Fracasso de Macron

Emmanuel Macron, certamente um homem culto, parece absolutamente desligado da história das paixões ideológicas e políticas, produto da alquimia das elites tecnocráticas francesas. Por Edoardo Pacelli

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Emmanuel Macron
Emmanuel Macron (foto de Mauro Bottaro)

O ex-ministro italiano da Cultura Gennaro Sangiuliano, em um recente artigo no jornal Il Giornale, analisa os motivos do fracasso do presidente francês Macron. Depois de examinar a história política francesa, através do passado mais ou menos recente, Sangiuliano lembrou que, durante o século 20, a França foi, para o bem ou para o mal, o alicerce de grandes e opostas ideologias, o lugar onde se formaram intensas paixões políticas, que influenciaram, pelo menos, três gerações em todo o mundo. Por exemplo, o comunismo asiático, especialmente no Vietnã e, em parte, na China, através da experiência pessoal de alguns de seus protagonistas, como Ho Chi Minh, que viveu em Paris e foi grandemente afetado pela influência cultural francesa. Alguns historiadores questionaram, de fato, as influências do jacobinismo francês sobre o comunismo na Ásia, enquanto Mao Zedong e Ho Chi Minh viriam a se tornar os ícones do Maio francês.

Sangiuliano, em seguida, questiona o desenvolvimento da direita francesa. A França foi o berço de uma grande agitação política, mesmo na direita: o gaullismo foi um modelo bem-sucedido de direita social, onde o patriotismo conseguiu superar a luta de classes ao reunir grandes massas de trabalhadores. O escritor André Malraux, que tinha simpatias comunistas, foi ministro da Cultura de De Gaulle.

O historiador e acadêmico francês René Rémond formulou a divisão tripartida em “três direitas” (Les Droites en France, título de seu ensaio): orleanista, bonapartista e legitimista, com referência aos acontecimentos dos séculos 19 e 20.

O presidente François Mitterrand, continua Sangiuliano, estava imbuído de cultura política, amava a história e elegeu Nicolau Maquiavel como seu pensador de referência. Seu refinamento e pragmatismo lhe valeram o apelido de “le Florentin”. Quando jovem, estava alinhado com a direita nacionalista, mas, como líder socialista, conseguiu conquistar o Eliseu e fazer do Partido Socialista francês uma força hegemônica da esquerda, reduzindo o Partido Comunista à situação de mera comparsa no teatro político francês.

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Sucessivamente, Sangiuliano examina a carreira política de Emmanuel Macron, que é, certamente, um homem culto, mas que parece, no entanto, absolutamente desligado dessa história de paixões ideológicas e políticas, produto da alquimia das elites tecnocráticas francesas, como demonstra seu currículo. Macron foi um alto funcionário da Inspeção-Geral das Finanças, depois banqueiro de investimento no banco Rothschild e, em seguida, secretário-geral adjunto do Eliseu sob a presidência de François Hollande. Uma excelente carreira tecnocrática, porém sem militância política e, sobretudo, com uma formação técnica, longe das culturas políticas das quais a França é o berço. Ele chegou ao Eliseu na onda da necessidade da elite de bloquear o caminho de Marine Le Pen.

Macron foi ministro em um governo socialista (foi também membro do PS), depois fundou o seu próprio partido centrista, En Marche, e piscou o olho para a direita, com as nomeações, como primeiros-ministros, de Édouard Philippe e Michel Barnier, dois homens vindos da antiga centro-direita. Para os detratores de Macron, essas oscilações fáceis seriam a prova de sua falta de ideias fortes e enraizadas: seria, portanto, uma tentativa de substituir a mera prática do poder verticalizado pela política autêntica e clássica.

Agora, faltam três anos para o final da segunda presidência de Macron, e a França encontra-se em uma crise institucional, que é o espelho de uma profunda crise social e moral. O contexto traz à mente a crise da Quarta República, com a crise de maio de 1958, o regresso do General De Gaulle e a chegada da Quinta República semipresidencialista. “A rejeição dos franceses ao presidente da República nunca foi tão grande”, afirma o ensaísta Alain Duhamel.

Nos últimos meses, ocorreu o fracasso da visão presunçosa de uma França “tecnocrática, modernizadora e reformadora”, segundo Macron, mas longe do sentimento comum dos cidadãos.

Concluindo, Sangiuliano aponta como, acima de tudo, a política macroniana, sem alma e desprovida de ideais, fracassou, especialmente em uma das nações que, para o bem ou para o mal, gerou culturas políticas. A história de uma nação não pode ser pisoteada e, mais cedo ou mais tarde, ela se vinga.

Edoardo Pacelli é jornalista, ex-diretor de pesquisa do CNR (Itália), editor da revista Italiamiga e vice-presidente do Ideus.

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