dos alimentos. E não é à toa, considerando que a inflação desse grupo de produtos foi de quase 8% em 2024, segundo o IBGE, e que os preços de alguns itens comuns à mesa dos brasileiros tenham subido muito, como o café (50% no ano passado) e o ovo (20%).
No entanto, a inflação que realmente preocupa não é essa, mas a do setor de Serviços. A análise da Carta de Conjuntura do Conselho Superior de Economia, Sociologia e Política, da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomércio-SP), deste mês é que, uma vez que os preços do setor flutuam em altas acumuladas de 12 meses entre 5% e 6%, será difícil estabilizá-los – e vão puxar o índice geral para cima, adiando cada vez mais o início do ciclo de queda da taxa Selic.
“Se a alimentação está cara por fatores climáticos, que devem ser suavizados com a melhoria nas safras em 2025, os serviços estão sendo ainda mais inflacionados, na medida em que o governo tem tentado estimular o crédito e o consumo, e tudo isso em uma conjuntura de desemprego baixo e importações em disparada. Em outras palavras, não há horizonte no curto prazo de mudança de rota”, diz a análise.
A preocupação maior do governo com a inflação da comida é puramente política, porque há influência eleitoral.
“Na verdade, há dois caminhos a seguir”, aponta o economista Antonio Lanzana, presidente do conselho: “Ou controlar a inflação, que está em disparada, ou estimular a demanda. O governo parece estar escolher a segunda opção. Os efeitos, porém, podem ser complicados”.
Já segundo a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), o aumento da taxa básica de juros, de 13,25% para 14,25% ao ano, torna o cenário ainda mais desafiador para setores estratégicos da economia, como a indústria, cuja produção segue 16% abaixo de sua máxima histórica. Além disso, dados recentes do mercado de trabalho mostram menor ritmo de crescimento das contratações.
“A continuidade do ciclo de alta da taxa de juros, que já é uma das mais altas do mundo em termos reais, penaliza um país que ainda carece de condições básicas para alcançar seu potencial econômico”, afirma o economista-chefe da Firjan, Jonathas Goulart.
Para a federação, o aumento dos juros não deve ser o único caminho para conter o avanço inflacionário. Segundo a Firjan, é imprescindível que haja uma agenda pública comprometida em reduzir as vulnerabilidades internas. Nesse sentido, a implementação de uma reforma das contas públicas, que seja crível e focada na otimização dos gastos, é essencial para evitar pressões cambiais e garantir a atuação mais eficiente do Estado na economia.
Conforme a federação, a busca pelo equilíbrio fiscal, aliada a investimentos em áreas chave como inovação, tecnologia, infraestrutura e capital humano, será crucial para recuperar a confiança do setor industrial, que segue pessimista pelo terceiro mês consecutivo. “É preciso união entre os poderes para que se atinja um objetivo maior no médio prazo. Se continuarmos com agendas que seguem o ciclo eleitoral, o resultado já é conhecido: mais inflação, mais juros e mais desemprego”, acrescenta Goulart.